O silencio

Acordei no quarto dela, duas e pouca da manhã.

Deitada de costas, ela jazia. Podia ouvir o respirar pesado de seu sono inquieto. Os cabelos castanho-escuros espalhados cobrindo as costas nuas ainda exalavam o perfume que sempre me agradara. Levantei tomando cuidado para não acorda-la. Andei pelo quarto e apaguei a vela que tremeluzia em sua penteadeira. Faltara luz no inicio da noite.

Bebi um gole do vinho branco que ela se embebedara antes de me receber. Mesmo não bebendo vinho, decidi provar daquele. Mesmo sabendo que não devia, havia resolvido ir até ela. Não sabia o que fazer agora... Não tinha sono, não queria deixá-la... Mas não podia ficar.

Preferia ir, a vê-la acordar. Preferia sair de madrugada, sem dizer nada, do que receber o olhar que ela sempre me dirigia depois de nossos encontros casuais. Eu sabia que só nos instantes que dividíamos a cama é que conseguia vislumbrar quem ela era realmente. E aquela mulher, fazia de tudo para esconder o que sentia. Incomodava-a bastante. Feria-lhe até...

E desta forma, deixei-a, naquela noite de 23 de março. Desci as escadas e andei sozinho pelas mais escuras ruas de Recife.

Andei por muito tempo sem saber por onde ia, até que me deparei com a porta da minha casa. Entrei e fui direto ao meu quarto. Não sei por quanto tempo dormi, mas mesmo depois de acordado, me deixei ficar na cama até a fome e sede se tornarem insuportáveis. Meu telefone tocou várias vezes.

Deixei-o tocar.

Sentia-me exausto. Exausto como nunca estivera. A situação em que tinha me metido por causa daquela mulher extenuava-me. Ama-la e manter silêncio era extenuante. Deixa-la dormindo por repetidas noites e fingir que nada havia acontecido nos dias que se seguiam era anti natural para mim. Sentia-me cansado.

Levantei-me e tomei um longo banho. Sentei-me no chão e deixei a água levar consigo o meu cansaço. Regressei em pensamento ao dia em que aquilo começara. O dia em que vendi minha alma, o dia em que aceitei o inaceitável daquela mulher.

Eu beijara-a de surpresa. Sem saber o que fazia. Simplesmente fiz o que parecia ser natural, segui o fluxo.

Vínhamos convivendo como amigos por vários meses, dia após dia nos tornávamos cada vez mais íntimos. Dividíamos tudo em nossas vidas. Parecia natural, sentia uma urgência fisica de beijar-lhe. Quando o fiz, pareceu-me que ela gostara... No entanto, ela deixou-me sem dizer nada. Não nos vimos mais por alguns dias, até que me ligou numa noite de sexta feira.

Pediu-me que fosse até sua casa.

Relutante eu fui até ela. Abriu-me a porta e não me disse nada. Apenas me beijou e levou-me para o seu quarto. Amamo-nos. Amei-a.

Por fim, disse-me que durante o dia, seriamos apenas amigos, como sempre fomos. A noite quando ela me chamasse, poderíamos ser amantes. Mas só nestas condições. Aceitei, vendi minha alma.

E assim tem sido, pelos últimos seis meses. Amo-a, mas o preço desse amor é o meu silêncio.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 25/11/2012
Código do texto: T4003717
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