Acampei em seus sonhos!
Chovia muito naquela manhã, mas a alegria que sentia por estar com amigos que há muito não os via, me fez criar forças para enfrentar o mar, entrando naquela barca que nos conduziria a Ilha Grande.
Desde a minha infância sempre gostei muito de acampar. Adoro pescar. Não sou um exímio pescador, tenho a pescaria como uma terapia. Pelo menos assim não gasto fortunas sentado num divã, falando de minha vida para uma pessoa que na realidade está mais interessada em que o tempo marcado de 1 hora, passe o mais rápido possível e assim poder atender outras pessoas que esperam na sala de estar. (risos).
Sei que foi uma loucura ir acampar num dia tremendamente chuvoso, mas sei que não teria outra oportunidade tão cedo e com pessoas que eu realmente gosto muito. Acampar é sempre muito bom, principalmente em companhia de pessoas agradáveis.
Já fazia alguns anos que eu não encontrava essa turma. Todos (com exceção de suas esposas), já fizeram teatro comigo, e, foram justamente eles que me proporcionaram esse encontro.
Minha vida anda um tanto conturbada com problemas que me consomem o tempo. Meu estado de estresse estava bem alto e nada como um acampamento para reabastecer as baterias internas.
Assim que recebi o convite, pensei: “Rede... anzol... fogueira... violão... Campari...” foi um pensamento instantâneo. Não pensei duas vezes em aceitar e lá fui eu.
Já dentro da barca, meus pensamentos estavam longe, muito longe. Eu não parava de pensa nela. Não havíamos conversado direito e o pouco que falamos ao celular, senti certo ciúme. Suas ultimas palavras me deixaram preocupado, é como se ela estivesse com medo de me perder. Por outro lado, senti que seu amor por mim cresce a cada dia.
A galera estava animada. Eu via nos olhos deles que o prazer que sentiam em estar ali, mesmo naquele dia chuvoso era muito grande.
Estava frio. A chuva gelada, fez com que abrissem um litro de whisky. Bebi uma dose caprichada, mas meus pensamentos continuavam nela. Eu não conseguia esquecer sua voz ao celular. Ela estava triste. De certa forma eu também mereço um passeio. Nunca saio. Desde que a conheci, não fui mais as baladas, me afastei das rodas de barzinhos à noite e principalmente nos finais de semana. Mas ela continua levando a sua vida normalmente. Festas, recepções, shows, etc. Será que ela sabe como eu fico em não poder acompanha-la? Será que passa pela cabeça dela como me sinto?
Claudio estava muito animado. Sempre foi assim, e foi dele a iniciativa de pegar o violão e começar uma cantoria que rapidamente se espalhou pela barca. Sua mulher Silvia, que eu não conhecia pessoalmente, sentou-se ao meu lado e me serviu mais uma dose de whisky. Ela é uma jovem mulher, 28 anos. Psicóloga. Percebeu que eu forçava a minha animação e entre uma dose e outra perguntou:
- Noto que você está aqui, mas sua mente está muito longe.
Eu precisava responder rápido. Não queria estragar aquele momento único de estar com meus amigos que fizeram questão de reunir-nos nesse encontro.
- Não... não é nada. Estou apenas preocupado com o tempo e pensando a melhor maneira de arrumarmos nossas barracas e curtirmos o nosso fim de semana. E por falar em fim de semana, vamos fazer um brinde a ele.
Levantei meu copo e todos me seguiram.
A viagem continuou com muita animação. Claudio toca muito bem violão e juntando mais alguns que estavam indo na mesma direção que nós. De repente muitos violões surgiram e diversas modas de viola foram entoadas.
Estava um ambiente muito legal, mesmo com o frio e a chuva, a galera não desanimou um só momento.
Ao desembarcarmos na ilha, houve uma despedia das outras pessoas que viajavam conosco. Marcos como sempre, não deixou por menos, teve que fazer uma despedida em alto nível. Tirou da mochila um litro de tequila, limão e sal e mais de 20 pessoas brindaram aquele momento. Era como se todos já se conheciam. Foi muito bom mesmo.
Ao sairmos do píer, andamos uns 1.200 metros ate o local onde acamparíamos. A chuva recomeçou a todo vapor. Nossa, foi um pé d’água danado.
Levamos uma surra para montar as barracas, mas enfim conseguimos.
A saudade já era enorme. Era como se eu houvesse a abandonado. Engraçado, eu sei, mas era assim que estava me sentindo. O celular não tinha sinal, por mais que eu fizesse não conseguia entrar em contato. Até para enviar um torpedo estava difícil.
Estávamos todos juntos numa mesma barraca esperando que a chuva desse uma trégua. Foi ai que eu tive uma ideia. Mataria dois coelhos numa cajadada.
Sai da barraca e me dirigi à barraca de outras pessoas que estavam perto de nós e conversando, consegui que convencer alguns acampados de arrumarmos uma lancha para me levar a Mangaratiba e assim buscar uma lona que tenho em casa. Ela é muito grande. Poderíamos estica-la e nos proteger. Poderíamos também fazer uma fogueira para nos aquecer e para cozinhar alimentos, pois do jeito que estava não conseguiríamos. Por outro lado eu mataria a saudade de meu amor, fazendo uma ligação.
Já dentro da lancha rumo a Mangaratiba, meu coração batia mais forte. Não via a hora de desembarcar e ligar.
O mar batia muito, mas eu não me importava com isso. A vontade de ouvir a voz dela era para mim a coisa mais importante naquele momento.
Encostei-me A e na lancha e fechei meus olhos e um flash back veio a minha mente. O nosso primeiro dia. O seu olhar firme, porém doce me olhando nos olhos. Sua boca macia me beijando... um beijo com gosto de mel. Seu corpo liso como veludo, nossas caricias, nossos toques... nosso amor! Sua voz macia ao meu ouvido, seus gemidos sendo sussurrados em meus ouvidos, oh! Como não amar aquela mulher? Como não pensar nela?
Fui despertado de meus pensamentos pelo comandante da lancha, me avisando q estávamos chegando.
Levantei-me e fiquei olhando para o píer. Torcia para ir mais rápido. Queria desembarcar logo. Já estava como celular na mão, seu numero já estava discado, era apenas colocar os pés em terra firme e apertar a bendita tecla “send” e esperar ela dizer “Alô”.
Foram segundos intermináveis, mas enfim...
Sua voz como sempre doce e delicada do outro lado da linha, me dava à certeza de que ela me amava o tanto quanto eu.
- Alô, meu amor!
- Alô, minha vida!
Só em voltar a ouvir sua voz, meu coração palpitou de felicidade.
Conversamos por alguns minutos e pude perceber que ela se roía de ciúmes em saber que eu estava longe, acampado e pior, estávamos incomunicáveis, pois o celular não tinha sinal lá na ilha e só nos falaríamos novamente ao meu retorno.
Enquanto uns insistem em dizer que o ciúme é uma insegurança, afirmo o contrário. É uma forma de mostrar que amamos e nos preocupamos com esse amor.
Eu estava feliz. Havia falado com ela. Meu coração já não estava tão apertado, mas eu precisava voltar pra ilha, o pessoal estava a minha espera e a lancha que me trouxe a Mangaratiba também.
Voltamos com tranquilidade, já não chovia com a mesma intensidade de antes e, enfim chegamos e colocamos a lona de forma que nos deixassem totalmente abrigados e protegidos da chuva.
O resto do dia foi muito bom. Pescamos, brincamos, relembramos momentos importantes em nossas carreiras. Cada um contou como tem sido suas vidas depois do teatro, seus casamentos, etc.
Enquanto cada um contava suas histórias, eu me reportava a minha vida.
Quem me conhece de fato, sabe que sou pouco de falar de mim, de minha vida, de meus amores passados. Todos nós tivemos amores passados. Alguns que marcaram outros que gostaríamos de nunca ter tido e assim sucessivamente. Mas eu não gosto de lembrar disso. Vivo o presente e o meu presente era ELA.
Foi legal os momentos em que passei com meus amigos. Espero repetir a dose numa outra oportunidade, mas nesse momento eu queria estar só. Queria voltar pra casa, ver minha filhota, tomar uma boa ducha e pensar. Eu precisava pensar.
Não sabia exatamente o que estava acontecendo comigo. Minha cabeça parecia estar em parafusos. Eu queria muito estar com ela naquele momento. Sentir seu perfume, seus beijos. Mas era impossível, eu sabia. Tinha que me acostumar com isso. Eu sabia desde o inicio que seria assim, e foi pensando nisso tudo, nessa relação, na minha vida, no meu futuro que acabei adormecendo no sofá e fui acordado já de madrugada pela minha filha:
- Papai, vamos pra cama, você está bem?