BIA
BIA
22 horas... talvez valesse a pena sair um pouco... de qualquer forma, o calor insuportável não a deixaria dormir.
Afastou a cortina e percebeu um aglomerado de pessoas, carros parados ...
O apartamento da frente impedia uma visão nítida dos detalhes da esquina lá embaixo ... mas algo acontecia,
Foi o que bastou! Decidida a sair, e agora curiosa com o que ocorria dezesseis andares abaixo, calçou uma de suas havaianas, olhou-se rapidamente no espelho do corredor e desceu.
Apesar do calor, da falta de uma perspectiva maior para o final de semana que se aproximava, sentia-se bem. Não tão bem quanto gostaria, mas tinha que admitir: sentia-se bem. A sua vida caminhava finalmente em paz ... já não havia o casamento malfadado ... arrumara um emprego ... voltara à faculdade ... seus pais estavam bem de saúde (depois de tantos problemas) ... enfim, podia relaxar ...
Esta hora do dia, em especial as sextas feiras, sempre tinham a sombra da solidão, que as vezes chegava a fazer-se palpável. E este era o único detalhe que a impedia de sentir-se completamente bem. Sorriu... Nem tudo era perfeito!
Saiu do elevador, abriu a porta e o ar da noite com seu cheiro de verão, de final de semana se aproximando, a deixou tonta de alegria. Inspirou profundamente e dirigiu-se ao que lhe pareceu um acidente. Foi chegando cautelosa e percebeu tratar-se de um mágico que estava a hipnotizar uma platéia escolhida ao acaso. Ficou ali, apreciando o moço mágico, até que o mágico moço a olhasse nos olhos, segurando-a, prendendo-a, e então tudo lhe pareceu perfeito.
Quando deu por si, estavam somente os dois, frente a frente. Ele sorria, ela sorria hipnotizada pelo olhar, pela aura que emanava dele. Até que, quebrando o encanto, ele perguntou seu nome. Conversaram horas, de pé, praticamente no meio da rua. Eles não se conheciam, mas pareciam tão familiares. Nunca tinham se visto antes, mas era como se jamais tivessem estado separados. Quando Bia percebeu já não era sexta feira. Era sábado e sua vida não era solidão, sentia finalmente o que era transbordar de felicidade.
Se despediram, trocaram telefones...promessas....
Afastou a cortina, olhou atentamente a esquina lá embaixo esperando vê-lo ... Fazia isso todas as 6. feiras, as 22 horas, nos últimos cinco anos.