Fragmentos de uma paixão
Ela se perguntou se algum dia ele a amou de verdade. Estavam deitados agora, em silêncio. Era sempre assim. Apesar dele insistir naquele hábito que ela tanto abominava,já não tinha mais forças para lutar contra. Aceitava,resignada.
O cheiro do quarto de motel já era familiar. Todo aquele ambiente aconchegante,mas levemente vulgar,já fazia parte da rotina. Rotina,eis uma palavra que ela definitivamente não gostava.
Sempre foi assim, desde o início. Uma atração súbita, uma paixão selvagem, uma ânsia de sentir,de estar juntos. Mas hoje ela descobrira que talvez tenha desejado mais e amado mais que ele.
Se é que ele a amou algum dia.
Despidos ali na cama, e tão próximos,ela se sentia docemente acariciada pelo perfume que o corpo dele exalava. O calor de sua pele a fazia se sentir protegida e as vezes ela se sentia um pouco a sua mulher. Mas nunca tivera coragem de lhe revelar isto.
Mas agora ela trazia marcas em si. Marcas de um amor que fizera. Seria de fato amor? Porque em seu íntimo se sentia ''usada'',machucada pela frieza de um homem que ela amava perdidamente.Estiveram juntos da forma mais perfeita e mais sublime que um homem e mulher podem estar. Só que ela estava por inteiro,e ele pela metade.
Se acostumou aos maus-tratos, as migalhas e aos motéis. A aliança em sua mão esquerda deixava claro os limites daquele relacionamento e o seu lugar na vida dele. Se acostumou a clandestinidade, a conter suas emoções, a passar os natais sozinha.
Sentia o peso da solidão, ouvia histórias que não eram as suas, dos filhos que não tivera com ele, e que desejava tanto terem sido seus.
Esse amor agendado e cronometrado, já não a satisfazia. Ela se sentia a cada encontro mais vazia. Mas o amava,e isso era tudo.
Quando ele virou-se para beijá-la ela escondeu o rosto em seu peito e o abraçou afetuosamente. Não queria que ele visse as lágrimas da dor que trazia consigo. E ao abraçá-lo percebeu que pra ela era um caminho sem volta. Nada mais podia fazer. Lutar contra esse sentimento seria lutar contra si mesma.
Ele era o seu destino.