'' UM CONTO...DOIS PONTOS...amor ao próximo....


          ...hoje o terreno da minha casa diminuiu, ficou pequeno, foi '' esquartejado'' em nome do progresso desvairado mas nem sempre foi assim...meus bisavós quando por aqui aportaram vindos da linda terra calabreza juntaram-se com todos os outros '' bonna gente'' seus amigos e parentes e descendo em Santos para o interior foram seguindo, passando por São Paulo da garôa, por Jundiaí, Campinas, e em Valinhos compraram pedaços de terra que ninguem queria, eram só vales e montanhas mas eles, os ''oriundos'' sabiam, tinham aprendido ainda na Italia que em '' Brasile plantando, suando, trabalhando feito mula , tudo dá, cresce e multiplica '' e assim foi feito...


           ...e quando meus bisavós faleceram meus avós receberam um grande pedaço de terra e ali construiram sua chácara e criaram filhos e netos e minha nona era a '' mãe terra, matriarca da grande familia unida '' e meu nono 'a ela adorava e tudo lhe permitia..o que ela fazia, dizia, era lei na casa e na vizinhança tambem....minha avó era a festeira, a cozinheira, a doutora e tambem a parteira...em casa e na região era dona Maria que chamavam na hora do aperto, não tinha hora nem dia, ou se chovia ou fazia sol de rachar mamona lá ela ia...atendia e voltava para casa feliz e satisfeita....eta nona Maria!!!


          Meu avô um dia não acordou, foi embora e deixou saudades, e mais um tempo depois foi a vez de nona Maria tambem lhe fazer companhia, e no seu velorio e enterro , lotado, não havia quem não chorasse esta triste partida, ela parecia serena como sempre mas havia choros e lamentos por ali, meu principalmente e tambem da Filomena....

          Quando eu nasci Filomena tinha dez, ela me viu nascer e me amava como seu ''bebê'', sua boneca e ajudou a me criar ...eu a adorava e adoro até hoje....e Filomena era a que mais chorava em volta do caixão de nona Maria e dizia que não ia deixar levar embora sua madrinha, veio o rapaz da farmacia e lhe aplicou algo que a fez se acalmar um pouco , cochilou e quando acordou estava mais calma, mas ainda chorava e na hora de se cobrir de terra minha nona Maria, ela, Filomena soluçava alto...coitada!!!

            Filomena ,diziam, parecia um cão de caça, perdigueiro seguindo a presa, vivia desde seus dez anos sempre em volta da minha avó, não desgrudava dela de jeito nenhum, e ela morava na chácara ao lado, tinha mãe e pai, irmãos menores, ela era a filha mais velha e minha avó era sua madrinha de batismo, fazia festas de aniversário para ela e seus irmãos...eu morria de inveja, mas meu avô me dizia...não seja besta Amelia voce é a neta da nona Maria, a preferida, eu aceitava, mas não entendia...

             E só fui entender quando depois do enterro Filomena e sua mãe, dona Joana, pedindo para comigo e minha mãe conversar e contou tudo, tudinho, o porque de tanto apego das duas com minha nona Maria....ninguem na familia sabia do que agora eu e minha mãe iriamos ouvir....

            Minha avó andava desconfiada que dona Joana apanhava do marvado do marido , o carcamano que vivia dizendo que de ninguem tinha medo, e ela um dia exigiu e obteve uma confissão da dona Joana, sim , ele lhe batia sim, e judiava das crianças tambem, era mau, mandão e beberrão, vivia nas tavernas, nas cantinas bebendo vinho e uma tal de '' grapa'',se embriagava e quando para casa voltava jogava a comida no chão e fazia aquele estrago na casa, ela se defendia e defendia as crianças tambem, mas ele vinha e ohhhh....socava a cara dela e cintada dava para todo lado, cintada em dona Joana e nas crianças....

              Senti uma raiva ao ouvir isto e fiquei imaginando minha avó então....meu avô, meu pai e os homens da familia eram severos, duros e machões mas respeitavam as mulheres e jamais levantavam a mão para uma delas...ai daquele que assim fizesse...meu avô colocaria de castigo no fundo da cisterna dizia ele..e uma vez fez mesmo com meu tio...ele bateu na irmã, ele tinha quatorze, ela doze, meu avô o amarrou e colocou no fundo da cisterna...meia hora e bastou, nunca mais homem nenhum levantou a mão nem  para outro homem....ás vezes dureza é necessária e aqueles eram outros tempos...

                  E minha avó ficou de olho no tal de Rufino e um dia ouviu choro e foi ver o que era e pasmem, o tal  estava era mais '' abusando'' da pequena Filomena então com dez anos....minha avó catou uma pá, deu-lhe uma só no couro cabeludo que ele desmaiou, minha avó pensou que tinha matado o desgraçado, pegou Filomena, dona Joana e as crianças e levou para casa, cuidou de todos, deu de comer, colocou na cama e quando viu que eles dormiam foi ela e dona Joana verem se o carcamano valente estava vivo, estava, o mardito do coisa ruim não morria não e minha avó jogou uma lata de agua fria no desgramado, ele gemia e minha avó falava, dizia, ele ouvia...se levantou, catou suas coisas e sumiu de uma vez por toda...se escafedeu ninguem sabe para onde...se norte ou sul, leste ou oeste.

                    No dia seguinte levou Filomena no médico e ele lhe garantiu que ela ainda era ''mocinha'' sim, e ficou tratando dela por anos e anos, conversava, ela ouvia e no final de tudo ficaram apenas as lembraças, marcas e cicatrizes na alma, tadinha, que ela com a ajuda dele se recuperou...foi um santo aquele velho, velhinho doutor do amor...minha avó o adorava e a cidade inteira tambem...não se fazem mais medicos como este em universidade nenhuma, a não ser a ''universidade do amor ao próximo e ao juramento que eles juram juram mas muitas vezes não cumprem...'' coitados!!!
 
                     Minha avó insistiu tanto tanto com meu avô que ele comprou a chácara onde dona Joana morava e trabalhava como '' meieira''  e como ela não era casada com o tal de Rufino, registrou as crianças, que nem isto tinham, registo de nascimento, no nome apenas de dona Joana, para evitar que o maluco tivesse qualquer direito sobre as crianças, batizou todos eles e ajudava a criar, escola, e tudo o mais....

                      E minha avó, sabida e esperta, pediu para Filomena e dona Joana nunca comentarem sobre isto, ficaria pior para elas e principalmente para Filo´, e assim fizeram, eram outros tempos aqueles, muito ''pré-conceito'' contra as mulheres e mulher sem homem, largada, amigada, desquitada, que divorcio nem sonhar, era sempre  vista e mais ainda, considerada uma ameaça para a sociedade, uma puta sem vergonha que era um perigo para as casadas, para os maridos, noivos e namorados....coisa feia!!! como se não fossem eles, os lindos marmanjos que sabendo que estão ''presos'' porque querem estar vivem querendo em pasto alheio pastar...idiotas!!! elas e eles.


                         E como eu disse a grande chácara foi esquartejada para dar caminho ao progresso e a ambição desvairada....as ofertas eram tentadoras e a familia agora em novas gerações estudadas em faculdades e universidades e necessitando de dinheiro para matar e curar a febre de consumo louco e viagens, luxo e riqueza,  foram vendendo, desmembrando as lembranças e o que resta agora são velhos retratos de meus antepassados ''pregados e pendurados '' nas paredes da minha sala, parece um museu, uma galeira....primeiro uma pintura de meus bisavós, depois retratos de meus avós, de meus pais  e tambem um grande e lindo meu e meu lindo amor, juntinhos até que uma qualquer '' barata descascada, inchirida e mau paga'' tente tirar, roubar ele de mim...mas se for assim pelo menos fica o meu sorriso de felicidade no retrato, ele não, tá sério...fica lindo assim...sério e enfezado, homem macho de verdade, delicado e amante dos ''bãos''....que pecado!!! eu ficar falando dele assim....

                         E gente? pensar que a lei mariadapenha está fazendo apenas cinco aninhos ainda...e antes dela como era?....quem viveu sabe e quem viver saberá as consequência, boas ou más? que a tal lei se bem aplicada terá...será?

                         O ser humano é complexo...o homem bate, abusa da mulher...a mulher dá parte, fica escondida, ele vai preso e quando sai?....o homem bate , abusa da mulher, a mulher não dá parte, os vizinhos dão e criam mais confusão... o valente sabendo parte pra discusão, briga feia  tapas e bofetões, morte....que situação!!!...viver com tudo isto, lutar contra tudo isto, calar ou agir?....

                         E acredito que no tempo de minha nona Maria a coisa tambem era assim, ela sabia...porisso o segredo, mas tambem tem aquele ditado...'' quem dá a esmola dá 'a Deus e esquece, mas quem recebe jamais esquece ''...

                         Filomena e dona Joana nunca esqueceram

                         Dona Joana é a mãe de Filomena que por sua vez é a mãe da Margareth, a Margô, minha amiga e colaboradora na loja...fofocamos mais do que trabalhamos, rimos e a vida aproveitamos...e Margô se casou e já tem dois filhos lindos e um marido que e´uma graça e tambem um pedaço de mau caminho...se cuida amiga Margô, deixa ele muito solto por ai não...vivo dizendo e ''cubiçando'' tambem..rsrsrs....e ela me dando o troco, caindo de lado pro meu '' pedaço '' gaucho macho, da fronteira...mulheres!!!

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AMELIA BELLA
Enviado por AMELIA BELLA em 10/08/2011
Código do texto: T3151361
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