Em poucos instantes estarei ao seu lado

A vida está deixando-o aos poucos, os seus batimentos cardíacos estão cada vez mais fracos, cada vez mais distantes, ecoando dentro da água enquanto ele afunda. Cinco, quatro, três, dois, um e meio... Um. Agora ele obtém as respostas que tanto procurou, as imagens passam por sua mente em lances confusos; ele pode ver a vez em que caiu na escola e conseqüentemente quebrou o braço, o dia em que ele e um amigo entraram de penetras numa festa e foram expulsos pelo segurança ─foi algo embaraçoso, mas ao mesmo tempo muito engraçado ─ Rendeu boas gargalhadas por vários dias, e até alguns meses depois ao lembrar-se deste cômico acontecimento ele ria junto aos seus amigos. Agora nos breves segundos em que está afogando-se esta imagem vem novamente à sua memória, e mais uma vez ele sorri. Imagens recentes surgem misturadas com lembranças antigas, pobre rapaz! Mesmo imerso na gelada água ainda consegue ouvir as vozes das pessoas que imploravam para que ele não consumasse aquele ato insano, ele vê com seus olhos esbugalhados de desespero os semblantes dos infelizes que se condoíam com a sua trágica escolha, homens, mulheres e crianças, todos ao seu redor, esperando o final daquele espetáculo bizarro. Os piedosos em lamúrias gritavam-lhe que não fizesse aquela besteira, os cruéis e insensíveis que assistiam com prazer aos seus últimos momentos comentavam com escárnio que aquilo era só uma encenação barata com o intuito de chamar a atenção, duvidavam que ele fosse fazer aquilo, e gritavam lá atrás em meio à multidão que se espremia barrada pelo cordão de isolamento dos policiais ─ Pula! Vamos logo, nós não temos o dia todo, você vai pular mesmo ou vai ficar ai só fazendo ceninha? ─ Eles não o compreendiam, sua família não o compreendia, seus amigos não mais o reconheciam, no trabalho as pessoas se afastavam quando ele estava passando, o terapeuta tornou-se para ele um fardo mais pesado que todos os outros que carregava; Alem de ser desprezado gratuitamente, agora ele tinha que pagar para uma pessoa que estava totalmente aquém aos seus problemas para ouvi-lo, e depois de uma hora de consulta mandá-lo embora e pedir que voltasse no dia seguinte para encher os seus bolsos de dinheiro, o terapeuta dizia a mesma coisa todos os dias desde o começo do tratamento ─ você está de parabéns! Estamos obtendo um progresso excelente, mas infelizmente por hoje a nossa hora acabou, volte semana que vem para continuarmos o tratamento ─ dizendo isto ele o olhava de cima abaixo, sobre as lentes dos óculos prestes a caírem do nariz protuberante, e antes mesmo que o seu paciente desse as costas fechava a porta. Ao infeliz, restava apenas dirigir-se ao seu apartamento, olhando todos ao seu redor, vivendo num mundo semi-perfeito, enquanto ele estava envolto em desespero.
Ao chegar em casa deparava-se com o velho vendedor de cafezinho que montava banca em frente ao prédio onde ele morava. Mesmo não querendo, receber um bom dia era inevitável e irritante, mas ele não podia responder com hostilidade àquele senhor tão simpático, ele não tinha culpa dos seus problemas, não carecia a este infeliz molestar ao pobre vendedor de cafezinho com a sua cólera; então respondia ao comprimento, mas não com o mesmo entusiasmo, o seu bom dia saia parecendo mais com o tossir de um moribundo em seu leito de morte. Após este acontecimento corriqueiro ele pagava o cafezinho e subia para o ambiente que a muito ele não considerava mais como um lar, sim como um jazigo. Tudo estava revirado, todos os cômodos estavam em desordem, roupas sujas sobre o sofá, pratos sujos sobre a mesa de centro, pedaços de vasos de ornamentação se misturavam aos cacos dos vidros do porta-retratos, sua casa estava uma bagunça, assim como a sua vida, como se um tornado tivesse passado por ambas. Não foi um tornado, foi algo pior, algo que pode destruir com a vida de qualquer homem e abalar até as edificações mais firmes. O fenômeno catastrófico que destruiu a sua vida e a sua casa tinha um nome, Mariani.  Ela chegou inesperadamente em sua vida. Ele a conheceu numa época em que se considerava imune ao amor ( alguns meses sem nenhum relacionamento sério, muita curtição, o mesmo discurso de que não compreendia como as pessoas podiam se apaixonar, sendo que a vida era bem mais prática quando se era livre) . O seu estado civil e o seu discurso não duraram muito, logo ele descobriria por que as pessoas se apaixonam, por que as pessoas se dedicam umas as outras de corpo e alma, e porque elas sofrem e sentem como se tivessem perdido parte de si quando elas vão embora.
No dia em que conheceu a sua amada era pra ser uma noite como qualquer outra, a não ser pelo fato que era a festa de noivado do seu primo. Tirando esta parte, aquele sábado era como um sábado qualquer. Iria sair para algum lugar, conversar com alguns amigos, tomar uns drink’s  e arriscar algum relacionamento sem compromisso. Mas naquele sábado tudo seria diferente, a partir daquele  dia sua vida nunca mais seria a mesma; ele estava conversando descontraidamente com o seu primo e alguns amigos, conversando com ironia a respeito do noivado do primo, e desde já se prontificando a organizar a despedida de solteiro. Quando de repente olhando para a porta que dava para a cozinha a avistou, ela estava junto à noiva do seu primo olhando os presentes que esta havia recebido, porém enfadou-se e decidiu ir para a sala beber alguma coisa e ver se conhecia alguém interessante. Quando ele a avistou cruzando a porta, acabou se esquecendo de tudo, inclusive da despedida de solteiros, os seus olhos se cruzaram assim que ela passou por ele em direção à mesa de comes e bebes, diante de tal oportunidade ele decidiu aproveitar para conhecê-la, antes que alguém tivesse a mesma idéia, deu um tapinha no ombro do seu primo, sussurrou duas ou três palavras no seu ouvido, que em resposta sorriu, e seguiu em direção à linda e adorável Mariani. Aproximou-se com receio, porém tentando demonstrar segurança, fez algumas piadinhas a respeito dos convidados e vendo que ela estava correspondendo pediu para se sentar ao seu lado, ficaram assim por um bom tempo, até a hora em que todos se levantaram para dançar e ele decidiu convidá-la, dançaram durante toda a festa, ele havia oferecido bebida a Mariani e como ela não tinha costume de consumir álcool, com poucas doses ficou serelepe. Ao final da festa ele a acompanhou até a sua casa, era por volta de 03h30min quando eles chegaram a casa dela, ele se despediu, estranhamente deu as costas e estava indo embora, quando ouviu a doce, porém meio embolada voz de Mariani chamá-lo, ela o beijou, ele a beijou, ambos se beijaram; sentaram na calçada e ficaram olhando as ultimas estrelas, esperando que o dia chegasse e trouxesse consigo o sol para iluminar o seu amor. Pouco tempo depois o intrépido conquistador de corações abriu mão de todos para ter apenas o que ele desejava e lhe fazia bem. Ele a pediu em namoro; viajou para vários lugares com sua amada, fez várias coisas que não costumava fazer antes, e decidiu pedir a sua mão em casamento. Casaram-se numa linda tarde de domingo, como o seu antigo apartamento era muito pequeno, decidiu se mudar. Mariani quem escolheu aquele que seria o novo lar deles dois, casa nova, vida nova, os filhos estavam incluídos nos planos futuros ─ Seria um menino e uma menina e eles dariam todo o amor do mundo a seus filhos ─ só que tragicamente os seus planos foram interrompidos.
Um belo dia Mariani voltava para casa depois do trabalho quando um marginal que vinha em fuga tomou-a como refém, ele a arrastou para dentro de uma loja e manteve outras pessoas sob ameaça, mas não largou daquela que ele havia capturado primeiro, o destino havia escolhido aquele dia para definir para sempre como acabariam três vidas.


Continua
 

Meu Perdão
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Roberto Codax
Enviado por Roberto Codax em 08/12/2011
Reeditado em 18/12/2011
Código do texto: T3378982
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