A moça da praia
O sol prometeu pra lua
Um ramalhete de flor
Se um tolo comete encrenca
Que dirá quem tem amor.
(Renato Teixeira)
Um ramalhete de flor
Se um tolo comete encrenca
Que dirá quem tem amor.
(Renato Teixeira)
Como sempre fazia, nas tardes quentes, o moço juntou sua tralha e foi para a areia. Pescar era meramente uma desculpa. Ele gostava, mesmo, era do momento de solidão à beira d'água, apreciar a pintura do entardecer – obra de arte que nenhum artista consegue retratar com total fidelidade, única a cada dia sem jamais se repetir.
Chegando ao local predileto – a extremidade de uma pequena enseada logo após o bosque de angicos de onde podia ver à distância os campos além da margem oposta, sentou-se na areia, iscou o anzol e atirou-o na água. Com as mãos, removeu a areia até cavar uma pequena vala onde fincou o pé do caniço de pesca e, enquanto esperava o peixe que ele sabia não vir, embevecido, pôs-se a contemplar o colorido do céu.
Sua espera não se resumia ao peixe. Esperava com a certeza de quem sabia que um dia viria alguém. Não tinha pressa... Sua juventude lhe fazia crer que era eterno. Portanto, tinha todo o tempo do mundo! Todavia, naquela noite uma sensação estranha, que misturava angústia e esperança com medo e inquietação, dominava seu pensamento.
Atrás dele, contornando a enseada, via-se não muito longe o casario da vila de operários. A iluminação pública acesa precocemente projetava nas águas da pequena baía rastros tremulantes de luz que completavam a beleza do cenário.
Na obscuridade do corta-luz à margem do lago, do outro lado da enseada, ele percebeu a silhueta de uma moça caminhando pela areia da praia. Acompanhou-a com os olhos até ela desaparecer na curva da enseada. Depois, voltou ao seu mister e deixou os pensamentos se perderem no colorido do entardecer... Assim, ele mal percebeu a moça se aproximar: chegou de mansinho e, sem dizer nada, sentou-se ao seu lado. Vestia a parte inferior de um biquini e uma pequena camiseta que mal lhe cobria os seios.
O Sol no ocaso mergulhava no cerrado do outro lado do lago, deixando refletido na superfície um longo rastro como uma estrada de luz e fogo. Sentindo a presença da jovem, ele desviou os olhos do poente e fitou-a. Ela sorriu e permaneceu em silêncio. Ele correspondeu ao sorriso e voltou a contemplar o anoitecer. A moça não era uma mulher de beleza marcante: tinha semblante altivo, mas os olhos denunciavam uma ponta de tristeza, que ele logo notou.
Quando o Sol desapareceu no horizonte, deixando para trás rajas de vermelho opaco sobre as águas, resto de luminosidade opondo-se ao anoitecer, a primeira estrela titubeante surgiu no firmamento. Impelida pela magia e o encantamento da hora, a moça com um movimento tímido e suave, acariciou-lhe o rosto. Ele não se surpreendeu, dando a impressão de que já esperava o deleitoso gesto.
Mal a conhecia. Apenas a vira algumas vezes, quando passava pela viela a caminho da praia. Correspondeu à carícia recebida. Fitaram-se em silêncio por um longo período, ouvindo o leve ruído das marolas que a brisa leve fazia no lago. Depois, num crescente de encantamento, beijaram-se. Não foi um beijo ardente, mas um beijo suave, tímido. As mãos buscavam o outro, deslizando pelas raízes dos cabelos em afagos leves, como se tentassem justificar as palavras que não disseram. Então a libido explodiu e eles se amaram com toda a fúria de sua juventude!
Mais tarde, após o breve momento em que repousaram um nos braços do outro, estendidos na areia ainda tépida, ela levantou-se e, tal como chegou, partiu sem dizer nada.
Nos dias que se seguiram, a cena se repetiu da mesma forma. O moço sentia, a cada vez, uma grande paixão crescer em seu peito. No último dia, ao contrário dos demais, ao levantar-se ela disse uma palavra. Apenas uma:
— Adeus!
Naquele momento, o rapaz percebeu que seria o fim. Quis dizer alguma coisa, mas não pôde. A jovem já se afastara e ele apenas ficou acompanhando com o olhar o cadenciado bonito de seus passos até que ela desapareceu na escuridão. Nunca mais a viu.
Durante muito tempo, quem de longe observasse o poente da margem daquele lago, podia ver recortada na luz do entardecer a silhueta de um moço solitário a espera de uma moça da qual ele sequer sabia o nome.