NO NATAL A GENTE VEM TE BUSCAR.
Por Carlos Sena
“No natal a gente vem te buscar”. Dorme. Dorme profundamente que eu volto. Volto com o teu brinquedo preferido nas mãos. Volto pra novamente correr contigo nos campos e ver a tarde se entregar a noite, como sempre fizemos em todos os natais. Neste, não. Eu não vou estar aqui no teu natal, mas não te preocupes que eu volto. Volto como voltam as estações e eu serei primavera só pra te ver colher flores dos meus braços. Se você preferir, eu voltarei inverno, mas é preciso que me digas mesmo sem que eu esteja por perto. Sendo inverno eu voltarei cheio de agasalho e quero me sentar ao teu lado pertinho da lareira, como nos velhos tempos. Quero abrir a porta da cozinha e ficar vendo a chuva fininha molhando a terra e eu pedirei pra ela permitir que todos os frutos que gostas nasçam mais doces como doce é o teu sorriso. Por isso, não te acordes. Eu vou partir, mas volto. Devo voltar no natal porque quando a gente espera alguém que vem no natal, o tempo passa rápido. Na rapidez do tempo, vou lhe pedir noites curtas e dias curtos também, porque em cada noite curta eu vou cantar cantigas de ninar para que te entregues aos mais lindos sonhos; em cada dia curto eu quero ficar acordado contando as horas, vigiando-as e colocando o tempo no ábaco das ilusões achadas. Ah, como eu só gosto de ilusões achadas. Como essa que lhe digo nesta hora que já me vou. Ilusão verdadeira não se perde, porque quando ela se confunde no trajeto, a realidade dura invade e os sonhos poderão ser pesadelos. Por isso te digo que no natal a gente vem te buscar. Buscar pra sair a esmo no rumo do toque de sino perdido entre as maldades humanas; buscar para correr de mãos dadas porque as mãos já não se dão nos natais. As pessoas estão dando muito presente, mas não estão se dando sem ser natal. Por isso voltarei. Não, não acorda que eu ainda te canto um canto de despedida. Jingle Bels? Não. Eu te cantarei no afã de te dizer “Hoje que a noite está calma e que minha alma esperava por ti”... Cantarei um solfejo de natal inventado. É. Inventar uma canção de natal não deve ser difícil e por isto eu tentarei. Se eu desafinar não se importe. Não, desculpe. Eu me lembrei do lago do cisne. Quando eu vier te buscar no natal eu irei dançar feito bailarina como se eu fosse o Cisne e você o lago. Vou ser leve como o ar; e iluminado feito o sol só pra te ver sorrir no compasso dessa valsa vienense das mais belas. Não tenhas medo que certamente eu irei tombar nalgum passo. Eu já faço isto na vida, mas farei tudo pra dançar certinho só pra você não se intimidar com os compassos descompassados.
Agora você dormiu. Agora eu sairei sorrateiramente pra não te acordar. Vou sair a esmo, vou buscar-me nas terras de além mar. Vou a terra “do sol nascente” ver se por lá meus sóis se recompõem pra que quando eu vier te buscar todos saibam – qual estádio de futebol quando os timos jogam – a redondeza inteira sabe que tem jogo, que tem espetáculo, que tem gritos de gente feliz. Agora me vou. Pela primeira vez eu partirei sem saber aonde chegar, mas tua lembrança me guiará até que a vida não me desespere. O desespero que a vida dá é quando a gente se perde dos natais porque eles se perderam em desesperanças. Você vai ficar aí, quietinha. Se, por acaso você estiver fingindo que dorme, durma de verdade. Às vezes na vida sonhar que tudo é verdade não nos dá ânimo pra prosseguir. Por isso eu te digo: dorme que no natal eu virei te buscar. Pronto. Parece que ela dormiu o sono dos anjos. A luz já está apagada e isso é bom porque nem minha sombra ela verá. Lá fora o sino da matriz está tocando, chamando para a missa do galo. É meia noite e eu nem me percebi que é natal. Prometi a minha filha que no “natal a gente vem te buscar”! Ela está ali, na sua caminha, como quem dorme. Mas ela tá fria, despediu-se da vida hoje, dia de natal. Por isto eu lhe disse mesmo sabendo que já não me escutavas que vinha no natal lhe buscar. Agora sou eu quem te peço: “vem filha. Vem buscar esse velho pai que não sabe se vai aguentar viver sem ti”. O sino da matriz está tocando. Melhor: hoje o sino bate. Ele tocava quando de mãos dadas e juntos íamos à missa da meia noite. Meu coração não bate, apanha da vida neste instante em que talvez eu não possa mais vir, neste natal te buscar. Desculpe filha! Dizem que “Deus escreve certo por linhas tortas”, mas eu nem mesmo sei se tortas ou retas qualquer linha sem ti tem valor. Preciso ir. Vem me buscar neste natal!
Por Carlos Sena
“No natal a gente vem te buscar”. Dorme. Dorme profundamente que eu volto. Volto com o teu brinquedo preferido nas mãos. Volto pra novamente correr contigo nos campos e ver a tarde se entregar a noite, como sempre fizemos em todos os natais. Neste, não. Eu não vou estar aqui no teu natal, mas não te preocupes que eu volto. Volto como voltam as estações e eu serei primavera só pra te ver colher flores dos meus braços. Se você preferir, eu voltarei inverno, mas é preciso que me digas mesmo sem que eu esteja por perto. Sendo inverno eu voltarei cheio de agasalho e quero me sentar ao teu lado pertinho da lareira, como nos velhos tempos. Quero abrir a porta da cozinha e ficar vendo a chuva fininha molhando a terra e eu pedirei pra ela permitir que todos os frutos que gostas nasçam mais doces como doce é o teu sorriso. Por isso, não te acordes. Eu vou partir, mas volto. Devo voltar no natal porque quando a gente espera alguém que vem no natal, o tempo passa rápido. Na rapidez do tempo, vou lhe pedir noites curtas e dias curtos também, porque em cada noite curta eu vou cantar cantigas de ninar para que te entregues aos mais lindos sonhos; em cada dia curto eu quero ficar acordado contando as horas, vigiando-as e colocando o tempo no ábaco das ilusões achadas. Ah, como eu só gosto de ilusões achadas. Como essa que lhe digo nesta hora que já me vou. Ilusão verdadeira não se perde, porque quando ela se confunde no trajeto, a realidade dura invade e os sonhos poderão ser pesadelos. Por isso te digo que no natal a gente vem te buscar. Buscar pra sair a esmo no rumo do toque de sino perdido entre as maldades humanas; buscar para correr de mãos dadas porque as mãos já não se dão nos natais. As pessoas estão dando muito presente, mas não estão se dando sem ser natal. Por isso voltarei. Não, não acorda que eu ainda te canto um canto de despedida. Jingle Bels? Não. Eu te cantarei no afã de te dizer “Hoje que a noite está calma e que minha alma esperava por ti”... Cantarei um solfejo de natal inventado. É. Inventar uma canção de natal não deve ser difícil e por isto eu tentarei. Se eu desafinar não se importe. Não, desculpe. Eu me lembrei do lago do cisne. Quando eu vier te buscar no natal eu irei dançar feito bailarina como se eu fosse o Cisne e você o lago. Vou ser leve como o ar; e iluminado feito o sol só pra te ver sorrir no compasso dessa valsa vienense das mais belas. Não tenhas medo que certamente eu irei tombar nalgum passo. Eu já faço isto na vida, mas farei tudo pra dançar certinho só pra você não se intimidar com os compassos descompassados.
Agora você dormiu. Agora eu sairei sorrateiramente pra não te acordar. Vou sair a esmo, vou buscar-me nas terras de além mar. Vou a terra “do sol nascente” ver se por lá meus sóis se recompõem pra que quando eu vier te buscar todos saibam – qual estádio de futebol quando os timos jogam – a redondeza inteira sabe que tem jogo, que tem espetáculo, que tem gritos de gente feliz. Agora me vou. Pela primeira vez eu partirei sem saber aonde chegar, mas tua lembrança me guiará até que a vida não me desespere. O desespero que a vida dá é quando a gente se perde dos natais porque eles se perderam em desesperanças. Você vai ficar aí, quietinha. Se, por acaso você estiver fingindo que dorme, durma de verdade. Às vezes na vida sonhar que tudo é verdade não nos dá ânimo pra prosseguir. Por isso eu te digo: dorme que no natal eu virei te buscar. Pronto. Parece que ela dormiu o sono dos anjos. A luz já está apagada e isso é bom porque nem minha sombra ela verá. Lá fora o sino da matriz está tocando, chamando para a missa do galo. É meia noite e eu nem me percebi que é natal. Prometi a minha filha que no “natal a gente vem te buscar”! Ela está ali, na sua caminha, como quem dorme. Mas ela tá fria, despediu-se da vida hoje, dia de natal. Por isto eu lhe disse mesmo sabendo que já não me escutavas que vinha no natal lhe buscar. Agora sou eu quem te peço: “vem filha. Vem buscar esse velho pai que não sabe se vai aguentar viver sem ti”. O sino da matriz está tocando. Melhor: hoje o sino bate. Ele tocava quando de mãos dadas e juntos íamos à missa da meia noite. Meu coração não bate, apanha da vida neste instante em que talvez eu não possa mais vir, neste natal te buscar. Desculpe filha! Dizem que “Deus escreve certo por linhas tortas”, mas eu nem mesmo sei se tortas ou retas qualquer linha sem ti tem valor. Preciso ir. Vem me buscar neste natal!