Tentação ( parte XXXVI )
( continuação do capítulo anterior )
- Ubiratan, nós vamos engordar... O que temos a fazer aqui nesse navio ? Olhar para o mar, comer e dormir.
- Essa viagem, senhor Silveira, serve para a gente adestrar a nossa paciência. Tanta coisa para se fazer quando chegar e o navio parece não sair do lugar... O vento, dá impressão que está contra o nossos rumo, o navio, para seguir na direção certa, tem que bordejar, ficar ziguezagueando.
- Como estará se saindo o nosso Marcel?
- Ele deverá estar vendendo mais do que o senhor imagina. O meu irmão é muito prático, honesto e ladino.
- Eu acredito nele, no senhor Maurice e na Maria Rosa. Juntos vamos levantar a nossa firma.
De repente o vento mudou, uma forte rajada prenunciava tempestade, o céu escureceu, raios começaram a cortar o ar e o comandante pediu para que eles se recolhessem aos seus aposentos.
A tempestade chegou, chacoalhando o navio que rangia como se o quisessem desmontar. Foram muitas horas de angústia e medo, mas depois ele alcançou velocidade, a tempestade passou e seguiram a viagem com tranquilidade.
Maria Rosa estava apavorada, parecia que o rapaz havia perdido muito sangue e continuava desfalecido. Também poderia ter desmaiado pela queda, talvez com o peso do Furacão ele tenha caído e batido com a cabeça no chão.
Mas ela se preocupava não era só com isso, aquele rapaz queria entrar na casa para estuprá-la, ela tinha percebido no seu primeiro encontro que seu olhar era de cobiça, ele não queria só conversar, ele esperava algo mais e veio naquela hora, na calada da madrugada, para conquistá-la à força.
Ele não era confiável e não se sabe o que uma pessoa desse tipo de caráter, poderia aprontar. Ele poderia contar uma estória diferente, inventar que fora atraído àquele local e atacado por ela com um porrete e que depois ela instigou a fera contra ele. E seria a palavra de um fazendeiro contra a palavra de uma escrava.
Por outro lado, se ele não fosse tratado, poderia morrer e se isso ocorresse ela nunca ficaria em paz com a sua consciência, ela teria que socorrer aquele homem.
Aí lhe veio aquela ideia instigadora:
Tanta gente que morre diariamente por febre bubônica, tifo e varíola, um a mais, um a menos não vai fazer diferença... Se eu jogar ele dentro de uma vala ninguém vai saber, é menos um infeliz para abusar dos outros...
Num domingo de sol Maria Rosa tinha ido andando até ao Boqueirão da Praia da Santa Luzia, e tinha visto o Hospital da Santa Casa da Misericórdia e alguém havia lhe dito que era lá que estavam tratando do pessoal com a epidemia da varíola. Era para lá que ela iria levá-lo.
Largou o homem desmaiado junto da porta, foi ao quintal e atrelou um cavalo na carroça e parou em frente ao portão.
Mas como levar aquele homenzarrão para dentro da carroça ?
Lembrou-se que havia um escravo que tomava conta da casa da vizinha, ele parecia confiável e também olhava para ela com segundas intenções. Maria Rosa resolveu pedir ajuda:
- Ô de casa, vem me ajudar!
Foi assim que ela e Jerônimo deixaram o rapaz na porta da Santa Casa, que ainda estava fechada, e saíram furtivamente.
Maria Rosa pediu a Jerônimo, pelo amor a Deus, que não comentasse nada com ninguém, não se sabia os desdobramentos que poderiam advir se alguém soubesse do caso, afinal eles eram escravos e escravos nunca tinham razão... Jerônimo disse-lhe que poderia confiar nele, por ele ninguém tomaria conhecimento daquele fato.
Quando chegou em casa, exausta, Maria Rosa ainda foi lavar o chão e o focinho do Furacão para eliminar qualquer evidência e prova contra ela.
( continua no próximo capítulo )
( continua no próximo capítulo )