Sexo no séc XVII           
Rubem Fonseca

Sexo no século XVII
No romance O doente Molière (São Paulo, Companhia das Letras, 2000).

Comecei beijando as partes do corpo de Armande deixadas à mostra pelo vestido. Inicialmente um beijo delicado no rosto, depois na boca. Ela retirou a minha peruca e afagou-me a cabeça; senti a delicadeza dos seus dedos na minha pele; não era raro homens da minha categoria, obrigados a usar peruca constantemente, rasparem a cabeça. Fiz com que ficasse em pé ao lado da cama e, lentamente, sem pressa, tirei peça por peça do seu vestido, e cada parte do corpo revelada era beijada de leve por mim. Eram três saias internas que Armande usava, e sobre elas uma outra saia, com um enchimento que alterava-lhe os quadris e lhe dava mais amplitude atrás, o que na verdade nada acrescentava à sua beleza.

Armande sempre se excitava ao notar o forte desejo que o seu corpo perfeito me causava, saber-se bela e ser desejada lhe dava um grande prazer. Depois de desnudá-la, deitei-a de bruços na cama e beijei suas costas començando na nuca, depois as omoplatas, e fui descendo até encontrar as duas partes redondas e firmes das suas nádegas, que afastei, abrindo caminho para minha língua. Depois virei-a de frente e lambi-lhe o pescoço, as axilas, os seios, a barriga, e finalmente detive-me no delicado estojo cercado de pêlos escuros, que ressumava um deleitável néctar. Fizemos amor lentamente, nossos corpos em perfeita harmonia quando parados, quando em movimento, alternando força e suavidade, deixando que os prazeres mais inefáveis invadissem sutilmente nossos corpos, conscientes de que o gozo era apenas um aspecto de fruição física dos amantes, um paroxismo que podia, e às vezes devia, ser adiado ou mesmo evitado.


Notas do leitor:
Conhecia alguns, digamos, sinônimos, mas “estojo cercado de pêlos escuros” é, de longe, a mais didática das definições!

Dúvida cruel: será que já beijei, algum dia, uma omoplata?
Só falta agora as "madres candidas"  pressionarem dona Josi a censurar a publicação, trocando-a de lugar. Argh!