O reencontro.

Havia uma força no seu olhar capaz de sugar quem a olhasse dentro dos olhos, tal quais os olhos da Capitu, atraía para si intensamente tudo o que despertasse sua curiosidade e merecesse a sua atenção. Tímida, muito discreta e ao mesmo tempo intensa, verdadeira, transparente. Estava visitando uma exposição de fotografias, em Arraial do Cabo. Sempre observadora, altiva, mas de poucas palavras.

Degustava cada momento até o seu último átomo, observava as fotos como se passeasse por elas, impressionante! Numa delas, a Gruta azul, um dos pontos mais belos de sua cidade, conseguia ouvir o barulho do mar batendo nas pedras. Num contato sinestésico, sentia-se dentro da gruta. Por um momento ficou absorta, envolvida naquele vai e vem da maré.

Desta forma, matava a saudade de sua cidade, havia tempo que estava morando fora do Brasil. Olhou uma foto da Praia Grande, com a linda cachoeira artificial, lembrou-se dos momentos maravilhosos vividos ali, na adolescência. Recordava os rostos sorridentes e os corpos dourados de sol, lembrou-se da voz de Marina Lima “vem chegando o verão, um calor no coração, essa magia colorida, coisas da vida”. Era esta a canção que embalava todos os acontecimentos nas areias da Praia Grande. Quantas coisas deixara para trás quando foi morar no exterior.

De repente, um delicado toque no seu ombro, já o sentira antes, era ele, tinha certeza. Podia sentir sua energia como nos velhos tempos. Sentiu seu corpo estremecer, virou-se apreensiva e não teve dúvidas, era mesmo ele. Por alguns instantes, ficaram parados sem saber ao certo o que dizer. Ela parecia passear dentro dele agora, como fizera com as fotografias, sentia-se em casa, acolhida naquele corpo que também parecia ser seu. Ele, totalmente inerte, atraído, podia senti-la passear dentro do peito como se fizesse uma varredura.

Quanto tempo, meu Deus! Depois da surpresa do reencontro, queriam saber tudo um do outro na tentativa de preencher as lacunas que ficaram no caminho. Ele falou dos seus livros publicados, tornara-se um escritor reconhecido, dedicava grande parte do seu tempo aos estudos e à produção literária. Ela, após formar-se em medicina, fora morar no exterior, fizera algumas especializações e constituiu uma carreira sólida.

Até então, nenhum dos dois mencionara nada sobre a vida pessoal, pareciam temer, mas ao mesmo tempo queriam saber, precisavam saber. Por alguns instantes ficaram calados... O silêncio foi cortado de repente: “E você... casou?” perguntaram em uníssono. Riram pela coincidência. Naquele momento não pareciam ser o escritor e a médica e sim os adolescentes apaixonados de outrora. Os corações saltitavam de euforia, foi então que ele tomou a iniciativa.

Contou como foram difíceis os primeiros anos, depois da separação. Disse que jamais a esquecera, que tentara outros relacionamentos, mas nada se comparava ao que sentiam um pelo outro , porque a essência do amor teria sido capturada por ela desde o primeiro encontro, naquela mágica tarde de domingo. Não passava um dia sem que buscasse encontrar novamente seus olhos, vivia numa busca incessante, na certeza de que esse momento chegaria e que de uma forma ou de outra ele pudesse ter de volta o seu complemento, era assim que ele a enxergava, como o complemento de sua existência.

Continuou falando da saudade que sentia e do quanto doía a sua ausência , quando ela o interrompeu suavemente, com um toque nos seus lábios, num pedido de silêncio.

Não precisava falar mais nada, aquilo era tudo o que sempre quisera ouvir, parecia um sonho. Ela estava longe de ser aquela adolescente insegura de outrora. Agora, era uma mulher independente, decidida, não queria perder mais nem um minuto de sua história. Com um beijo selaram o reencontro. Momento mágico. Quando almas gêmeas reencontram-se e tornam-se um só ser. Sublime. Ao redor, tudo pareceu se transformar, era possível sentir novamente o perfume de rosas, como uma bênção divina caindo sobre eles.

Não há nada que possa explicar a grandeza desse instante. A partir daquele momento, todas as tardes seriam especiais, não só as tardes de domingo.

Luciana Netto
Enviado por Luciana Netto em 26/12/2012
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