Amores de Esquina, Amores efêmeros
Rasgou o peito, restirou a pedra, transplantou um coração.
Renegou-se a ser frio, a não sentir, a não chorar.
Renegou-se a não protestar, se calar e engolir o amor barato que encontrou nas prateleiras de um supermercado fajuto. Sempre desconfiou que ali contrabandeavam paixões efêmeras. Paixões que nada acrescentavam, nada traziam, nada deixavam, tudo levavam. Até o que não lhes pertencia. Deixavam seu mundo em um caos total. A única coisa que conseguia era uma transa de 30 minutos e um cheiro de sexo pelo quarto. Um cheiro que impregnava em sua roupa, em si. Queria mais, buscava mais pois vivia sonhando com um sentimento maior, que durasse mais que 30 minutos. Estava cansado de portas batidas, e de ter que toda vez dar de cara com um bilhete de geladeira. E tudo que restava era um vazio, um beijo de adeus não dado, um afago não proporcionado pois não cabia dentro do contrato. Prejuízos. E não somente o financeiro por vivenciar amores de esquinas, mas prejuízos em seu coração que se perguntava se uma daquelas poderiam ser seu amor. Iludido, fantasioso ao extremo, carência nas veias. Tudo era vazio. Tudo estava vazio e tomando uma proporção cada vez maior.
Ele renegou-se a aceitar, a beber novamente as mesmas doses. Seu corpo repudiava a ingestão, recusava-se a alimentar essa necessidade de ter alguém só por ter. Ele não se encaixava e por não se desfragmentar, por não ser maleável e renegar os produtos desse mercado friamente insensível, foi escanteado, marginalizado vivendo à beira da estrada. Um dia cansado de se sentar em uma mesa de bar e pedir o prato de sempre, enquanto esperava alguém interessante pedir pra lhe fazer companhia por falta de opção, decidiu respirar novos ares. Estava cansado de ver as mesmas afeições, de dormir acompanhado por uma estranha e acordar tão só quanto já estava. Quanto já se sentia. A solidão parecia ser a sua única parceira. A única que não o deixava depois de receber o pagamento ou uma gozada após 30 minutos de uma transa sem algum sucesso. Continuava só, buscando o certo nos lugares incertos, da maneira errada.
Ele não aceitava, embora encontrava-se cada vez mais imerso nessa água sentimentalmente turva. Parecia não alcançar o fundo e quanto mais fundo ia, mais se perdia, menos encontrava. Se viu faminto. Sentiu o peito apertar e o estômago da sua alma embrulhar. Diante de mais uma noite dessas, desejou novamente se abdicar. Tinha vergonha das marcas em sua pele, desse amor injetado diretamente no peito se um beijo para selar. Não podia escondê-las e nem negar o efeito que causavam em seu coração. Mas a dependência já tinha alcançado a sua mente. Estava preso e vez ou outra se via dentro de mais um quarto desconhecido, adentrando em um mundo oposto ao que sonhou pra si. Vivendo... supostamente vivenciando mais uma história com mais um destes amores de esquina. Vivia, mas já estava morto e sentia isso dentro de si.
E já não vivia, morria e quem olhava para ele percebia que sua busca era maior, que seu coração buscava, lutava, acreditava mesmo estando dentro daquele supermercado onde comercializava-se amores efêmeros. No fundo da retina de seus olhos fundos, restava um pouco do brilho, onde residia essa vontade de acreditar que um dia poderia encontrar seu amor pelo mundo. E mais uma vez ele tentou, e foi se abdicar...