O CARTÃO DE NATAL

Era o mês de dezembro e Joana fazia a tradicional faxina de fim de ano, daquelas que são feitas em casas do interior que se preparam para a chegada do natal e do ano novo. E nessa faxina se incluia também a limpeza de gavetas. Foi em uma dessas gavetas que Joana o encontrou. Era um cartão de natal, antigo, postado no dia 18 de dezembro de 1975. Naquela época nem se pensava em envio de cartões virtuais. Tudo era feito a mão, e chegava pelo correio. Joana tinha o costume de juntamente com os enfeites que pendurava em sua árvore de natal também pendurar ali os cartões que recebia. Era a forma que ela tinha para homenagear aqueles que haviam se lembrado dela em uma época tão mágica do ano. Todo ano era assim. Estavam na árvore papais noéis, estrelas, anjos, bolas e os cartões que Joana recebia. E por um instante ela parou a faxina da gaveta. Passou os dedos levemente no papel e sentiu que estava mais fino, talvez pelo passar dos anos havia se gastado um pouco. Era uma bela imagem a do cartão. Num fundo azul com pontos prateados uma estrela brilhava no centro tendo em baixo do lado esquerdo uma silhueta de três homens que imaginou ela serem os reis magos. Joana estava ali, com o cartão na mão. Desde que começara a viver no mundo da internet a quantidade de cartões impressos havia diminuído muito. Recebia muitos recados, vez que professora do ensino médio e um tanto quanto carinhosa com seus alunos, eles a mandavam recados através das redes sociais conhecidas. No entanto, naquele momento era só Joana e o cartão. Ela o acariciava como um manuscrito de inestimável valor. Talvez fosse um dos últimos que havia guardado e nem se lembrava quem o havia mandado. A estrela prateada, talvez já não tivesse o brilho que tinha em 1975, assim como as expressões na face de Joana eram também diferentes. Agora marcas de expressão, rugas do tempo estavam em sua face sem no entanto diminuir a sua beleza. E ali, no quarto, em frente a gaveta sentada aos pés da cama Joana com o cartão de natal. Por um instante pensou em voltar com ele para a gaveta, ou poderia joga-lo fora. Mas por impulso não resistiu e abriu o cartão. Nele, lá dentro, escrito a caneta azul, uma declaraçao fez Joana deixar as lágrimas cairem pelo seu rosto. No cartão, em seu interior se lia: "Para Joana, a mais bela estrela da minha constelação e aquela que vai me guiar por toda a minha vida. São os votos de Augusto". Joana não pode conter as lágrimas, olhou em volta, viu a imagem de seus filhos nos porta retratos espalhados pelo quarto. Não se lembrava mais de quantos anos que não mais arrumava a casa para o natal com enfeites e a velha árvore que suportava o peso dos cartões não era mais utilizada. E correndo os olhos em volta, pode viver todas a lembranças do passado em um porta retrato em cima da penteadeira da casa que ainda conservava os velhos móveis. No porta retrato, a foto de Augusto, o autor do cartão, que tinha sido seu esposo e que ela havia perdido para uma doença. Joana, tinha pouco mais de 4 anos que estava viúva e desde então não armava mais a árvore de natal de sua casa. O cartão de Augusto, a lembrança de seus últimos dias lutando pela vida, e as palavras dele no cartão: "aquela que vai me guiar por toda a minha vida"... Joana entendeu o sentido do natal e o porque havia guardado aquele cartão, porque agora não ela, mas Augusto é que havia se tornado uma estrela e estaria de algum lugar guiando a esposa que escolheu para amar por toda a vida. Joana abraçou o cartão, duas lágrimas brilhantes rolaram pelo seu rosto. Depositou o cartão na gaveta e a fechou, levantou-se e foi a sala e anunciou: Meus filhos vamos armar a nossa árvore de natal, porque o natal aconteceu e seu pai renasceu dentro de mim.