POR QUE O AMOR É ASSIM?

Uma manhã daquelas como qualquer outra, mas não para qualquer um. Ele havia visto outras tantas manhãs, mas aquela para ele parecia diferente. No dia anterior parecia que tudo estava correndo bem, era aniversário. Não de um deles, era aniversário dos dois. Passaram horas se lembrando de como havia sido o primeiro dia. Era como um nascimento mesmo. Acordaram e eram apenas duas pessoas, mas de repente, em um daqueles encontros que não sabemos explicar, passaram a ser dois.

Essas coisas acontecem o tempo todo, é como um filme, um livro, ou a história que a gente ouve da visinha de uma prima distante. Mas agora era uma história real, ali, na vida de duas pessoas reais, que se olhavam todos os dias diante do espelho, que se olharam naquele dia, prestaram atenção a cada detalhe do que seria ser ele, ou ela apenas. Mas depois do encontro era tudo diferente, o olhar no espelho via o outro, não estavam mais só. Isso era comemorado todos os anos, igual aniversário de nascimento mesmo, e cá entre nós, aquilo realmente foi um nascimento.

Mas naquela noite, a noite de comemorar mais um ano, alguma coisa aconteceu que não estava certo. Ela não se sentiu bem. A gente sempre acha que essas coisas são charminhos, aquele dengo feminino. Mas justamente no dia do aniversário? Não melhorou! Dores fortes no peito, segundo ela era como se alguém tentasse arrancar seu coração do peito; era como se o apertasse entre os dedos. Nessas horas a gente não quer acreditar que precisa de um médico, mas era a hora de correr para um atendimento de emergência, a dor não diminuía mesmo passados quase trinta minutos. Ele correu para pegar as chaves do carro, mas não deu tempo. Quando voltou ela estava caída no chão da sala. Aquele súbito de desespero e angústia, aquele momento em que você sente cada célula do seu corpo se mexer, que parece que todo o seu sangue sobe e desce ao mesmo tempo em que gela todo o seu corpo.

O médico simplesmente disse, com aquela forma que só eles têm de dizer qualquer coisa, que nada poderia ter sido feito. Mas na verdade ele não pensava em nada, olhava para aquela manhã e simplesmente não conseguia acreditar. Era como um sonho ruim, daqueles que a gente se sente aliviado quando acorda, mas ele nunca acordou daquele. Um dia ele me ligou, queria conversar. Ainda me lembro da expressão no seu rosto. Ele ficou alguns minutos em silêncio, de alguma forma a minha presença lhe tirava algum peso do coração, mas nunca soube se era verdade ou apenas minha imaginação.

Ele rompeu o silêncio com um sonoro “por que o amor é assim?” Eu imaginei que as suas indagações, ou suas raivas seriam contra a vida, contra Deus, contra a morte, contra o mundo, sei lá. Mas ele disse apenas isso. No fundo eu entendia sua dor, embora não a sentisse. Ninguém, enquanto começa, pensa em acabar. Eles haviam passado uma vida inteira separados, finalmente estava juntos, aquilo parecia ser para sempre, mas não foi.

Aquela manhã era igual para todo mundo, mas para meu amigo era uma manhã fatídica. Nada poderia mudar ou aliviar. Ainda hoje me pergunto as razões que o silenciaram tanto tempo, e depois de tanto tempo me dizer apenas aquela frase questionadora, mas com um suspiro de alívio “Por que o amor é assim?”. Na verdade, ainda me pergunto o que ele quis dizer com isso, mas nenhuma resposta seria diferente de um sonoro “eu não sei”. Mas a grande verdade, é que de um jeito ou de outro, alguém que amamos está sempre indo embora.

Samuel Oliveira
Enviado por Samuel Oliveira em 30/04/2012
Reeditado em 09/05/2012
Código do texto: T3641533