Macho Véi
Antes de tudo deixo claro que a história é de criação do imaginário do autor e não tem ligação com qualquer tipo de ofensa.
Divirtam-se!
...
“O ladrão ficou maluco de vê tanta miséria em cima de um cristão que saiu gritando pela rua,
Pega eu que eu sou ladrão! Pega eu!”
José Antonio, ou melhor, Tonhão, desceu da carroça, meio tonto pela pinga que tomou no meio do caminho. Ah se Pedro não ficasse ao lado do pai, o bicho já tinha definhado nas esquinas das favelas de São Paulo! “Pega eu, pega eu que eu sô ladrão...” Entrou em casa cantando Bezerra da Silva.
- Seu fio de uma excomungada! Venha aqui seu fidalgo dos inferno – deu pra ouvir os berros de Maria Rita, que vinha com um semblante assombroso e com uma camisa de gola branca na mão.
- Ô Maria, minha dondoca, deixa disso muié... – Tonhão equilibrava-se em Pedro que disfarçava o riso.
- Seu fio de uma peste! De que diabo é esse batom vermeio na sua gola? Ein? Explica isso seu fio de uma rapariga! – o olhar de Maria fez José Antonio ficar sóbrio fácil, fácil. E ele que não se explicasse não, o bicho ia pegar.
- Ô donzela, a gente se roçando no lenga lenga essa semana, não lembra não? – ele se aproximou de Maria Rita e a tomou pela cintura.
- Ô homi de Deus, a gente não se esfrega tem um tempo já...
E não é que na manha aquele baiano conseguiu domar a fera? Pedro era o fiel escudeiro do pai, saía todos os dias com ele, ia pegar papelão e ferro nas ruas da cidade, com a égua Cristalina. Davam uma passadinha rápida no boteco do Juarez e voltavam para casa, o filho carregando o pai, mas quem guiava a égua era o Tonhão e ai de quem tocasse naquele cabresto.
Maria Rita, sonhadora, viera da Bahia com os pais, conheceu Tonhão em São Paulo mesmo, foi bem educada, sonhadora, casou há trinta e... cinco, hoje faz trinta e cinco anos de casamento! Guerreira. Sonha que um dia José Antonio vai ser romântico como os príncipes das fabulas da Disney, de HollyWood e por aí vai... Ô Maria, até parece que não conhece o marido que tem!
- Pai, ta lembrado que hoje é dia do aniversário do casamento? – José, o filho, falou baixinho.
- Ô meu fio, eu casei? Pensei q eu era solteiro ainda... – ele riu alto. Estavam arrumando a égua pra dar água e capim.
- Casou-se pai, vai lá jogar seu charme de ‘cabroco’ véi na véia! – José sorriu e saiu andando.
- Fio, venha cá! – ordenou. Sobe aí na carroça a mode eu ir no Juarez pegar uma rosa pra sua mãe – José ficou pensativo e acabou subindo.
E Tonhão saiu cantarolando: ”Quando eu vim lá da Bahia uma estrada eu não via, cada encruza que eu passava uma vela eu acendia...”
Trinta e cinco anos de casamento. Trinta e quatro anos dando rosas à esposa de presente. E já estava indo lá no Juarez mendigar mais uma rosa com a desculpa de que ele só pedia duas vezes ao ano: no dia das mães e do aniversário de casamento.
- Mais homi, se eu fosse muié eu separava docê...
- A mode que amardiçoado? – perguntou Tonhão ao amigo Juarez.
- A coitada da Maria fica o dia inteiro pilotando fogão e ocê tem corage de levá umas rosa pra ela todo ano que se passa?
Tonhão se calou, ficou pensativo. Ouvindo a voz da consciência. O que um macho véi poderia fazer para agradar a esposa?
Ele se virou e viu José cantando, empolgado, uma música de Luan Santana.
- Ô Zézin, seu fio de uma peste, deixa de viadagem que eu não fiz fio meu pra me fazê passar vergonha, não! Cabra dos inferno... – e se voltou ao Juarez.
- Tonhão, traz a esposa aqui que a gente separa a mesa a mode de ocês jantar, eu li dou até um vinho homi.
O sorriso invadiu o rosto daquele sertanejo que, em nenhum dia da sua vida imaginou fazer uma coisa como essa. Era coisa de cinema, de filme, mulher não precisava dessas besteiras. Mas cavalo dado não se olha os dentes.
A casinha humilde ficava uns trinta minutos dali. “Eu vo botar uma beca a mode impressioná minha donzela” Pensou no caminho de volta para casa.
Em casa o homem resolveu tomar um banho às pressas, deu uma olhada no espelho e notou a sobrancelha única que enchia seu rosto, a barba mal feita e os dentes podres. “A não tem homi mais feliz da vida...” E sorria.
- A janta ta quase pronta Tonhão – ela o encarou com estranheza. Tá pensando em sair agora seu fio de uma rapariga? – saiu do banheiro batendo o salto. É isso que a gente ganha desses corno dos diabo...
- Ô Maria!... – ele gritou uma vez e nada dela dar atenção. Ô sua fia de uma chocadera, venha cá!
- Que ce quer cabra safado? – estava irritada.
- Bota um vestidinho a mode a gente ir da uma namorada... É! Muié minha merece jantar fora hoje...
O sorriso se alargou pela face de Maria Rita. Uau! Pensou. Que diabo aconteceu com esse homi? Ele a esperou do lado de fora da casa. Saiu com salto alto, vestidinho e batom vermelho, a noite prometia! Montaram na carroça.
Tonhão saiu cantarolando Bezerra da Silva... ”Eu também to morando onde não mora ninguém, lá não tem poluição, não passa carro e nem passa trem. Até aí ta tudo bem, mas o que é bom dura pouco, vejam só o meu azar, imaginem que o Ricardão está procurando uma casa por lá.”