A PRIMEIRA VEZ

Ao entrar no quarto, Haroldo sentiu um medo estranho. Depois de quarenta anos, vivia a primeira noite sem Amélia, sua esposa. Naquele momento, a morte mostrava sua face pela segunda vez. A primeira foi quando viu Amélia no caixão.

Os filhos insistiram que passasse alguns dias com eles, mas não queria incomodar, e assim decidiu voltar pra casa depois do funeral. Agora sentia medo. Medo de continuar a vida. Medo do que o esperava sem a companheira. Simplesmente sentia-se perdido. Logo ele, militar reformado; líder nato; considerado mão de ferro; sempre com uma solução; uma palavra; um caminho. Agora, simplesmente, sentia saudades do grande amor da sua vida; Da mãe dos seus filhos; da companheira de todas as horas; do beijo doce; do corpo macio; das mãos sensíveis.

A frase “Nunca mais” veio a mente como um corte na alma. Haroldo sentou-se na cama e chorou compulsivamente a saudade que o acompanharia até o reencontro.