O vestido
Eu estava de frente para o espelho. De pé, uma verdadeira estátua humana. A gente faz isso pelos amigos!
Quando a mãe da Kátia (que é um doce de senhora) ficou desesperada porque a noiva não veio fazer a última prova do vestido, eu topei servir de manequim, já que a moça, ao que tudo indica tem o mesmo corpo que eu.
Pois é, mas a linha acabou, e eu tive que ficar imóvel enquanto ela descia e ia até a lojinha ali perto comprar outra. Linha dourada... Difícil de achar. Mas tudo bem.
Difícil mesmo foi quando a campainha tocou, eu imóvel apenas gritei: QUEM É? E do outro lado veio a resposta: AUGUSTO.
ENTRA, respondi, e me virei para a porta. Quando ele entrou pareceu tomar um choque. Ficou meia hora parado, um pouco estupefato. Eu vestida de noiva? Por quê? Quando? Onde? Como?
- Ué...
- O que foi?
- Esse vestido?...
- Ah... estou ajudando dona Cidinha a terminar este aqui. Ela deu uma saidinha. É urgente?
- Eu vim pra buscar o vestido da Vanessa...
Um vento estranho que entrou pela janela jogou o véu no meu rosto. Parece uma dessas coisas feitas pela vida pra desconcertar a gente.
Augusto veio me ajudar, e foi muito, muito, muito estranho quando ele tirou o véu do meu rosto. Estávamos muito próximos. Mas não nos afastamos.
- Eu acho que ela vai demorar – falei baixinho...
- Você está linda com esse vestido.
Um silêncio constrangedor , e ele completou de modo mais informal:
- Quando for casar, devia usar um assim...
- Ah, só você mesmo! – falei mais relaxada – Esse vestido não tem nada a ver comigo! É muito bufante, espalhafatoso! – e dei uma risada.
- Mas você ficou linda com ele.
Novamente ele se aproximou, eu só falei o que vem a seguir para tentar afastá-lo...
- O vestido da sua noiva é bem diferente desse...
... mas só consegui aproximá-lo mais.
- É por isso que eu amo VOCÊ.
E me beijou. Apenas isso. Me beijou. E eu beijei de volta. E quanto mais ele repetia que me amava mais difícil ficava de não me entregar de corpo e alma àquela situação extrema.
3 anos atrás isso não estaria acontecendo. 3 anos atrás eu teria dito para ele ir embora, que me esquecesse, que desaparecesse. Mas 3 anos atrás eu não corria o risco de perdê-lo de vez, e não sentia vontade, como sentia hoje, de assumir o que de fato eu sentia.
A porta abriu, e a realidade voltou para nós. Dona Cidinha entrou, trazendo o rolo de linha dourada. Entregou o vestido de Vanessa a Augusto, e quando ele saiu ela veio terminar o vestido.
Na metade do trabalho, me trouxe um lencinho:
- Ô, minha filha, tente não chorar o vestido todo.