O Limite do Amor

Escrevi esse conto baseado na minha relação com um familiar dependente químico e como eu penso que não apenas os pais, mas todos nós deveríamos agir quando confrontados com um próximo que deseja nos impôr as suas escolhas à qualquer preço.

Eram duas e meia da manhã. Silenciosamente, Pedro abriu o portão e entrou a passos curtos em sua casa. A porta principal estava aberta. Adentrou na sala de estar e tomou algum cuidado para que não fosse percebido pelos pais que a esta hora encontravam-se já adormecidos. Há algumas semanas que adquirara o hábito de retornar à casa neste horário e embora encontrasse algumas vezes oposição por parte de seus pais que se preocupavam ernormemente com essas chegadas tardias, pensava que valia mais a pena magoá-los do que ser o primeiro do seu grupinho a voltar para casa.

Sentia-se cansado, faminto, mas evitaria provocar barulhos, embora não se importasse muito que seus pais se acordassem e brigassem consigo. Eles eram caretas e além de tudo já estavam velhos, sua juventude se fora com a sua própria liberdade, agora era o seu tempo de divertir-se e conhecer o mundo, e faria isso não importasse o que estivesse em seu caminho, afinal de contas, a vida é uma só e não perderia a oportunidade de ser feliz.

Ora ou outra, enquanto caminhava para o seu quarto, vinham-lhe à mente pensamentos críticos que condenavam o seu comportamento. Se não os vigiasse e até os reprimisse, eles provocoriam sentimentos ruins da qual ele não desejava ser refém. Expurgava-os com toda a sua consciência, desejando livrar-se finalmente das amarras que o prendiam à infância e à autoridade dos adultos. "Veja só - ele pensava -, se vou trocar esta casa monótona e essas pessoas aborrecidas pela diversão que tenho com meus amigos? Já que me puseram no mundo, que arqueiem com as minhas necessidades, enquanto eu me torno aquilo que desejo ser".

Livre, era isso o que Pedro desejava ser, embora poucas vezes tenha parado para refletir sobre o que era a liberdade. Assim, tal qual um escravo que estivesse acorrentado às correias dolorosas e injustas do seu carrasco, o garoto lutava de forma incosciente e até inconseqüente para ser o senhor da sua vida, das suas escolhas, embora essas escolhas muitas vezes provocassem efeitos que desapontassem e até ofendessem àqueles cuja a sua vida muito lhe importavam.

"Desejava que só existissimos eu e meus amigos no mundo. Pra quê estas pessoas têm de existir? Apenas querem nos impedir de sermos livres, querem nos deixar presos às suas regras, não nos querem ver felizes, fazendo aquilo que nos agrada". Abriu a porta do quarto e esperou por um momento que seus pais entrassem furiosos. Vira por muitas vezes essa mesma cena se repetir. A mãe, vestida em seu pijama velho, de desde quando o acarinhava ainda criança no colo, entrava chorosa no recinto. Logo ele assumia uma expressão debochada, era a sua forma de dizer-lhes que não se importava com a sua opinião, embora por baixo de toda a sua frieza houvesse ainda requícios da influência dos pais. Logo em seguida entrava seu pai. Mas já não era o seu pai, não aquele de quando era ainda um menino. Agora, não passava de um homem estranho que desejava impedir-lhe de ser aquilo que ele realmente era ou que pensava ser. Era seu inimigo, seu desafeto.

Sentia medo nessas ocasiões, embora soubesse que dificilmente os pais fariam algo contra si. De certo ainda o viam como era antes, aquele menino que os amava e expressava o seu amor em gestos e palavras. Enquanto estas lembranças prevalecessem sobre os seus atos presentes, disporia de crédito para com a convalescência dos pais. Estariam sempre dispostos a perdoá-lo e esperariam sempre o melhor de si. Mas naquela noite eles não vieram. Deitou-se com as roupas que usava e permaneceu ainda um minuto à sua espera. A noite estava especialmente silenciosa e a não ser que eles não estivessem em casa, parecia-lhe que já não se importavam tanto com as suas chegadas depois do horário. Como desejasse saber se haviam saído, levantou-se da sua cama e caminhou até o seu quarto. Lá estavam eles, de certo apenas não o haviam escutado chegar e isso significava que a bronca seria automáticamente adiada para a manhã seguinte. Não importava que bringassem consigo, logo saisse com os seus colegas já se esqueceria das suas palavras e até das suas agressões. Os sentimentos ruins que eles lhe provocassem se esvairiam tão facilmente quanto a escuridão na evidência dos primeiros raios de sol.

Ao mesmo tempo que se sentia aliviado pelos pais não terem brigado consigo naquela noite, pensava se algo havia acontecido. Talvez tivessem decidido fazer algo ou mesmo tivessem desistido de si, o que na sua opinião era algo favorável. Se já não se importassem com os seus atos e o seu comportamento, poderia fazer tudo o que lhe agradasse. Chegaria a hora que quisesse e sairia com quem desejasse. Afinal isso não era ser livre?

No outro dia acordou ao meio-dia. Foi para a cozinha ainda mais faminto que na noite anterior, pensando que não importasse o quanto os seus pais estivessem bravos, sentaria-se e comeria descansado. Trocou as roupas que estava usando, e que denúnciavam pelos seus odores os caminhos por onde passara na noite anterior. Logo após foi ao banheiro e lavou o rosto. Assustou-se um segundo ao observar o seu reflexo, via ainda o antigo Pedro e não gostava da sua imagem. Queria logo tornar-se adulto, desejava temer a sua própria imagem, caso contrário, quem lhe respeitaria?

Com um minímo de receio abriu a porta do banheiro e encaminhou-se rapidamente para a cozinha. Mas ao invés do que imaginava, não havia ali ninguém. Abriu o microondas, o forno, mas não encontrou o prato que a mãe sempre deixava pronto. Na geladeira não haviam sobras do almoço, embora algumas louças na pia evidenciassem que os pais haviam se alimentado em casa. Será o que estava acontecendo? Não era a primeira vez que faziam isso, não importava o acontecido sempre lhe perdoavam e às vezes até eram muito bondosos consigo. Quando quebrara o espelho do banheiro da escola, há três meses, os pais foram chamados pelo diretor e ouve uma consufão imensa. Pensou que depois daquilo os pais nunca lhe perdoariam. De certo cortariam as suas regalias - A comida pronta, os banhos demorados, as chegadas tardias, os presentes caros -, mas nada disso aconteceu. Brigaram muito consigo e o pai até ameaçou agredir-lhe , mas logo depois arrependeram-se. Afinal, ele pensou na época, amam-me a ponto de aceitar os meus demandos. E a cada vez que desegradava seus pais e não obtinha uma resposta à altura, a opinião e os sentimentos deles iam se tornando mais desimportantes para si. Afinal, são capazes de perdoar a tudo, logo se acostumarão com o meu comportamento, embora agora o rejeitem. É uma questão de tempo, refletiu. Como não estivesse acostumado a preparar a sua própria refeição, pegou a sua carteira e foi até a casa de um amigo convidá-lo para almoçar consigo.

Neste mesmo dia, quando eram dez horas da noite e Pedro estava com os amigos, passou-lhe pela mente a atitude dos pais. Afinal, ainda não a compreendia. Será que apenas haviam esquecido de si ou estavam realmente magoados consigo. Era a primeira vez que quando junto ao seu grupo pensava neles. Antes, como nunca se magoassem, sabia que não importava o que fizesse eles se recuperariam e lhe dariam uma nova chance. Algumas vezes até pensara em mudar de comportamento, mas o desejo de estar com os seus amigos se sobrepunha ao receio que possuia de perder o apoio dos pais. Afinal, se abandonar os meus amigos ou se não fizer o que eles desejam que eu faça, talvez nunca mais me aceitem como um deles. Quanto aos meus pais, estão sempre prontos a zerar o passado e ignorar os meus erros.

Naquela noite Pedro chegou às quatro horas da manhã e embora as lembranças das outras noites em que chegara atrasado lhe fizessem temer que os pais o surpreendessem descumprindo as regras, desejava inconscientemente que eles viessem até si e que toda a cena de cobranças e agressões se repetisse. Afinal, tal qual um ator que ensaia para um espetáculo, toda às vezes em que os pais lhe punham contra a parede daquela forma ele se tornava menos frágil ao poderil deles. Já se acostumara aos seus gritos e às suas ameaças que eram tão infundadas quanto uma ponte cujos alicerces se desejasse construir em mar profundo. Aquele era o preço que tinha de pagar para poder chegar aquele horário e aliás, era um preço bem pequeno se comparado ao prazer que possuia em estar com os amigos.

Deitado em sua cama, frustou-se num primeiro momento ao perceber que os pais não vieram. Sabia que estavam em casa pois vira o carro estacionado na garagem. O que estava acontecendo? Sentia-se temeroso, o que estaria acontecendo e que não sabia? Tinha de preparar-se para tudo. No outro dia, acordou e foi direto para a cozinha. Os pais estavam na mesa comendo e conversavam sobre algo para a qual ele pouca importância deu. Esperava já o momento em que eles lhe perguntariam onde ele estivera, com quem estivera, por que não respeitara as suas regras? Não sabiam eles que ele não considerava tão errado as suas atitudes. Os pais, por sua vez, questionavam-se sobre o por quê do filho ignorar os seus apelos para que os respeitassem. O que estavam fazendo de errado, afinal? Lhe davam tudo o que necessitava, tratavam-no com carinho e esforçavam-se ao máximo para que as suas atitudes inconseqüentes não chegassem aos ouvidos de terceiros. Do que adiantava ter criado e amado tanto uma pessoa para que depois ela se tornasse mal vista pelas pessoas? Evitavam com todos os seus recursos que tal coisa se sucedesse.

Sentado na mesa, esperava que a mãe lhe pegasse um prato e que lhe servisse a comida, como sempre fizera. Mas ela mal notara a sua presença. Tentava não olhar-lhes nos olhos. Levantou-se e pegou um prato, serviu-se e comeu em silêncio. Quando começariam a esbravejar, ele pensou? Além de quê, por mais que não tivesse total consicência disto, quando os pais brigavam consigo era como se tomassem o controle da situação. Ele se tornava então não uma pessoa qualquer, cujas as responsabilidades lhe pesavam nos ombros, mas sim o filho cujos os pais possuiam a direção. Todo o peso das suas ações diminuía quando os pais lhe confrontavam e brigavam consigo, pois sabia que caso algo acontecesse eles logo assumiriam o controle, embora tentassem ao mesmo tempo castigar-lhe pelos seus feitos.

Aquela era uma das poucas vezes na vida em que a mãe não lhe dirigira a palavra. Não que se importasse consigo, afinal, os pais agora pouco lhe importavam, haviam se tornado impecilhos, obstáculos rumo à sua liberdade de ser e fazer o que bem entendesse. Observando agora a mãe, imaginava o que lhe passava pela mente. Lembrou-se de uma vez em que ela lhe abraçou quando ele estava machucado. Estaria disposto a perder isso? O amor e o carinho dos pais poderia ser substituido ou mesmo chegaria o dia em que já não necessitaria deles? Não saberia responder, entretanto, sentia agora uma pontinha de tristeza pelo fato de os pais não lhe darem atenção. Pensava que dessa forma era dono da sua própria vida, chegava e saía a hora que lhe fosse mais oportuno e os pais já não lhe impediriam de ser como tal.

Logo terminou a refeição, levantou-se da mesa e voltou para o seu quarto. Pensava em apenas almoçar e já sair com os seus amigos, mas algo estava lhe incomodando. Embora isso lhe fosse estranho, desejava que os pais fossem até o quarto e lhe questionassem, até que brigassem consigo. Isso lhe dava os motivos necessários para sair e fazer o que bem entedesse na rua. A raiva e a mágoa que as freqüentes brigam lhe proporcionavam era o combustível certo para que mantivesse as suas ações intactas. Mas agora que os pais pareciam não se ôpor mais às suas decisões, era o único responsável por elas. Tornara-se adulto, então. Mas o que isso siginificava?

Naquela noite chegara às dez horas da noite pois seus amigos se dispersaram cedo. Não havia comida novamente. Os pais não estavam em casa. Mas após quinze minutos em que ele permanecera no banho, eles chegaram. Quando ele saiu do banheiro, eles se encontravam na sala e mal lhe cumprimentaram. Estavam silenciosos como nunca antes foram. O que se passaria nas suas mentes? Estariam magoados com as suas atitudes? Não importava, continuaria sendo como era e eles teriam de se adptar às suas mundanças como sempre fizeram. Afinal, os pais lhe pareciam como mulharas, não importava o que ele fizesse, sempre eles se recompunham e lhe perdoavam. Até os seus estragos eles estavam dispostos a concertar.

Mas desta vez algo mudara. Os pais não lhe pareciam aborrecidos ou tristes, era como se apenas não pensassem em si. Nos últimos tempos havia se tornado o principal assunto entre eles e essa mundança repentina de alguma forma o incomodava. Nunca os vira assim. Acostumara-se ultimamente aos seus semblantes entristecidos. E encontrava agora uma nova postura que não reconhecia e tão pouco compreendia.

Foi para o seu quarto e ficou ali um momento parado. Esperava talvez que a mãe viesse falar consigo, como sempre fazia. Gostava de conversar com ela pois isso demonstrava que os seus erros haviam sido perdoados, mais uma vez. Embora não a tratasse sempre com cortesia e muitas vezes fosse até inamisto, aproveitava esses momentos para impor-lhe o seu comportamento. Era como se dissesse; "Sou assim e já que você me ama, você irá me aceitar". A pouca consideração de Pedro para com os pais fazia com que não se importasse com os seus sentimentos e se aproveitasse do seu zelo para manter o seu comportamento rebelde.

Para os pais de Pedro era muito difícil discipliná-lo. Já haviam tentado de tudo, haviam chorado, gritado, ameaçado e nada acontecera, não haviam sinais de mudança nos seus pensamentos e na sua forma de agir. O que deveriam fazer, afinal? Quantas vezes lhe haviam dito que não aceitavam aqueles comportamentos e que dentro da sua casa estas coisas não seriam aceitas? Mas tudo o que lhes saia da boca parecia dissipar-se tão rapidamente quanto as nunvens após uma tempestade. O que fariam, por fim?

Alguns dias depois, Pedro descobriu que os pais estavam indo a um grupo de ajuda. Aquilo à princípio o irritou, por que não cuidavam das suas vidas? Será que não podia fazer o que quisesse sem que eles se sentissem ofendidos? Pedro via a sua vida e a dos seus pais como coisas completamentes separadas e afinal, era assim que ele queria vê-las. Mas essa nova situação mudava completamente as coisas. Então já não eram os pais muralhas, pois caso contrário não teriam de pedir ajuda. Antes, quando via o pai e a mãe furiosos com as suas atitudes pensava que eram muito fortes e que uma hora aceitariam o seu comportamento, por mais que ele lhes magoasse, pois a sua raiva e o seu ódio lhes fazia parecer inabaláveis. Mas afinal, eles eram gente também? Eram frágeis e suas atitudes os atingia? Por um momento aquilo lhe aflingiu. Durante todo esse tempo jamais pensara que os pais pudessem ser vulneráveis. Por mais que lhe dissessem o quanto estavam magoados e tristes com toda aquela situação, eram só palavras e ele não se desviaria do seu caminho por causa delas. Mas diferentes das palavras, que podem ser interpretadas de tantas formas e quase sempre são lançadas em momentos de fúria, as atitudes demonstravam serenidade e consicência de ação. A quanto tempo seus pais estavam pensando em procurar ajuda, ele se perguntou?

Quando estava quase dormindo, sua mãe foi até o seu quarto e lhe desejou boa-noite. Já não haviam gritos, choros, lamentos, e ela nem mesmo parecia amedrontada como antes. Sua expressão era a de quem estava decidida de algo e Pedro não sentia como se pudesse lhe dizer o que bem entendesse, como antes fazia. Através das palavras ele desestabilizava-a, a fazia sentir-se com medo e triste. Mas agora sentia como se ela estivesse mais forte, mas era um tipo diferente de força. Já não parecia mais querer mudá-lo contra a sua vontade, o que estaria acontecendo então?

Com o passar dos dias, muitas coisas mudaram na casa de Pedro. Os pais já não lhe compravam presentes e estavam mais serenos e unidos. A comida só era servida em determinado horário e quem não estivesse ali naquela hora não se alimentava. O pai já não gritava com ele, falava-lhe com seriedade e calma e isso assustava Pedro, que era agora obrigado a ouvi-lo. Quando o pai gritava e lhe dizia ofensas, era-lhe fácil ignorá-lo. Mas agora que falava com sobriedade e consciência, sentia como se tivesse a obrigação de escutá-lo. Afinal, era da sua comida que ele se alimentava e era na sua casa que ele dormia. O pai já não podia mais ser visto como um inimigo e a mãe como uma super-heroína, ambos pareciam-lhe agora "gente", com sentimentos e falhas. Já não estavam mais dispostos a suportar as regalias e desmandos do filho, pois haviam reconhecido que tal qual ele também eram filhos e possuiam as suas necessidades. Sabiam agora que não possuiam os recursos necessários para mudá-lo, para obrigá-lo a mudar as suas atitudes e que ao menos que quisesse isso não aconteceria. E enquanto isso não acontecesse, eles estavam decididos a provar-lhe através de atos e não apenas de palavras que aquela situação havia chegado a um ponto insustentável. Ou Pedro mudava ou já não poderia mais estar sob aquele mesmo teto que eles.

Com os amigos agora Pedro já não podia deixar de pensar nos pais. Afinal, a mãe mudara de forma radical com ele. Antes, quando ele não lhe dava bom-dia, ela vinha até ele e lhe acariciava. Agora, ela agia da mesma forma. Afinal, ela também é uma pessoa, possui sentimentos e eu muitas vezes os magoei, ponderou ele. Já não podia mais dizer-lhe o que bem entendesse e os pais não aceitavam mais as suas atitudes agressivas. Aquela casa tinha donos agora, antes era ele o mandante. Os pais já não aceitavam com tanta facilidade as suas desculpas e o seu comportamento indiferente e algumas vezes autoritário não era aceito por eles. Se quisesse ser respeitado, ele teria que respeitar. Antes, mesmo quando agia das formas mais inconsequêntes e ofensivas possiveis, seus pais pareciam como bolsos furados, as suas rebeldias pareciam nunca atingir um fundo, um limite dentro deles. Agora o mesmo já não acontecia, os pais pareciam saber o que era aceitável e o que não seria permitido por eles. "Somos gente, era como se eles lhe dissessem, mas agora não apenas com palavras e sim com atos, temos as nossas necessidades, os nossos limites e as nossas responsabilidades também. Nós te amamos e estaremos dispostos a lhe ajudar se você necessitar, mas não somos um escudo que lhe protege dos seus próprios atos. Se quer ser desta forma, você também terá de arcar com as consequências. Nós não fazemos as suas escolhas por si e não temos a obrigação de sofrer por você também. Se deseja meter a mão no vespeiro, não espere que nós nos ofereçamos para sofrer as ferroadas no seu lugar."

Com o tempo, as coisas mudaram sensivelmente na relação entre Pedro e seus pais. Agora, ao invés de um adolescente superpoderoso e indiferente quanto às necessidades alheias, e pais frágeis que desejavam demonstrar força na agressividade, haviam seres humanos que se encontravam no mesmo nível. Pedro não era mais importante para os seus pais do que eles mesmos ou os seus outros filhos e eles não estavam mais dispostos a sofrer todas as consequências em nome do seu bem. Haviam aprendido que o bem para Pedro era aprender que tudo na vida possui uma consequência e que somos nós quem as sofremos de acordo com os nossos atos. Quando gritavam e se descontrolavam com ele, tiravam a responsabilidade dos seus atos de si e as apoiavam sobre as suas próprias costas. Mas agora, Pedro sabia que dependente de como agisse os magoaria e que teria de sofrer os efeitos dos seus atos. Seu pais não eram super-heróis, eram seres humanos e seres humanos possuem recursos limitados. Tal qual cuidava para não magoar os seus amigos, pois sabia que dependente dos seus atos eles poderiam reagiar de maneira controversa, cuidava também agora para não magoar os seus pais.

Com o tempo, Pedro aprendeu a respeitar a sua casa, pois sabia que ali dentro os seus desmandos não seriam tolerados facilmente. Os pais ainda davam-lhe atenção e carinho, mas não a qualquer preço. Era preciso merecer para receber. O amor gratuito provoca distorções tal qual as que estavam acontecendo na familia de Pedro. Desta forma, ele aprendeu que quando recebemos algo damos a outra pessoa o direito de fazer exigências também. Compreendeu também que se quisesse receber o carinho e o apoio da sua familia teria de os retribuir com bom comportamento. Fortalecidos pelo grupo de ajuda e mais conscientes em relação as suas próprias atitudes que favoreciam o comportamento incosequente de Pedro, seus pais mostraram-lhe com ações e não apenas palavras que embora nasça naturalmente o amor não é gratuito, e que se continuasse a agir daquela forma ele teria perdas que não poderiam mais ser recuperadas com o tempo. Agora que entendia que suas atitudes teriam consequências, ele ponderava sobre até que ponto estava disposto a perder a afeição de seus pais. Seus amigos eram muito importantes, mas ele sentia que jamais poderia viver absolutamente afastado de seus pais. Desta forma, Pedro reconheceu pela primeira vez a importância real que seus pais tinham para si, e independente de qual tenham sido as suas atitudes depois disto, é necessário afirmar que o comportamento dos pais de Pedro foram fundementais para provocar essa mudança de consciência.

Pais não são muralhas. Filhos não são o centro do mundo. Quem ama pode dizer não. Quem ama pode fazer exigências. Todos devem ser responsáveis pelas suas atitudes. Ninguém é obrigado a viver sob a vontade de uma outra pessoa. Nós sómos a principal razão de existirmos. Quando colocamos a nossa felicidade apoiada nas costas de uma pessoa, tiramos da nossa vida a sua razão de ser.

F W
Enviado por F W em 25/11/2011
Reeditado em 25/11/2011
Código do texto: T3356093