As rosas, a promessa e uma santa

Os termômetros da pista do aeroporto de Cuiabá registravam 36 graus naquela tarde de janeiro. Para os nativos era sinal de chuva forte no fim do dia. Ele adentrou na sala de desembarque e pegou a mala na esteira. Parou por um instante e olhou tudo a sua volta. Buscou um olhar conhecido, um alguém que lhe desse um sorriso despretensioso. Avistou.

Pegou a bagagem e saiu da área em direção ao saguão e ao ponto de táxi. O olhar cândido com o um sorriso singelo veio ao seu encontro; e o perfume brando e marcante exalou pelas paredes amplas do lugar. Pararam um diante do outro e sem palavras receptivas apenas se abraçaram. Nada mais por longos minutos.

– Fez boa viagem?

– Sim. Na expectativa de encontrar você.

A internet, durante alguns meses, fora a única ferramenta que lhes permitia um encontro. Falavam-se sempre nas salas de bate papo de um site religioso. Foi ali que se conheceram, foi ali que teceram seus primeiros projetos. Nada de muito grandioso já que a vida dos dois não tinha nenhuma folha em branco. Ambos eram vítimas de suas escolhas e agora esperavam apenas um novo começar. Viveram os minutos parcos intensamente e sem muitas juras.

– Eu te imaginei exatamente assim, antes de ver a foto. – disse ela com voz doce e apaixonada.

– Eu não. Te imaginei menos intensa e o formato do teu corpo não me foi desenhado.

Se viram por fotos durante o tempo cibernético e talvez os diálogos longe dos olhos lhes tenham dado apenas dicas de como seriam ao vivo. A paixão originada na carência e a vida desgarrada de ambos não os permitiram ver defeitos. Aliás, nada mais comum. Porém se viram, se curtiram, se amaram e se prometeram.

– Eu conheço uma santa que é fantástica. E sinto que algo me reserva nesta vinda aqui.

– Eu confesso que não sou católica. Aliás, não sou nada. Mas respeito tua fé e me aproximo dela, se você assim o quiser. Não por submissão, mas pelo prazer de ter você sempre comigo.

Ele havia feito uma promessa a Santa Terezinha das Rosas. De acordo com sua fé, tão logo a santa lhe desse a graça que pretendia ele iria receber flores, pois essa santa é a santa das rosas e pequenas flores. Porém, diz a crença, que antes de receber as flores como garantia do cumprimento da promessa, o crente passa a ver flores em todos os lugares. Ele vivia isso ao lado da sua amada e era a maior fortaleza diante de uma vida completamente destruída.

Eu espero, sinceramente, que isso seja o inicio de uma grande história. Não sei se de amor intenso, mas que seja de um amor verdadeiro e único em nossas vidas. – disse ele com voz calma.

– Vai ser. Não creio que nosso encontro tenha sido ao acaso. Vieste de tão longe. Espero em Deus que seja um novo inicio para nós. – quis ela com sua pouca fé.

– Oxalá! – findou ele em esperanças reais.

Todas as promessas deles giravam em torno da promessa dele. Ela, incrédula e apaixonada, cria, mas não esperava e vez por outra soltava um traço de razão. Era o dia de voltar para casa e para a realidade que ele tinha deixado. Nada que não fosse possível solucionar, porém deveria ser feito com muita calma. A culpa pelas escolhas deles não lhes deixava outra solução senão tentar resolver tudo no tempo certo e preciso. Não havia mais espaço para novos passos incertos. De um lado e de outro.

Marcaram um encontro num hotel barato no centro da cidade e, como dois adolescentes na primeira vez, entregaram-se aos prazeres mundanos. Um sexo intenso e profundo. Mistura de libidinagem e veneração, de gana e pureza. Algo que somente a carne trêmula poderia decifrar e os lábios ressecados e o suor dos corpos entregava de bandeja aos dois e ainda por cima embebecido pelo cheiro do orgasmo múltiplo e cúmplice.

– Se não for para nós dois este momento, que seja unicamente vivido entre nós estas horas. As rosas virão e a promessa de uma vida santa se cumprirá. Oxalá! – disse ele.

Deixaram suas vidas no saguão do aeroporto. Ele no coração dela e ela no coração dele. Ali se misturaram a multidão que volta sempre para casa. Cada um com seu pensamento e sua expectativa. A grande certeza que traziam em seus mistérios era a de que nada no futuro seria previsto, mas o presente dado a ambos não tinha preço.

– Eu te deixo a minha verdade. – disse ele.

– Eu te deixo a minha verdade. – disse ela.

Sumiu de sua presença e nada mais seria dito até que as flores surgissem...