A estória de um Sax chamado Dona Nua
De seu primeiro casamento, ele sentia falta apenas do saxofone. A es-posa tinha um King Zephyr, herança de um tio músico que falecera sem deixar filhos. Mesmo sem nunca ter aprendido a tocar, o sax era seu único companheiro nas longas noites solitárias que passava no sofá, enquanto a mulher dormia um sono ferrado. E aos poucos ele ia cons-guindo tirar alguns trechos de clássicos como “Soul Serenade” e “Tomorrow Night”. Depois da separação, foram poucas as oportunida-des de curtir um sax, mas de tempos em temos ia assistir a banda de uns amigos que se apresentava num café na vizinhança e ao final sem-pre lhe deixavam tocar um pouco. Um dia ele foi chamado para servir num coquetel beneficente. Algumas peças de um colecionador estavam sendo leiloadas. Enquanto servia bebidas e canapés, observava os objetos cuidadosamente alinhados nas prateleiras. Seus olhos brilharam ao reconhecer um saxofone Conn Naked Lady. Passou o resto do evento namorando o instrumento. Mentalmente fazia as contas de quanto poderia dispor de suas finanças para se tornar o dono daquela rarida-de. O leilão começou e pouco a pouco cada objeto foi sendo arrema-tado, mas na vez do saxofone, que surpresa, ninguém parecia interes-sado. O lance inicial era de cinco mil dólares, mas o que se seguiu foi um grande silêncio. Ele não podia acreditar que aquelas pessoas desco-nhecessem o valor do sax. Sentiu o coração bater descompassado quando se pegou de mão levantada. Todos olharam em sua direção. Pareciam não acreditar que um simples garçom tinha comprado alguma coisa num lugar tão fino. Terminando o expediente, foi com seu tesouro para casa. Morava numa kitnet pequena, mas muito confortável! Levou Naked Lady para o quarto, encostando-a ao pé da cama. Despiu-se vagorosamente e sem perder a prenda de vista, entrou no banho. A água quente tocou-lhe a pele revigorante. Banhou-se calmamente olhando o saxofone pelo vidro transparente já meio embaçado pelo va-por. Nem acreditava que Naked Lady o esperava. Era dele e só dele. Saiu ainda meio molhado do box e se aproximou do sax. Apenas a luz fraca e bruxuleante do abajur os iluminava. Ele retirou da gaveta do criado mudo uma flanela nova e macia e iniciou o banho de Naked Lady apagando cada digital engordurada. Por alguns instantes teve a im-pressão que ela tremia. Só podia estar louco. Mas de que isso importa-va agora? Eram só eles dois. Guardou a flanela e calmamente guiou Lady até fazê-la deitar-se na cama ao seu lado. Ela já não tremia. O garçom a pegou com cuidado, e finalmente encostou os lábios na bo-quilha, na embocadura perfeita. Naked Lady derreteu-se toda ao toque suave, e emitiu os primeiros acordes enquanto seu dono lhe dedilhava as chaves com paixão. E sem nem saber como, ele tocou inteirinho seu blue preferido. Aquele sax nunca tinha sido tão bom, e ela nunca mais seria assim nas mãos de qualquer outro.
http://youtu.be/DQlgcjosN9w