Meia história de paixão
Eu o conheci num daqueles jogos de computador. Para mim era tudo uma brincadeira, todos nos divertíamos e aquele jogo bem como as pessoas daquele jogo, funcionavam para mim como uma válvula de escape para o estresse no trabalho.
Não sei exatamente como, mas pouco depois de nos conhecermos, ele já estava no meu skype.
Começou com uma conversa tímida, de quatro ou cinco piadas e logo falávamos sobre o jogo, afinal o jogo era o mais importante naquele momento.
Ele era atencioso, gentil, cordial, inteligente, simpático, carinhoso enfim.
O fato é que não demorou muito até que conversássemos de tudo: economia, vida pessoal, animais de estimação, crescimento populacional, planejamento familiar, projetos de habitação, turismo, educação enfim. Muitos foram os assuntos: não escolhíamos, eles simplesmente vinham.
Destes que vieram, com relação a vida pessoal, eu disse a ele o quanto minha vida amorosa foi frustrada: três namoros sérios, três decepções sérias e que desde o meu último namoro sério, meu coração estava vazio há quatro anos.
Naquela tarde ele me disse:
- Seu coração merece alguém, vou aquecer esse seu coração.
Então eu disse:
- Vai dar uma de cupido e atirar suas flechas?
- Sim, isso mesmo. Tenho pessoas para te apresentar. - rindo.
Não dei bola, afinal meu coração estava blindado de paixão. Eu tinha uma tática muito boa para evitar que eu me apaixonasse porque a minha teoria é a seguinte: se você no caminho para o trabalho, passa por uma rua que tem grandes índices de assalto e quer evitar de ser assaltado, qual sua primeira providência? Procurar um caminho alternativo e evitar passar por aquela rua. O mesmo se aplica a não se apaixonar, se você sentir que está se apaixonando por alguém, evite este alguém para não se apaixonar de vez.
Os sintomas de paixão são físicos e emocionais. Os físicos: coração descompassado. Os emocionais: pensar com frequência naquela pessoa.
Mas voltando a história, após aquela conversa - que por sinal foi a primeira conversa com relação a minha vida amorosa - tivemos muitas outras.
Conversamos sobre pessoas interessadas em mim:
- Dê a eles uma chance.
- Não, não posso e não quero dar. - eu dizia.
Posso dizer que eu tinha medo de me apaixonar, por medo de me machucar. Dor de paixão dói por muito tempo, dor de amor dói por muito tempo e eu não queria passar por tudo isso novamente.
Ao longo de nossas conversas diárias, não demorou muito para que eu confessasse meu amor incondicional de sorvete de lambada e flocos. Vocês por acaso já tomaram sorvete de lambada? É simplesmente, maravilhoso.
Não demorou muito para que ele descobrisse que eu tenho uma queda por Bis de Avelã (edição limitada). Acho que os estoques da Kraft Foods de Bis de Avelã foram embora só com as minhas compras quase que semanais de caixas e mais caixas desse sabor de bis.
Logo ele descobriu minha paixão declarada por músicas e não demorou muito para que trocássemos vários artistas e suas canções. Dentre os artistas: Teatro Mágico, Marcelo Jeneci, Clarice Falcão, A banda Mais Bonita da Cidade, Nando Reis, Detonautas, Marisa Monte enfim.
Não demorou muito para que ele descobrisse que todas as minhas manhãs tinham de começar com café e pão de queijo na padaria, senão meu dia não tinha como começar.
O que quero dizer é que as conversas foram ficando frequentes, profundas a ponto de:
- Eu preciso falar com você mas não sei como falar. - disse eu.
- Nossa, por favor, fala. O que aconteceu? - disse ele ansioso.
- Nao sei se é uma boa ideia, porque não sei como dizer. É melhor deixar para lá.
- Linda, fala.
- Lembra uma vez que te disse que quando sinto que estou me apaixonando eu sumo um pouco e fica tudo certo depois? Estou me apaixonando pelo seu ser humano e acho que é hora de eu sumir um pouco. Entende? Colocar a cabeça no lugar. Eu falo porque sou sincera, infelizmente me deixei levar e te peço desculpas por isso. Só preciso de uma semana e vou aproveitar que essa próxima semana pra mim vai ser bastante agitada, pra fazer isso. Me desculpe, sério.
- É pra mim né? É que não digeri ainda...
- Sim, é pra você. Desculpa tá? Como te falei, só preciso respirar um bocadinho, colocar a cabeça no lugar e depois tudo ficará bem.
- Você não precisa dar esse tempo. Por que você não deixa as coisas acontecerem? Por que evitar ? Qual problema duas pessoas se gostarem? Eu também gosto de você, linda!
Neste momento meu coração passou a bater descompassado. Eu poderia definitivamente decidir ir por outro caminho, eu poderia definitivamente manter a minha decisão. Mas eu hesitei. Pela primeira vez em muito tempo, eu hesitei depois de me decidir:
- Sabe, acho que não vou fazer nada.Vou continuar falando com você, vou continuar trocando musicas com você, mensagens com você normalmente. Talvez nao haja sentido em me afastar e tudo mais, afinal com quem vou conversar quando eu ficar estressada?
Depois desse dia, nossos corações inflaram de esperanças. Os sentimentos cresciam de maneira desordenada. Mas se o sentimento era mútuo, se eu havia decidido dar uma chance a mim mesma, o que mais poderia atrapalhar tudo isso?
Eram aproximadamente 2913 Km, 1810.055731 milhas e sei lá de quantas maneiras é possível representar a distância que nos separa.
A distância é cruel.
A distância não me permite beijá-lo, abraçá-lo, acariciar rosto dele enfim. O máximo que essa distância nos permitiu foram conversas no skype via webcam.
A distância foi quase como um veneno sem antídoto injetado em nossas veias para matar definitivamente esse sentimento que estava crescendo em nós. E ele me disse:
- É uma pena. Você tem sua vida aí, eu tenho minha vida aqui. Não somos mais adolescentes e temos de pensar de modo racional: não podemos brincar de turistas. Se lavarmos isso adiante, essa distância vai me magoar e me machucar porque estou realmente gostando de você. Resolvi aceitar essa distância, não vou lutar contra ela.
- O que posso te dizer? Não há o que dizer. Se você não se sente bem, não posso permitir que prossigamos então. Quero te ver feliz.
No silêncio que faz agora, só me lembro das últimas palavras:
- Bobos todos que te deixaram escapar, porque se eu tivesse aí eu não deixava. Você merece alguém, alguém pra te fazer feliz. Não vou te esquecer, não tenho como fugir disso. É complicado porque para onde olho, lembro de você. Só vou aceitar a situação.
Tentei não chorar na frente dele, mas foi impossível evitar que algumas lágrimas rolassem.
Foi duro. Foi triste. Está doendo. Chorei e escrevi tudo isso até agora com os olhos marejados.
Espero que alguém que esteja ali pertinho o faça feliz porque tenho certeza que ele é capaz de fazer qualquer mulher feliz.
A felicidade de quem gostamos nem sempre está conosco, ou seja, quem gostamos pode encontrar a felicidade nos braços de outra pessoa mas neste momento para mim o importante é que ele seja feliz.
Se eu fizer uma analogia, posso dizer que antes de conhecê-lo eu andava por caminhos que eu conhecia bem. Após conhecê-lo cheguei numa bifurcação na qual eu poderia decidir ir pelo caminho que eu já conhecia, ou ir pelo caminho novo. No caminho novo é preciso guiar-se por placas, pelas sinalizações e agora que não o tenho mais, chegou a hora de dar um tempo para que possa estudar o mapa e voltar para o caminho que já conheço.
Estou acostumada com meu coração partido, não que isso seja algo normal. O maior desafio que terei de enfrentar daqui por diante com certeza será superar o que sinto ele.