Uma lição de amor

Meu pai por muitos anos trabalhou como maquinista em uma ferrovia de minérios. Me lembro que ele acordava muito cedo, ainda escuro, e saía com sua mochila marrom rumo ao pátio dos trens.

Certa vez chegou em casa trazendo um cãozinho sem raça, que havia ganho de um dos colegas.

Quando meu pai chegou com aquele cãozinho branco e preto logo me encantei por ele, pegando-o nos braços. Minha mãe ficou furiosa e disse que não queria animais.

Porém meu pai insistiu e ela concordou desde que o cão ficasse do lado de fora.

Os meses se passaram e nosso cãozinho ia crescendo. Era muito bonita a amizade entre ele e meu pai. Mesmo nas madrugadas ele sabia a hora certa que meu pai despertava e ia recebê-lo bem na porta de casa. O acompanhava até a porta do trem praticamente e depois retornava para nossa casa.

Assim se fez durante mais de cinco anos. Religiosamente nosso cão acompanhava o pai até a cabine do seu trem. O curioso é que tempos depois, o danado do cão descobriu a hora que meu pai terminava seu expediente e passou a ir buscá-lo eu seu trabalho.

Porém houve um dia que meu pai não saiu de casa. Era a primeira vez que vi aquela cena, pois nunca tinha vistou ou ouvido dizer que meu pai se atrasada ou faltara em seu trabalho, mas aquele dia foi atípico.

Meu pai acordou indisposto e não levantou da cama. Eu podia ouvi-lo, lá do meu quarto indo ao banheiro várias vezes para verter.

Quando acordei ele ainda estava bem mal, mas julgávamos ser apenas um mal estar passageiro. Naquela mesma tarde meu pai morreu na sua cama, para sofrimento de todos nós. Nosso cão ficou estranho, como se soubesse do que acontecera, e ficou latindo sem parar até sair correndo pelos matos e sumir.

Comovidos com tudo resolvemos viajar para a casa de meus avós, que moravam no litoral. Estranho é que não encontrava nosso cão em parte alguma.

Na casa de minha avó fiquei por muitos dias, sem saber notícias do nosso cachorro.

Certo dia minha mãe voltou para nossa casa, no intuito de buscar alguns documentos. Ela chegou de madrugada e para sua surpresa lá estava o nosso cãozinho na porta de casa, esperando de forma vã a possível saída de meu pai para o trabalho. Comovida, minha mãe acariciou o pobrezinho e lhe disse que o papai jamais sairia.

Para surpresa de minha mãe, ao dizer estas palavras, o cão parecia entender o que minha mãe disse. Ficou novamente estressado, latindo feito louco, e novamente correu para o mato. Minha mãe, emocionada voltou a chorar pelo meu pai.

No dia de finados resolvi visitar o túmulo do papai. Ao me aproximar do local notei a presença de um brinquedinho do nosso cachorro. Para minha surpresa lá estava ele, sentado em cima do túmulo do meu pai. O cãozinho pulou em meus braços, como um amigo que não vê o outro há muito tempo. O coveiro do cemitério disse que ele morava ali já há muitos meses e que todos da vizinhança do cemitério o alimentavam.

Minha emoção falou mais alto e não me contive.

Aquilo era a verdadeira prova de amor, de um amigo fiel que jamais abandona o seu dono, ainda que este não esteja mais vivo.

Paulo Farias
Enviado por Paulo Farias em 18/11/2011
Código do texto: T3342225
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