Secret Places: all that I want is to dream again (Lugares Secretos: tudo que eu quero é sonhar de novo) - Parte 1

Tudo começou numa madrugada fria de inverno em São Paulo. Meu nome é Anabelle. Sou branca, cabelos loiros avermelhados, olhos azuis, estatura mediana. Não sou do tipo modelo mas, chamo a atenção.

Moro com meus pais Rafael e Teresa, em uma bela casa de dois andares. Um lindo jardim com espaço para meus temperos, forno à lenha – pois adoro cozinhar para minha família e amigos poucos – e uma piscina não muito grande. Durmo em uma das suítes no segundo andar. Quarto de janela ampla, maravilhosa, com lindas cortinas em linho bordadas; banheiro com banheira, e alguns vasinhos de plantas. Os móveis do meu quarto seguem um estilo mais oriental, mas despojados: minha cama, por exemplo, lembra construções árabes, é feita de vime, possui uma espécie de dossel em formato de gota, revestido de almofada, muito aconchegante; em um dos cantos um tatame com almofadas espalhadas; uma bela estante de livros, cds e dvds; meu computador; muitos penduricalhos, dentre eles bandeirinhas tibetanas coloridas na janela, mobiles, uma mini árvore de luzes, muito delicada e outras coisinhas. Lembra o da personagem Luciana da novela Viver a Vida . Em algumas coisas me inspirei nele.

Nas últimas semanas estava num período mais calmo na faculdade. À noite andava vendo muita televisão o que acabou me alienando demais. Afastando-me da música que gosto tanto. Resolvi que esta noite ouviria música. Ajeitei-me na cadeira confortável do meu computador, sem nada em mente. Sou muito eclética e sem preconceitos, escuto de quase tudo: desde Bruce Springsteen a Franz Ferdinand .

Comecei ouvindo Foals , banda muito boa de rock eletrônico, que havia visto ao vivo em um festival aqui em São Paulo. Tinha lembranças muito boas daquele show. Jamais esqueci aquela noite, a platéia cantando junto as músicas, aquela energia dos músicos, foi incrível. Resolvi ver algumas fotos de shows, bastidores e ler algumas entrevistas. Ai... ai...comecei a pensar: “- O guitarrista é interessante, bonito e usa umas roupas demais (cada camiseta linda). E que presença de palco”. Li uma entrevista com um dos integrantes da banda, o Yannis vocalista, onde indicava bandas novas. Resolvi dar uma conferida nas bandas, fazia muito tempo que não ouvia algo novo, nada que me surpreendesse e que me fizesse desligar de tudo. Fizesse esquecer de tudo à minha volta.

Foi quando me deparei com uma banda novíssima com pouquíssimas músicas. No lastFm deles não tinha musicas para ouvir, apenas algumas fotos. Uma delas me chamou muita atenção, não mostrava muitos detalhes dos rostos. O que se via eram apenas sombras mas, era de um mistério, de uma magia e de uma beleza ímpar. Resolvi procurar mais imagens, eles já haviam me ganhado pelo visual. Consegui mais algumas fotos, que também não ajudavam muito, foram tiradas de muito longe e eram muito pequenas; mas uma em específico me agradou, era de uma resolução muito ruim, mas a que melhor dava para ver seu rosto e feições. Quando bati os olhos no vocalista senti algo que jamais havia sentido antes, era como se já o conhecesse, era como se ele tivesse despido diante de mim, via sua alma inquieta, que parecia suplicar por um alento. Ele não era do tipo de beleza comum, porém muito bonito. Pele clara, magro, não muito alto, cabelos castanhos escuros curtos, despenteados, olhos verdes escuros, boca pequena de lábios delicados, mãos muito delicadas, de veias saltadas, dedos finos (com certeza calejadas da guitarra). Consegui algumas músicas e finalmente comecei a escutá-las. Pelo que vi em seu Myspace ainda não tinham muitas músicas, faziam um som rock eletrônico, dançante, mas muito consistente. Logo na primeira música já não pensava em mais nada, apenas no som. As músicas eram cantadas quase aos sussurros por uma voz extremamente doce, era como se ele murmurasse aquelas palavras em meus ouvidos. Comecei então minha incessante busca por mais informações sobre eles: de onde eram, quais suas referências e gostos. Quatro integrantes de Oxford, uma pequena cidade inglesa muito antiga e de arquitetura espetacular. Não conseguia parar de buscar mais informações, lia tudo que tivesse alguma relação a eles, devorava cada entrevista, cada site era como se fosse único a dizer sobre eles, a ter as informações mais quentes. Nas entrevistas, que não eram muitas, fui descobrindo um front man inseguro, contido, de poucas palavras, verdadeiro e extremamente apaixonado pelo que faz, características que foram me apaixonando ainda mais. Seus músicos, livros e filmes favoritos diziam muito mais sobre ele do que ele mesmo. Não é de falar muito nas entrevistas, deixando que os outros companheiros de banda falassem por ele. Mas que por detrás de um garoto sério e tímido, de sorrisos contidos, existe um menino sonhador, que quer com sua música fazer as pessoas se divertirem, dançarem e sonharem.

Quando me dei conta já estava quase amanhecendo, não percebi o tempo passar. Há meses não tinha uma noite tão agradável, há meses não sabia o que era ouvir músicas tão boas, não pensar em nada e esquecer dos problemas. Consegui algumas músicas de estúdio e ao vivo. Coloquei em meu Ipod e fui para cama. Dormi ouvindo a mais nova descoberta.

Ainda bem que era domingo. Acordei eram duas horas da tarde, um pouco cansada ainda, mas com a sensação de que tinha viajado o mundo em apenas uma noite. Não só tinha conhecido lugares muito bonitos que não imaginava, como também pessoas como eu: com sonhos, anseios e medos. Sobrevivendo com dificuldade, mas, vivendo seus sonhos e fazendo trabalhos lindos. Como eu sonhava fazer um dia, não com música, mas quem sabe com outras formas de arte.

Fui comer um lanche e tomar um copo de leite. Tinha que terminar um trabalho chatíssimo da faculdade que era para segunda feira. Fiquei de mandar minha parte para Mariana, uma colega e muito amiga, que ficou de juntar as partes e concluir o trabalho.

Meu pai tinha ido a uma viagem de negócios e minha mãe resolvera ir junto. O trabalho acabou demorando mais do que previa. Mesmo tendo dormido bastante ainda estava cansada. Telefonei para Mari avisando que já havia encaminhado minha parte do trabalho.

Precisava de um banho. Liguei a água da banheira, joguei uns sais relaxantes que ganhei da Mariana, peguei meu Ipod e liguei a minha mais nova paixão do momento. Acendi um incenso. Entrei na banheira Não queria saber de mais nada, apenas relaxar. Apesar de não estar fazendo estágio esse semestre, as aulas estavam muito cansativas. Embora tivesse total apoio de meus pais, não estava em um período muito bom, cheia de dúvidas e incertezas. Será que Direito era o que realmente queria? Talvez o que eu sonhava para mim nunca seria capaz de realizar plenamente. Brigava muito com isso. Enfim, precisava mais do que nunca daquele banho, ouvir aquela voz doce, aqueles sussurros, aquela guitarra, só ele e a música poderiam me tirar desse mundo maçante e me transportar para um mundo cheio de alegria, de beleza e vida!!! Sem cobranças e nem regras.

“Never seen the world in such colours”

Peguei minha bucha pinguei algumas gotas de meu sabonete de algas, presente de uma prima, passei em todo meu corpo, com delicadeza, sentindo cada parte sendo hidratada e relaxada. Com mais delicadeza em meus seios e partes íntimas. A água estava na temperatura perfeita. Recostei-me na banheira. Veio-me em mente o rosto dele e pensei: “- Apesar de toda aquela pose de sério ele tem um ar de s... Ai...ai... Nunca pensei que diria isso. Meu Deus. Olha o que ele fez comigo em tão pouco tempo!”. Aumentei o som. Estava pensando em coisas que jamais ousara pensar, talvez por timidez ou por não ter achado a pessoa certa. Tive algumas paixões rápidas, cheguei a ficar um tempo com um rapaz da escola, muito meu amigo, mas era um sentimento ingênuo, puro, sem malícias. E um garoto da faculdade, o Marco: muito culto, atencioso, apaixonado por música e bonito me deu várias indiretas. Ele com certeza seria o genro que meus pais pediram a Deus. Mas sabe, não sentia aquele frio na barriga, o coração acelerado, a mão suando frio. Fiquei mais uns vinte minutos na banheira.

Desci e fui até a cozinha. Estava morta de fome mas, resolvi que jantaria só besteiras. Pizza, hambúrguer ou miojo? Todos? Acho que agüentaria. Mas resolvi ficar só com a pizza. Liguei para minha pizzaria favorita e pedi meia mussarela meia portuguesa. Abri uma tônica e fui para sala ver televisão e esperar a pizza. Domingo. Nada de interessante passando, coloquei no canal Travel & Living, passava uma matéria muito interessante sobre os ingleses, com seus costumes e comidas. Adoro esse tipo de programa. Gosto muito de saber sobre a culinária de outros países, às vezes invento de aprender algum prato diferente. Cada lugar lindo, os jardins, as construções muito antigas de tijolinho aparente junto a construções modernas, que arquitetura linda, pensei: “- Os ingleses realmente sabem unir o moderno e o antigo em perfeita sintonia. Está aí um país que gostaria de conhecer. Quem sabe não dou sorte de trombar com algum músico por lá. Seria um sonho”. Toca o telefone interrompendo meus devaneios.

- Alô. Oi Mariana! Recebeu meu email? Tudo certo? Espero eu, Não agüento mais ver esse trabalho.

- Recebi sim. Terminei agora há pouco mas não estou te ligando por isso e sim para contar uma novidade. Anaaaa!! Você não vai acreditar. Estou aqui dando pulos de alegria!!!

- Nossa que foi? Não vai ter aula amanhã? Ai, seria um alivio, dormiria o dia todo.

- Não, não. Muito melhor que isso. Lembra daquela minha amiga de infância, a Isa?

- Lembro. Você comentou muito sobre ela. Disse que estava morando na Inglaterra um tempo. Estudando moda não é?

- É. Então, ela me convidou para passar as férias lá. Parece que ela está namorando um gatinho de uma dessas bandas do tipo que você gosta, e quer que eu vá conhecer. É uma cidade pequena muito próxima de Londres, mais ou menos uma hora. Disse que a cidade é linda. Tem uma vida noturna muito ativa, sempre tem uns shows, exposições de arte e etc... Mas o mais importante: ela disse que lá só tem gatos. É claro que não vou deixar de ir né!!!

- Nossa que legal Mari!! Acredita que ontem estava ouvindo uma banda de lá, o som deles é lindo, estou viciada. Eles fazem um tipo de som...

- Ah tá legal, legal essas bandas. Então, ela falou que eu poderia levar uma amiga. Pensei em você já que gosta tanto dessas bandas, parece que tem muitas por lá. Quem sabe você não descola um músico gatinho e desencalha. Só que para isso você vai ter que deixar de ser tão careta viu. Esses tipos não gostam de meninas caretas.

- Nossa obrigada. Valeu mesmo. Quem sabe até aceito seu conselho.

- Então combinado. Fala aí com o tio para ver a passagem logo para não dar erro. Depois te falo o hotel onde vamos ficar e as datas. Minha amiga já está organizando tudo por lá. Ah...e já vai preparando umas roupas menos certinhas. Dá uma cortada nesse cabelo. Não, melhor, vamos essa semana ao shopping depois da aula. Vou te escolher umas roupas legais e te levo no meu cabeleireiro.

Toca a campainha. É a pizza. Despeço-me da Mariana e vou para cozinha. Estava com muita fome, comi a pizza quase inteira. Desliguei a tv e fui para meu quarto. Estava exausta, mas não agüentei e liguei o computador. Fui dar mais uma olhada no Twitter e no Facebook deles. Li mais umas duas resenhas. Vi mais algumas fotos ao vivo, com qualidades melhores. Logo desliguei e fui para cama, teria aula cedo e apresentação do trabalho. Peguei no sono ouvindo mais uma vez aquelas músicas, não conseguia ouvir outra coisa que não fosse sua voz e guitarra viciantes.

Acordei super cedo. Meus pais tinham acabado de chegar de viagem. Minha mãe como sempre cheia de sacolas de compras. E meu pai sempre com algum souvenir cultural.

- Oi querida. Tentamos não fazer barulho. Já de pé?!

- Não. Não fizeram pai. Tenho apresentação de trabalho hoje. A Mariana já deve estar chegando de carro para me pegar. Sabe como ela é em dia de apresentação, fica super ansiosa. Somos umas das primeiras a apresentar. Como foi a viagem?

- Oi né. Ana.

- Oi mãeee. Tudo bem?

- Tudo. Trouxe presentinhos. Comprei um vestido lindo Ana, a sua cara.

- Ah tá. A viagem foi ótima. Você precisa conhecer Curitiba. É uma bela cidade, lembra cidades européias. O clima, as pessoas e a arquitetura. Você adoraria. Poderíamos ir nas férias.

- Pai depois você me conta mais. A Mariana chegou. Ah ela me convidou para ir para Inglaterra nas férias. Encontrar com uma amiga. Depois te conto com mais calma.

- Olha que demais!! E eu aqui falando em Curitiba. É obvio que a minha filhinha não trocaria Londres por nada, ainda mais com a Mariana. Vamos ver dependendo de como for...

Despedi-me e saí meio às pressas. A Mariana já tinha buzinado umas três vezes.

- Nossa Mari precisava buzinar tanto?? É muito cedo!!!

- Ah que nada! A maioria ainda nem voltou da balada. Só a gente que ainda acorda cedo para ir para faculdade. Um dia ainda deixo de ser tão certinha com essa faculdade. Nem sei mesmo por que faço faculdade. Depois meu pai me arruma um emprego com um amigo dele que nem olha diploma. Pensei que só ia ter gatos por lá, pelo menos era o que uma amiga me contava. Mas só tem bitolados que só querem saber de estudar, acho que não sabem o que é uma garota há anos. Se é que algum dia souberam.

- Nossa Mari quanto preconceito! Até que tem uns garotos legais, é você que não presta atenção.

- Preconceito não!!! É realidade mesmo. Tem? Quem? O Marco? Esse já se formou. E você tratou logo de dispensá-lo. E nem para dividir com a amiga aqui. Se bem que ele era muito certinho para o meu gosto. Até hoje não entendo porque você deu um pé naquele gato.

- Ah você sabe. Não sentia aquele frio na barriga, o coração palpitando, etc....

- E beleza não conta não? Ele te Dava o maior mole. Até que faziam um belo casal de certinhos. Parece que o pai dele arrumou um belo emprego para ele. Está feito para vida toda. Olha que esse artigo que você dispensou anda em falta no mercado viu. Vou logo te avisando.

- O pai dele não arrumou emprego nenhum! Ele passou por uma série de entrevistas. Gostaram muito do seu trabalho. Enfim ele é muito criativo, responsável e competente. Fez por merecer.

- Olha ai. Já que ele é tudo isso corre para ele. Com certeza ainda não te esqueceu, vai te dar vida boa com o salário bom que deve ganhar.

Silencio! Ainda bem que sou muito amiga da Mari. Estudávamos juntas no colegial. Somos tão diferentes. Sonho em ter uma profissão em que seja boa e quem sabe ter alguém para somar e dividir comigo. Não me vejo jamais em um emprego só porque meu pai é amigo de alguém, também não me vejo em um relacionamento com uma pessoa só porque ela é bonita, rica ou coisa do tipo. Existem valores muito mais importantes que esses. Coisa que às vezes acho que Mari nunca irá entender. Não a condeno. Tivemos educação muito diferentes. A mãe dela passa mais tempo viajando com as amigas que em casa e o pai só sabe trabalhar e reclamar da vida. Enfim. Mas apesar de tudo é uma grande amiga e tem grandes qualidades. É isso que importa. Acho que por isso somos tão amigas, pelas diferenças, acabamos nos completando.

Chegando na faculdade fomos direto para a sala. Fomos à segunda dupla a apresentar. Mariana decora muito bem o texto, e se expressa bem. Eu já sou muito mais tímida, mas sei bem sobre o trabalho. Acho que no fim foi uma boa apresentação. Terminadas as apresentações, a professora liberou mais cedo.

Resolvi dar uma passadinha no shopping, queria passar na agência de turismo e dar uma olhada nos preços de passagem. Para que quando fosse falar com meu pai já soubesse mais ou menos quanto gastaria. Estava estranhamente mais animada do que de costume. Resolvi até dar uma olhada em roupa, coisa que fico protelando. Não sou muito de usar vestidos, mas vi um, na Collins, que achei lindo, pouco acima do joelho, mangas que passam um pouco do cotovelo, em corte transversal (que achei muito interessante), gola redonda, vermelho vivo, com flores pequenas em branco. Me lembrou os vestidos lindos que Florence Welch usa. Não resisti, comprei. Passando pela Hering onde compro a maioria das minhas roupas acabei comprando uma blusinha tipo bata, lilás escura, de manga transparente bordada, uma gracinha; e uma bermuda não muito curta, cor creme para usar com ela. Ganhei meu dia. Duas boas compras e nem foram tão caras.

Cheguei em casa, minha mãe estava me esperando para almoçarmos juntas. Estava louca para contar como foi a viagem. E me mostrar o tal vestido que ela comprou. Já imaginava o tipo de vestido...Não culpo minha mãe: nós temos estilos muito diferentes, e ela sempre tenta impor o dela. Ela acha que não sei escolher minhas próprias roupas, que ainda não cresci, que uso roupas de menina. Nem tento discutir, sei que tenho estilo e muito, só não é o estilo clássico meio perua que ela usa. A Mariana bem que agradece, não precisa gastar tanto o cartão de crédito do seu pai, já dei vários vestidos novinhos para ela. Almoçamos uma salada leve (que minha mãe adora), um frango grelhado e legumes na manteiga (que sou louca). Depois conversamos um pouco sobre a viagem deles. Minha mãe perguntou que história era essa da tal viagem com a Mariana.

- Lembra da Isadora? Amiga da Mari.

- Lembro sim. Conheci os pais dela numa festa da Mari. Mas nunca mais os vi.

- Então, parece que a Isa estava fazendo um curso de moda lá na Inglaterra. Agora está morando em Oxford e convidou a Mari para passar as férias lá e disse que poderia levar uma amiga. Ela comentou que a cidade é linda. Igrejas, Universidades e casas de uma arquitetura medieval belíssima. Mãe, você não imagina a coincidência, ouvi uma banda na internet que é de lá. O som deles é muito lindo, nunca ouvi nada igual. Não consigo ouvir outra coisa desde sábado. Eles são pouco conhecidos ainda. Vai demorar para virem fazer show por aqui. Então pensei: quem sabe não consigo ver um show deles por lá. Seria um sonho. Você e o papai vão deixar, não é? A Mari falou que nem vai ficar tão caro. Nem imagino a emoção que seria de vê-los ao vivo. Fora que a cidade é histórica, vai me acrescentar muito culturalmente.

- Nossa Ana!!! Está encantada mesmo!!! Nunca te vi falar assim com tanto entusiasmo. Não se esqueça que não é mais adolescente mocinha. A fase de gostar de Backstreet Boys já passou. E não vai pensando que vai ficar - não é assim que vocês dizem hoje? - com um desses meninos. Eles são do tipo que não reparam em meninas como você, eles gostam das mais saidinhas, extrovertidas, que costumam usar substâncias impróprias. Mas disso depois falamos com mais calma. Também não entendo os pais dessa Isa deixarem ela ir para onde bem entende sozinha. Será mesmo que ela está fazendo moda?

- Mãe, eu nunca gostei de Backstreet Boys!! E pode deixar que não quero ir para ficar com nenhum garoto. Quero ir pela viagem e quero sim ter a oportunidade de ver uma banda muito boa ao vivo. Quanto às tais substâncias pode ficar tranqüila, eu passo longe delas. Nunca me passou pela cabeça. Parece que ela tem uma boa herança da avó e quando voltar vai abrir seu próprio ateliê de moda.

- Espero mesmo minha filha. É, vamos ver quando essa Isa voltar.

Fui para meu quarto. Tinha uns textos para ler, uns exercícios e umas matérias para repassar. Esqueci de mostrar as roupas que comprei, também para quê se sei que ela não vai gostar. Só saí do quarto com a chegada do meu pai, a noite, para combinarmos os detalhes da viagem. A Mari me ligou de tarde para passar o hotel e os preços.

- Oi pai. Como foi seu dia?

- Oi Ana. Um pouco cansativo, mas correu tudo bem.

- A Mari me passou as informações do hotel. Passei no shopping e peguei o preço das passagens. Não vai sair tão caro. No semestre que vem vou fazer um estágio, que está praticamente certo, será remunerado e muito bem. Aí te pago tudo que vou gastar.

- Imagina Ana. Você nem quis um presente quando passou na faculdade. Esse fica sendo seu presente atrasado, ok?

Concordei. Mas assim que começar a receber vou dar um jeito de pagar. Só pedi a meu pai porque sei que ele tem condições. E não consigo pensar em não ir nessa viagem. Acho que realmente estou ficando louca, nunca pensei que faria uma viagem ainda mais internacional, só para ver quatro meninos pulando no palco.

Jantamos. Assisti um pouco de tv com meu pai e fui para o quarto. Liguei um pouco o computador, mais uma vez dei uma olhada no Twitter e faceboo deles. Ebaaa!! Mais um vídeo ao vivo, tocaram umas três músicas no Abbey Road estúdio onde Beatles tocaram. Mas Só dava para visualizar uma música. Que performance emocionante!!! O estúdio, a luz, my front man ficara ainda mais bonito. Ele estava vestido de maneira simples para a imponência do estúdio, como se estivesse tocando em casa junto dos amigos, apenas se divertindo.

Ao vivo, as músicas, sempre executadas com muita emoção do começo ao fim, são o que chamam mais atenção. Pensei eu: “- De músicos ruins, como Rebecca Black , aparecem milhões de vídeos rapidinho, agora banda boa, fica nessa, aos poucos. Será que eles tem medo de sair da garagem? Fazem isso para matar a gente aos pouquinhos. Músicos são meio sádicos. Acho que no caso deles, e de muitas outras bandas, é insegurança; eles tem que acreditar mais que o que fazem é bom. Acho que vou lançar uma campanha no Facebook: Larga a mão de serem egoístas. Saiam da Garagem!!! Que o som de vocês é muito bom. A frase não ficou das melhores, mas a idéia até que é boa. Fui dormir com as imagens daquele micro show na cabeça. Decorei cada gesto, cada expressão de meu front man. “ - Ele tem um jeito tão bonitinho de cantar. Não sei bem o que é, mas sua voz mexe tanto comigo, me dá arrepios da cabeça aos pés”.

Mais um dia se inicia, nada de novo na faculdade, a mesma matéria chata de sempre, a mesma professora maçante de sempre. O intervalo sem nenhum assunto novo. Mariana teve que sair da aula mais cedo. Eu quase pedi para ir junto. Mas agüentei firme e forte até o final. Mas se alguém me perguntasse qual era a matéria era capaz de responder: “- Não sei. Talvez Rock, Dance-punk , Indie Rock, Math, Math Rock , Post-punk, talvez!”. Tamanho meu interesse na aula e tamanha minha obsessão pela minha mais nova paixão. Chegando em casa, tinha um recado da minha mãe avisando que não almoçaria comigo. Comi alguma coisa rápida. Resolvi cozinhar alguma uma comidinha para o jantar e se ainda desse tempo fazer uma sobremesa. Há algum tempo que não cozinhava. Adoro cozinhar, mas estava me faltando tempo. Fiz um strogonoff básico de frango que é rápido, o que me sobrou tempo para sobremesa. Estava com muita vontade de bolo de fubá; adoro bolo de fubá. E modéstia à parte, o meu é muito saboroso. Não costumo carregar na erva doce o que deixa o sabor mais delicado. Estava um pouco cansada, terminado o bolo, resolvi tirar um cochilo antes de meus pais chegarem. Fui para meu quarto, coloquei Total Life Forever para tocar e deixei Antidotes16 na seqüência. Como é bom adormecer ao som de Foals:

“If only we could move away, from here,

This is how we build a place, an aviary for today...

Let´s disappear till tomorrow...”

“Last vacation was the same

We could move away”

Um som tão calmo, tão doce, mas extremamente dançante, picante e com seus momentos de forte explosão. Essa mistura um tanto contraditória exala anseios, medos, sonhos, inseguranças, a vida em ebulição!!! Só ouvindo para conseguir entender. Acordei com o barulho de meus pais chegando. Jantamos. Estava vendo novela quanto toca o telefone. Era a Mariana perguntando se eu tinha checado meus emails. Queria me avisar que não teria aula amanhã. A professora teve um imprevisto e eles não conseguiram trocar a aula com outro professor. Nossa como agradeci essa folga. Ando tão sem saco para a faculdade, estudo Direito, a profissão do meu pai, que pensei ser a que eu queria. Mas cada vez mais vejo que gosto muito mais de outras coisas que não o Direito. Mas nada realmente forte e com possibilidades para que eu possa ter motivos para largar a faculdade. Entrei aos dezessete anos. Talvez muito cedo. Às vezes, penso que deveria ter feito um ano de cursinho, ou viajado como meu pai queria. Quem sabe não teria escolhido melhor. Será que aos dezessete anos, recém saídos do colégio, já temos definida a profissão que queremos seguir para o resto de nossas vidas? Começo a pensar que não. Acho que as faculdades deveriam ter um ano de matérias mais genéricas, antes das mais especificas. Acredito que assim evitaria muitas desilusões futuras. Enfim, a Mari me ligou para irmos ao shopping amanhã, comprar uma roupas para a viagem e passar no tal cabeleireiro, depois almoçar por lá.

Fui dormir pensando na vida e em todas essas coisas. Minha cabeça era um turbilhão. Liguei meu Ipod, tentei relaxar, mas não conseguia. Estava muito inquieta. Desci. Resolvi fazer um chá de hortelã, que costuma me acalmar mas, não adiantou muito. Liguei o computador. Pensei em ver mais fotos e informações da cidade aonde iríamos. O lugar era realmente lindo, os jardins das casas, a maioria floridos, muitas roseiras de diversas cores, adoro rosas. Mas ao mesmo tempo dei mais uma pesquisada sobre minha banda favorita. Acabei por acaso descobrindo um blog antigo do vocalista, nele contava sobre os shows e as turnês. Não imaginava que vida de músico era tão difícil. A gente imagina aqueles hotéis luxuosos, suítes maravilhosas, boa comida, mas não é sempre assim. Às vezes só um sofá duro para dormir e como única refeição hambúrguer ou besteiras do tipo. Fora as noites regadas a muita bebida. Adoro hambúrguer, mas, convenhamos, para alguém que tem um grande desgaste físico e emocional como eles, deveriam ter uma alimentação mais saudável. Deve ser difícil você estar em outro país, outra cultura, muitas vezes se sentindo sozinho, e tendo que fazer show, estando bem ou não. O dinheiro contado para tudo. Comecei a ler e não parei mais. A cada linha que lia era como se estivesse lá com ele, passando por tudo que ele passava, conhecendo cada cidade nova que ele estava conhecendo. Em uma das passagens descreveu lindamente uma cena em um bar, onde tocaram, na qual exaltava a beleza e o magnífico penteado de uma hostess. Nossa, fazia de forma tão delicada e apaixonada!! Jamais tinha passado por algo parecido. Admirei-o muito. Mas também senti um pouco de inveja da maneira como ele se jogou na vida, na estrada por um sonho. Em muitos momentos queria estar ali para ampará-lo. Acalmá-lo quando não conseguisse dormir, escutar quando precisasse de alguém que o ouvisse, ser companhia quando se sentisse sozinho, cuidar de sua alimentação, enfim ser amiga e parceira. Ele surgiu em minha vida em um momento que precisava muito de algo/alguém para acreditar. Trouxe-me vida, me fez voltar a acreditar e gostar de música. Conectar só me deixou mais confusa. Só fez crescer esse sentimento que tenho por ele. Sei que estou em um momento muito confuso e não sei que rumos este sentimento irá tomar, mas também não estou preocupada. Vou deixar rolar e ver onde vai dar. Sou jovem, estou na época de ousar e ser ousada. Desliguei o computador e fui tentar dormir. Agora mais do que nunca sua imagem não saia de minha mente. Quando consegui dormir já era muito tarde. Acordei com batidas na porta do meu quarto. Era minha mãe dizendo que Mariana estava na sala esperando. “– Nossa ela madrugou ou o quê? Quero dormir mais!!!”. Ela não madrugou, eu é que dormi demais. Quando ia levantar, ela entra no quarto, abre as cortinas, parecendo uma tempestade.

- Nossa Ana ainda dormindo? Parece que nem dormiu. Ficou fazendo o que até tarde para estar com essa cara? Estudando aposto.

- Calma, uma pergunta de cada vez. Estava ouvindo música e me empolguei, não vi a hora passar.

- Nossa não sei como pode gostar tanto de ouvir essas bandas, se pelo menos estivesse tirando casquinha de um deles, até entenderia.

Tomei um café rápido e um banho. Me arrumei. Avisei minha mãe que passaríamos a tarde fora, para ela não se preocupar. Chegando ao shopping aconteceu exatamente o que eu previa: Mariana queria que eu comprasse tudo que eu não queria comprar.

- Ana larga a mão de ser careta. Você é tão bonita, fica se escondendo nessas roupas ridículas. Parece uma freira. Só falta entrar para um convento. E rock é coisa do diabo viu! Você não vai poder ouvir lá. Pensei que gostaria de impressionar essa tal banda que você tanto fala. Quem sabe encontra eles por lá. Não vai querer ir assim, né?

- Tá bom Mari, você venceu. Vou aceitar umas duas sugestões suas. Ah comprei umas roupinhas ontem. Acho que você vai gostar.

Depois do almoço fomos ao cabeleireiro que elogiou muito meus cabelos bem tratados, mas disse que eu precisava ousar mais. Resolvi aceitar...em termos. Não cortei no comprimento mas, pedi que ele repicasse como o da Florence Welsh. E não é que ficou bom. Chegando em casa minha mãe levou um susto.

- Nossa Ana!!! Quem fez esse milagre com você? Quantas vezes disse para você cortar esse cabelo?!.

- Ah eu quis mudar um pouco. Só pedi para o cabeleireiro repicar um pouco.

- Ah é assim? Eu quase te amarrei na cadeira e isso você não conta.

- Ficou ótimo mesmo Ana.

- Obrigada mãe. É, a Mari insistiu um pouquinho, só um pouquinho. Eu já estava decidida.

- Isso que é amiga, viu.

Subimos para o quarto. Mostrei as roupas que comprei. E para minha surpresa a Mari até que gostou. Achou o vestido meio de senhora, mas disse que tem seu charme. Ela quis ver qual é a da banda que tanto falo. Como se ela tivesse interesse por música, sei bem seu interesse... Mostrei um vídeo ao vivo, que ela mal prestou atenção. Pediu para ver fotos.

- Ah, agora entendi seu interesse. Que gatinho esse aí. É o guitarrista?

- Ele é guitarrista sim. Mas não escuto música apenas porque os caras são gatinhos. O som é o que mais me atrai. Mas tenho que confessar que até que acho uns interessantes ai.

- Ah! confessou né!!

- Esquece, não falei nada.

Sabia que ela ficaria me atazanando por conta do que falei. Saiu sem querer. Sei bem como é a Mari, não quero contar nada por enquanto, quem sabe um dia conte. Ela quis ver fotos de mais algumas bandas da cidade para ver se tinha mais gatinhos. Apresentei mais algumas bandas que conhecia.

Logo ela foi embora, pois tinha um compromisso com sua mãe. Não entendo como pode só pensar se os garotos são gatinhos. Claro que reparo se são interessantes. Estou viva!!! Não é? Mas tenho que confessar que a música para mim geralmente é tão importante que pouco importa se são gatinhos.

Não desci para jantar, estava sem fome, comi muita besteira no shopping. O dia foi cansativo mas não consegui deixar de ficar mais um pouco na Internet. Entrei mais uma vez no blog de minha paixão, faltavam alguns dias para terminar de ler. Quando comecei, percebi em suas palavras a sombra de alguém importante, não lembrava de ver nenhum comentário dele sobre garotas antes, mas agora percebia uma certa saudade de alguém por parte dele. Comecei a pensar nisso e me dei conta de que algumas de suas músicas demonstram isso, ele sente falta dela. Confesso que foi muito difícil constatar isso, ver que minha paixão poderia estar sofrendo por uma garota. Deve ser por isso que não fale de namoradas. Pensei eu: “ – Quem, em sã consciência, deixaria uma pessoa tão especial? Dono dessa voz tão doce, angelical e sexy!!! Só pode ser louca, aposto”. Não tinha reparado que em seu blog tinha um perfil e para minha surpresa tinha o signo dele: libra. Pelo que sei são pessoas muito sérias em seus relacionamentos, quando se apaixonam é para valer. Conheci alguns librianos, dentre eles o Marco. Não conhecia muito sobre o signo fui procurar mais. Vi que não gostam de garotas atiradas e intempestivas, são um tanto tímidos e sutis em suas paqueras. “– Ai ai. Ele além de todas as suas outras tantas qualidades é tudo isso. Só pode ser um sonho!!! Será que ele realmente existe?”. Não sou do tipo que segue horóscopo à risca, como se fosse destino, mas sou interessada. Gosto de ler sobre os signos. Nas previsões dizia que o meu signo faz par perfeito com o dele, embora ele seja do mundo, de todo mundo e eu apenas do meu mundo. Nossa!!! Nunca havia pensado nessas coisas antes. A paixão para mim é algo tão nova. Comecei a pensar: será que não estava agindo como aquelas fãs ensandecidas desses cantores pops bonitões, gostando de uma pessoa inalcançável? Eu que sempre fui tão sensata e equilibrada. Como minha mãe bem disse, já não estou mais na idade de gostar de “Backstreet Boys”. Fui dormir com toda essa confusão em minha mente. Acordei muito indisposta. Acho que foi algo que comi no shopping. Estava com dor de cabeça, um cansaço e com uma cólica daquelas. Esperei um pouco para ver se passava. Acho que a indisposição não era só física era também era emocional, um pouco por conta deste turbilhão que estava vivendo. Como demorei a levantar, minha mãe veio até meu quarto saber o que estava acontecendo.

- Tudo bem Ana? Não tem aula hoje?

- Mais ou menos mãe. Tenho sim. Acho que foi alguma besteira que comi ontem e só agora me fez mal. Dor de cabeça, canseira, cólica. Mãe faz um chá? Talvez tomando algo quantinho e ficando de repouso, passe logo.

Hoje até que a aula era bem interessante. Com um professor que admiro muito. Mas realmente estava indisposta. Minha mãe trouxe o chá e aproveitou para trazer uma bolsa de água quente. Peguei meu Ipod e coloquei todas as músicas da minha nova paixão para tocar. Ouvi-los me acalmava, me dava ânimo e me fazia sonhar (o que realmente estava precisando).

Era como se ele estivesse ali a meu lado a me velar e sussurrar em meu ouvido aquelas músicas.

"But I can’t sleep, when you’re not here with me / Next to me"

Adormeci ouvindo sua doce voz. Acordei com minha mãe no quarto. Já passava do meio dia, ela trouxe uma canja, achou melhor eu comer algo leve.

- Como está Ana? Melhor?

- Um pouco mãe. Ainda cansada. Mas estou bem melhor da indisposição.

- Seu pai ligou para saber como você está. Disse que já comprou as passagens. E fez as reservas no hotel. Nossa que bom que vai viajar nas férias, você só estuda Ana. Não a vejo se divertir deste de que entrou na faculdade. Sair de vez em quando e se divertir não é falta de responsabilidade viu Ana.

- Eu sei mãe. Às vezes acabo sendo certinha demais. Acho que isso está me deixando assim. Mas vou mudar. Vou fazer mais o que gosto. Cozinhar mais. Talvez voltar a pintar. Tentar ser menos rígida comigo. Tô pensando até em pintar meu cabelo de vermelho, fazer duas tatuagens e colocar piercing no nariz.

- Cabelo vermelho, tatuagem, piercing!! Calma la mocinha! Não pode dar liberdade que vocês já extrapolam.

- Estou brincando mãe. Estou precisando colocar alguns pensamentos no lugar, acho que essa viagem vai ser muito boa. Mas relaxa que não vou extrapolar viu senhora.

- Senhora? É mãe tá!!

A conversa mais aberta com minha mãe, coisa meio difícil de acontecer, me fez um bem, estava me sentindo muito melhor. Às vezes, acho que ela espera muito mais de mim do que posso dar, por isso acabo não dividindo algumas inseguranças com ela e me cobrando demais. Consegui tomar toda a sopa. Tomei um banho. Liguei para Mari para contar que já estava tudo certo com as passagens e a hospedagem. Ela disse que seu pai ia ver isso à tarde. Contei também da conversa que tive com minha mãe, achei que ela não deu muita importância, no entanto, ela me apoiou quanto a mudar, ser menos certinha.

Comecei a mudança entrando no myspace da minha banda favorita e deixando uma mensagem muito carinhosa, dizendo que era brasileira, que o som deles era muito bom, que não conseguia parar de ouvir, que tinha me feito voltar a sonhar, elogiando muito uma música em específico (a minha favorita). Alguns minutos depois veio uma resposta, acho que eles estavam online, agradecendo o carinho e que bom que a música deles estava fazendo as pessoas sonharem, que era o que ele mais queria. Pelo tom da resposta dava para ver que era my front man, embora não fosse assinada. Dei pulos de alegria. Por alguns minutos consegui falar com eles. Fiquei mais um pouco no computador e fui para sala ver um pouco de tv com minha mãe.

Depois dessa conversa com minha mãe, os dias pareciam menos pesados, voaram, passaram muito rápido. O fim do mês já havia chegado, as provas já tinham acabado, e eu tinha passado por mais um semestre com notas muito boas. Mari já tinha comprado umas três malas de roupas novas para levar. Fez uma tatuagem “I love Music”, de henna, só para impressionar os garotos. Eu só comprei mais uns dois casacos de frio. Estava bem mais animada e a cada dia mais ansiosa com a viagem. Essa viagem para mim era um grande passo. Pela primeira vez estaria completamente sozinha, sem minha família. Quando era pequena costumava viajar para casa da minha avó, mas não era a mesma coisa.

Uma semana antes da viagem, num domingo, minha mãe veio conversar comigo.

- Então Ana, vim ter a tal conversa que disse que teria. Acho que nem precisava, mas você entende que sou mãe e tenho que ter esse tipo de conversa mais séria.

- É, não precisava mesmo mãe. Como disse não vou extrapolar mais do que achar que deva. Mas já que tem que falar, fala logo.

- Ai Ana, não fala assim. Só quero dizer para se divertir muito, mas com responsabilidade. Você sabe como são esses lugares. Pelo que você disse tem muitos roqueiros, eles gostam de tomar certas liberdades. Costumam beber muito e usar outras drogas. Não é como no colégio. Eles insistem, só para ficar com você e no dia seguinte nem se lembram mais de você. E nem pensam em camisinha. Então Ana tenha cuidado, não aceite bebidas, coisas estranhas, muito menos drogas. Lembre-se de que você vai estar muito longe, não poderemos te ajudar tão rápido como podemos quando está aqui...

- Pode deixar mãe. Vou saber lidar com essas situações. Você ainda acha mesmo que no colégio não tinha nada disso?

- Porque está falando assim Ana? Tinha? Porque não nos contou? Nós avisaríamos a direção. Trocaríamos você de colégio.

- Mãe, relaxa. Só tinha uns cigarros, nada demais. E eu nunca aceitei.

- Assim fico mais tranqüila. Seu pai também quer falar com você. Ele está na cozinha, pediu para você ir lá.

Desci. Meu pai resolveu cozinhar. Estava fazendo um macarrão ao pesto que minha mãe adora. Parece que foi com esse prato que meu pai conquistou minha mãe. Ela não gosta muito de cozinhar. E cá para nós, meu pai cozinha muito melhor e com mais paixão, o que dá um tempero muito especial.

- Oi pai. Seu super macarrão ao pesto! Mamãe disse que você queria falar comigo.

- É. Então Ana, acho que a parte mais chata sua mãe já fez a vez não é? Queria dizer que sei que é muito ajuizada e não vai fazer nada que não seja bom para você. Saiba que sempre estarei aqui para te apoiar. Também espero que essa viagem seja uma grande experiência de vida e que te traga mais ânimo para terminar a faculdade. Sua mãe me disse que teve notas muito boas. Meus parabéns! Vejo que está seguindo no caminho certo. Quem sabe, no futuro, não assuma o meu escritório ou melhor divide ele comigo. Ficaria tão contente com isso. Separei umas libras para você levar. Espero que se divirta um bocado. Ah! vê se não vai conhecer um músico por lá, querer ficar para sempre e esquecer seu velho pai aqui.

- Ah pai valeu. Ahaha. Boa. Pode deixar. Com todas as recomendações da dona Teresa nem resfriado vou pegar.

- Olha o respeito com sua mãe menina...

- Brincadeirinha pai.

Estava me sentindo como na letra de “Messenger” do maravilhoso músico Patrick Wolf , que diz:

“First came that dream.

To be seen. To know love.

The world...”

“Look, made it alive

And what a life

I have known

Not going to stop...”

Apesar das ressalvas de meu pai e de minha mãe, nada iria me frear. Pelo menos não antes de aproveitar o que tivesse que aproveitar na viagem.

Foi uma semana boa. Mas muito ansiosa e nos últimos preparativos. É chegado sábado, dia de nossa viagem. Mari queria ir me buscar de carro e deixá-lo no aeroporto. Mas nossos pais acharam melhor não.

- Não esqueceu nada Ana? Passaporte? Celular? Documentos? Dinheiro? Casaco de frio?

- Não esqueci nada mãe! Está tudo aqui. Já chequei umas duas vezes. Fora as cinco que você checou.

- Ai filha. Só dei uma olhadinha rápida.

- Ana, antes de sair de casa não se esqueça de esquecer tudo!!! É uma ordem. Esquecer as responsabilidades, a faculdade, as provas e a gente um pouquinho... Até as férias acabarem!!! Ouviu bem Ana. Ah! comprei esse presentinho para você não fazer feio lá. É muito chic como vocês dizem. A vendedora disse que combina com qualquer tipo de roupa – Era um fone de ouvido muito gracinha.

- Obrigada pai. Não vou esquecer disso. – disse eu abraçando bem forte meu pai e caindo os dois na gargalhada. Com minha mãe fazendo aquela cara de reprovação pelo que meu pai havia dito. Meu pai em muitas coisas é muito mais desencanado que minha mãe, menos careta e muito mais bem humorado. Saímos bem mais cedo para não ter perigo de nos atrasar por conta do trânsito. Chegamos ao aeroporto. Mari e seus pais ainda não haviam chegado. Ficamos esperando na sala de embarque. Já estava quase roendo as unhas, coisa que não faço, de ansiedade. Enfim chegaram. A Mari e suas trezentas malas. Não sei como ela vai agüentar levar tanta mala. Eu estou levando pouca coisa. Só o necessário e indispensável. Como uns três potes de requeijão, parece que lá não tem, eu sou louca por requeijão. Vou tentar levar escondidos na mala. Nos despedimos de nossas famílias e partimos rumo ao avião. Em mim um sentimento que só poderia expressar com essas palavras que ouvi várias vezes nas últimas semanas:

"... show me

How the find a sense

To the secret place the

That secret place"

”All that I want is to dream again

All that I want is to dream again”

Catarina Cervelleira (musiknonstop)
Enviado por Catarina Cervelleira (musiknonstop) em 02/07/2012
Reeditado em 13/06/2013
Código do texto: T3755647
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