Os Cactos
Cada dia que passa essa roça fica mais quente e mais seca, e onde está meu marido? Cada dia que passa as vacas ficam com mais sede, e onde está meu marido? Cada dia que passa meu coração aperta pela saudade, e onde está meu marido?
Sinto falta daquele homem. Sinto falta daquele caipira casca grossa. Sinto falta de vê-lo capinando o terreno com aquele chapéu enorme. Sinto falta de quando você beijava minha testa e me dava boa noite. Sinto falta daquela barba mal feita que arranhava meu queixo. Sinto falta daquele apoio que você me deu quando tivemos nosso dois meninos, que já grandes, vivem na cidade. Sinto falta de você. De você. Você.
Eu sempre dizia para você não falar com homens estranhos. Eu sempre dizia para você não negociar com eles. Eu sempre dizia que nossas terras não estão à venda. Eu sempre dizia para mentir sobre nossa vaca. Eu sempre dizia para você não sair de casa. Eu sempre dizia eu te amo.
Por que não me ouviu naquela manhã? Por que quis sair de casa com aquele cara na carroça. Por que pôs o chapéu e disse-me que já voltava? Por que não me ouviu quando falei que esse homem me parecia estranho? Por que não me ouviu? Por que? Por que?
Agora onde está tu? Nunca mais voltou. Nunca mais me deu bom dia. Nunca mais de meu boa noite. Nunca mais me abraçou. Nunca mais vi seus olhos. Nunca mais te vi. Nunca mais abracei alguém na cama. Nunca mais. Nunca.
Disseram-me que estavas morto. Disseram-me que já voltavas. Disseram-me tantas coisas. Mas acreditei em nenhuma. Disseram-me que estavas morto nos cactos. Disseram-me que estavas vivo no céu. Disseram-me tanta coisa. Disseram para que parasse de chorar por tu. De tanto que disseram-me, digo-te. Te amo.
Se me encontras viva, encontre-me agora morta lá nos Cactos.