O abraço

Hoje nos abraçamos. Não foi bem um abraço. Ela não fugiu, como sempre. E, eu aproveitei a deixa e apertei-a em meus braços. Quis transmitir-lhe segurança, carinho, calor. Quis demonstrar o meu amor. Mas, ela ficou imóvel, tensa, olhos muito arregalados. Não sabia o que fazer. Eu também não. Sabia que devia soltá-la, mas não queria. Queria ficar ali, segurando-a mais um pouquinho. Apenas um pouquinho mais. Dias atrás, eu tinha constatado que éramos iguais. Tínhamos os mesmos medos. Os humanos nos assustavam e, por isso, não queríamos contato. Era melhor, mais seguro, ficar de longe. Observando-os. Seguras, apenas cuidando os seus gestos, suas palavras. Gestos que já a haviam machucado. Palavras que tanto me magoaram. Éramos duas almas, de corpos diferentes e sentimentos iguais. Sentimentos de medo, de receio. Auto-proteção: o resultado de experiências anteriores, feridas abertas, lembranças dolorosas. Enquanto eu a abraçava, dizia: Calma, eu não vou te machucar. Viu? Não vou te machucar. E ela continuava me olhando, incrédula, sem reação. Então, deixei-a ir. Achei que iria pular para longe, no entanto, não o fez. Recuou devagar, observando-me, cuidadosa. Uma batalha tinha sido vencida. Restava-me saber como seria a próxima vez. Será que ela fugiria? Eu não sabia. Ainda não sei. Um dia, saberei. O importante é que um grande passo tinha sido dado. O espaço entre nós diminuíra. Ainda sinto, ainda lembro do nosso abraço. Um abraço entre seres, seres diferentes, almas iguais. Almas temerosas, estranhas, intempestivas. Tento entender o que ela sentiu, colocando-me no seu lugar e, recordando que, algumas vezes, também me sentira assim. Algumas pessoas também me assustavam. Não porque eu as temia, mas porque eu temia acreditar nelas, em suas palavras e gestos. Sentir-se abandonado é muito triste. Ficamos perdidos. Sem rumo. Não conseguimos entender porquê. Apenas nos perguntamos: O que fizemos? Num instante, todos estavam aqui, em um outro, estamos sozinhos e angustiados. O nosso mundo é esse, o meu e o dela. Enquanto eu a admiro por sua dignidade e coragem, ela apenas me observa com ar de curiosidade. Sobreviventes, ainda não sabemos o que será de nós. Nosso destino continua indefinido, apenas sentimos que o dia de hoje foi diferente, para mim inesquecível, para ela, talvez, estranho, confuso, um choque de emoções. Não sei o que acontecerá nos próximos dias, semanas...Sei somente que eu a protegerei com minha vida, se for preciso. Nunca mais alguém lhe machucará. Eu prometo.

Lisi Martins
Enviado por Lisi Martins em 24/12/2011
Reeditado em 09/11/2013
Código do texto: T3404925
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