FAÇO TUDO POR AMOR (CAP. 41)

Ela chegou perto das nove horas da noite e me encontrou emburrada, sentada no sofá. Rafa não tinha nem largado a bolsa e os livros em cima da mesa e eu já estava aos berros:

- Eu pedi que você não contasse nada a eles!

Rafaela ficou surpresa com o meu surto. Dificilmente eu perdia a calma mesmo que isto significasse eu me corroer por dentro.

- Ei, mal cheguei!

- Por que você contou a eles que eu fui para a rua? Por que não me deu um tempo para ajeitar as coisas?

- Porque não estou com a menor vontade de levar você nas costas!

Aquilo estava longe de ser uma conversa civilizada. Todo o diálogo era feito em alto e bom som.

- Desde quando você me levou nas costas? Por algum momento que fosse você achou que eu iria lhe pedir dinheiro para pagar minhas contas?

- Mesmo que pedisse, não iria adiantar. Sou tão dura quanto você é. Quer mais? Nossos pais têm que saber o que está acontecendo nesta casa!

Comecei a ficar cada vez mais enfurecida. Continuei sentada no sofá para manter alguma distância dela antes que nos atracássemos de vez.

- E o que está acontecendo aqui? Para mim tudo está tão normal quanto sempre foi.

- Ah, mas não está mesmo – e Rafaela apontou o dedo para mim – Contei tudo para eles. Alguém tem que chamar você para a responsabilidade.

- Nunca fui e nem nunca serei irresponsável! Você está louca!

- Desde que você começou a namorar este tal de Nando... Você está se dando conta do que está fazendo?

- Sim, eu estou amando este “tal de Nando”. Assim como você também deve estar amando o ”tal do Guto”.

- A diferença é que eu não me anulei namorando o Guto. Já você, por causa do seu namorado, não está indo à faculdade, perdeu o estágio... Esqueci alguma coisa? Você deixou sua vida para viver a dele.

- Talvez eu tenha feito isto porque a vida que tenho levado não seja mais tão interessante.

Rafaela ficou surpresa com o que eu disse. Imagino que a vizinhança também, devido ao som cada vez mais alto das nossas vozes.

- Bem, se sua vida não está sendo mais tão interessante, o que pretende fazer? Largar tudo?

- Quer saber? Tenho pensando muito nisto.

- Pensado em quê? Em largar tudo? – Rafaela nem disfarçava mais seu assombro com a minha revelação.

- Não gosto de cursar Design – confessei furiosa – Não gosto dos meus colegas e nem dos meus professores. Até foi bom ter saído do estágio. Quem sabe eu consigo outra coisa que me dê mais satisfação?

Minha irmã ficou muda, sem saber o que dizer. Eu prossegui, desafiando-a:

- Vá! Conte tudo aos nossos pais. Conte que sua irmãzinha surtou!

- Conte você – ela sussurrou, arriando-se em uma cadeira – Eles já estão chocados com as suas atitudes. Eu não vou pôr mais lenha na fogueira.

Ficamos as duas em silêncio por quase um minuto. Com a voz mais ponderada, Rafaela perguntou:

- E o que você vai fazer agora?

- Não sei – respondi de mau humor – Vou acordar amanhã e pensar em alguma coisa.

- Você quer mesmo largar o curso? Você estudou tanto para passar no vestibular... Até planejamos trabalhar juntas.

Ela parecia genuinamente abalada com as coisas que eu havia dito. Respondi chateada:

- Você não iria querer uma pessoa rabugenta ao seu lado como colega.

- Ao menos você descobriu do que gosta? Ou melhor, qual curso gostaria de fazer?

- Hotelaria. Acho que posso gostar desta área.

- A nossa universidade não oferece este curso. Somente as particulares.

- Eu sei – respondi desanimada.

- E como você pretende pagar esse curso?

- Não sei.

- Bem, imagino que você vai pensar sobre estas coisas amanhã cedo?

- Ou amanhã de tarde. Não tenho mais compromisso para me levantar às seis horas da manhã.

Minha irmã se levantou, demonstrando não estar mais a fim de continuar aquela conversa estressante. Suspirou:

- Espero que você não se acostume na boa vida.

- Em absoluto – neguei veementemente – Ainda mais que eles disseram que vão vir para cá em quinze dias caso eu não tenha dado um jeito na minha vida. Você já sabia disso?

- Claro, eles me contaram.

- Simplesmente isto não tem cabimento. Eu tenho 22 anos, não preciso que meus pais venham me fiscalizar.

- 22 anos, mas com comportamento de 15.

Ela disse aquilo e se enfiou no banheiro para tomar uma ducha. Emburrada e de beiço, voltei para meu quarto e dormi logo que pus a cabeça no travesseiro.

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Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 18/08/2012
Reeditado em 18/08/2012
Código do texto: T3836387
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