Cada Volta é um Recomeço

Em 1997 viajei para o interior paulista com o intuito de reencontrar uma antiga namorada. A cidade pequena de Pereira Barreto sempre me encantou. Ali moravam meus tios e primos. Aliás, a antiga namorada na verdade é uma prima minha.

Por ironia do destino, assim que chegamos percebi que a tal namorada não estava lá. Ela havia viajado para outra cidade e de mudança, dias antes.

Cheguei e me instalei por lá. Meus parentes, sempre muito atenciosos me trataram muito bem, mas alguém me chamou mais a atenção. Foi outra prima, filha de minha tia. Nós sempre fomos muito amigos, mas sempre olhei Lara somente dessa forma e nunca como mulher.

Nós saíamos todas as manhãs e passeávamos pela cidade. Ela me mostrava lugares bacanas e era muito divertido.

Certo dia iríamos a uma festa com meu primo Eduardo. Basicamente eu nem imaginava que festa era ou de quem era, mas lá no interior é assim, as pessoas se reunem e vão, não importa de quem seja.

No dia da festa, minha apareceu linda, muito bem maquiada e perfumada. Aquilo mexeu comigo e permanecemos um ao lado do outro o tempo todo.

Como não poderia ser diferente, horas depois estávamos aos beijos. E assim se seguiu nos dias que permaneci por lá. Não o fazíamos em público, perto dos meus tios mas sempre nos encontrávamos. O lugar predileto era em uma casa de caseiro abandonada. Ali passávamos horas nos beijando e fazendo amor.

Numa manhã de janeiro daquele ano tive que voltar para a faculdade, em minha cidade. Nos despedimos e ela ficou muito triste. Prometemos manter contato por cartas e assim o fizemos.

Escrevíamos toda semana por mais ou menos um ano, até que as cartas se tornaram menos frequentes e por fim se encerraram. Eu segui minha vida e ela a dela. Me formei engenheiro, conheci a Paula e nos casamos em 2001.

Nove anos depois, minha esposa Paula engravidou. Foi uma gravidez difícil e com muitas complicações. Quando estava no oitavo mês de gestação fomos ao hospital às pressas. Ela deu à luz ao nosso filho, prematuro, mas bem de saúde. Paula, no entanto estava sofrendo complicações pós-parto, e infelizmente acabou não resistindo.

Fiquei muito mal. Não seria facil criar nosso filho sem a mãe. Estava desorientado. Então recebi uma ligação de minha tia, lá de Pereira Barreto. Ela me convidou pra passar uns tempos por lá para esfriara a cabeça e levar meu bebê comigo.

Fiz as malas e fomos, Victor e eu. Ele era tão pequeno que muitas pessoas não concordaram que eu viajasse para tão longe sozinho com ele.

Quando cheguei, novamente todos foram muito atenciosos comigo. Sabiam da dor que estava sentido e do quanto precisaria do apoio deles. De repente avistei na sala uma linda menina, com uns dez anos de idade que veio ver o bebê. Era uma simpatia só. Falou comigo, brincou com o Victor e pediu para pegá-lo no colo.

Perguntei à minha tinha quem era aquela menina adorável e me respondeu ser filha de Lara. Eu nunca mais havia vontado para a cidade e nem soube que minha prima havia se casado ou coisa assim.

Na hora do jantar ouvi o barulho de um automóvel chegando. Ao abrir a porta da sala entrou uma bela mulher, muito elegante. Em instantes, a adorável menina correu a seus braços e daí não tive dúvidas: era Lara, aquela linda morena, que, à princípio não me reconheceu.

Então me levante e a chamei pelo nome. Lara virou-se com certo desdém, mas ao fixar os olhos me reconheceu, dizendo não acreditar no que via. Me deu um grande abraço e beijou-me o rosto com ternura.

Ela soube daquilo que aconteceu a minha esposa e foi solidária. Naquela mesma noite relembramos os tempos de infância e conversamos noite adentro, na sala de estar.

No dia seguinte, acordei assustado por não ver meu filho ao meu lado. Instantes depois, Lara entrava no quarto com Victor no colo, brincando com ele. Minha prima o descreveu como um bebê adorável e bonzinho. Havia trocado as fraudas dele e lhe dado uma mamadeira. Achei aquilo muito bonito.

No mesmo dia fomos no carro dela a uma estância turística, com nossos filhos. Enquanto Isabel caminhava com meu filho ficamos, Lara e eu conversando.

No final do dia, Lara deixou sua filha e meu bebê na casa dos meus tios e pediu que eu fosse com ela buscar umas coisas no sítio.

Fomos, e para minha surpresa Lara parou o carro e entrou na velha casa de caseiro, para pegar umas coisas e eu a acompanhei. Entrar naquela velha casa me trouxe belas lembranças. Percebendo isso, Lara me olhou nos olhos, dizendo que sabia do que eu me lembrava, e que para ela, aqueles dias tinham sido importantes por toda a vida.

Perguntei a ela por que não estava com o pai de Isabel. Lara me respondeu que eram circunstâncias da vida, mas, sem nenhum receio disse que só havia amado um homem nesta vida e esse homem era eu.

Aquilo mexeu profundamente comigo e lhe dei um abraço, dizendo o quanto ela era importante para mim.

Prontamente, Lara, sem grosseria me disse que, sendo ela tão importante para mim eu deixei de lhe escrever e nunca mais voltei pra sua cidade.

Ficamos em silêncio enquanto carregávamos a caminhonete. De repente começou a cair uma grande tempestade. Como a estrada era de terra, Lara ligou para o celular de sua mãe para avisar que estávamos bem, mas seguir viagem era muito arriscado, pois já era noite e o carro poderia atolar.

Entramos na velha casa e Lara preparou um chá, até por que era o único alimento disponível, além de um pacote de biscoitos.

O lugar, a chuva, as lembranças, tudo se juntou. Não resistimos e acabamos ficando juntos, depois de tanto tempo. Tudo voltava a acontecer, exatamente como nos bons tempos.

Depois ficamos nus, abraçados, e conversando. Contei a Lara sobre meu casamento e como estava sendo difícil criar meu filho sem a presença da mãe. Então Lara também contou sua história e que havia criado Isabel com a ajuda de sua mãe, sem a presença do pai. Tomado pela curiosidade perguntei como Lara havia conhecido o pai de Isabel. Ela respondeu que o conhecia desde criança e que o havia amado muito e ainda hoje o amava.

Tomado de estranhesa, perguntei como ela poderia dizer estas coisas, se naquele mesmo dia tinha dito que amara somente a mim? Sem rodeios, Lara respondeu que o pai de Isabel era eu.

Aquilo me chocou novamente, mas talvez foi o momento mais propicio para me dar a notícia. Perguntei o por que não me avisou e nem minha tia me contou.

Lara me disse que sua mãe não sabia quem era o pai de Isabel. Somente ela sabia e não contou a ninguém. Disse que Isabel era a mais linda lembrança de mim e não gostaria de romper com isso. Eu já estava casado e tinha minha vida e não seria conveniente estragar.

Um ano depois nos casamos. Poderíamos ter casado antes, mas não me sentiria à vontade com os pais de Paula e nem mesmo com sua memória, me casando com outra pessoa em tão pouco tempo. Também não poderia deixar meus negócios em São Paulo, e pelo fato de minha tia estar muito doente, Isabel também não a deixaria. Mas nesse meio tempo conheci melhor minha filha e ela ficou muito contente em saber quem era seu pai. Formamos uma bela família, Isabel, eu e nossos três filhos, pois Isabel engraviou novamente.

Nossa vida dá muitas voltas. Em alguns desses caminhos paramos e acampamos, mas um dia precisamos voltar, e cada volta é um recomeço.

Paulo Farias
Enviado por Paulo Farias em 23/08/2011
Código do texto: T3176591
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