Talvez... Esperança

Fim de uma tarde arduamente gélida. Eu não podia acreditar no que estava diante dos meus olhos. Uma criança, e dois adultos, sendo que um dos adultos - pai da criança internada estava olhando cuidadosamente seu filho, enquanto esperava há horas por atendimento.

O menino há mais de três meses esperava por um transplante de córnea, para que pudesse enxergar. Ver o mundo que ele sempre imaginou, idealizou. E o outro adulto internado, esperava por um transplante de coração, já que sérios problemas acometiam gravemente a saúde cardíaca do homem.

O pai do menino observava tranquilamente o ambiente. Nenhum luxo, muito pelo contrário. Camas em condições problemáticas, lençóis sujos, paredes repugnantes, cheias de sujeira, chão sujo, lâmpadas comprometidas em sua maioria, falta de médicos, higiene mais que duvidosa. Diante de tudo isso, o que lhe chamou a atenção foi uma lágrima que lentamente descia no rosto do seu filho. Seu filho curiosamente quieto, perguntou ao pai se existia mais alguém no quarto, além dos dois, ao ouvir um pequeno gemido. E o pai respondeu que existia, sim, outra pessoa no quarto em condições parecidas com as do menino.

Amanhecia o dia e ninguém aparecera para ao menos perguntar ou registrar a situação dos pacientes dali. Mesmo depois de o homem ter reclamado exaustivamente a uma enfermeira que encontrara milagrosamente no corredor, ela deu as costas a ele e foi embora.

Voltou ao quarto e seu filho se queixou, dizendo que não conseguia mais esperar e o homem ao lado disse que esperou mais de seis anos por alguma migalha, mas nada que pudesse alimentar o mínimo de esperança no pobre coitado. Após se queixar, o homem derramou algumas lágrimas conformadas, numa expressão desolada...

Eu sinceramente estava perplexo com aquela situação. Sentia-me impotente. Nada podia fazer por aqueles dois. A cada vez que via a criança reclamar de um direito naturalmente seu, eu observava lentamente aqueles olhos sedentos de vida, aquelas mãos inocentes, o esboço do sorriso de esperança, mesmo diante de tudo o que ele vivera até agora.

Depois de um tempo dormindo, o menino abriu os olhos e perguntou despretensiosamente ao pai, como era o sentimento das pessoas e levou o pai às lágrimas. Sem ter muito o que responder, o pai disse ao filho que o sentimento era um lindo coração, pegando as mãos do menino e as colocando no seu coração inocentemente. E o garoto aparentemente comovido ao perceber o silêncio e o choro de alguém, perguntou ao pai qual o motivo de as pessoas chorarem. O pai, sem resposta, ficou em silêncio. Ao ser interpelado novamente com a mesma pergunta, o homem do lado do menino disse: - Menino, a gente chora quando está triste ou feliz e por muitas razões. Não dá para explicar.

Depois desse gesto comovente, o menino segurou uma das mãos do homem. Carinhosamente, ele acariciou-as e disse ao pai que era assim que ele sabia demonstrar amor. O pai discretamente saiu do quarto, foi para um canto, demasiadamente longe, até fora do hospital e chorou fartamente de emoção.

Fora do hospital, ele olhava para o horizonte à procura de algo ou alguém, para que tentasse encontrar a solução para seu filho. Olhava para o céu nebuloso e imaginava que fosse chover, mas preferia acreditar que tudo daria certo.

Depois de algumas horas, eis que a esperança chegava. Um médico cruzava a entrada do hospital. O homem imediatamente o parou e ajoelhou-se diante do médico e pediu para que atendesse seu filho. Ele poderia nunca mais enxergar. Era uma questão de tempo, mas o médico rispidamente chutou o pai da criança.

De dentro de uma sala alheia, um rapaz – que, aliás, era o paciente do psiquiatra escutou a discussão. Ele carregou tranquilamente o médico até a sala do menino e do homem mais velho. Foi obrigado a atendê-los, embora não fosse sua especialidade.

Ao entrar na sala, o médico disse imediatamente que só tentaria resolver o problema do menino e que o homem que se virasse. Não era problema dele.

Depois de examinar precariamente os olhos do menino, o médico disse que talvez não houvesse solução. O pai do menino foi às lágrimas e segurando seu filho no colo, aproximou-o do homem doente, cujo tempo de vida não se podia prever e disse: - Filho, este homem que esteve com você durante esse pouco tempo... O menino acariciou o rosto do homem e perguntou curioso o que seu pai queria dizer.

- Filho, este homem, um dia te deixou na porta da minha casa e me fez jurar que jamais eu contaria que ele é seu pai. – Uma lágrima do rosto do menino caiu sobre o rosto de seu verdadeiro pai. Segundos depois o homem disse: - Pena que não pude ter você comigo, meu filho. – e fechou os olhos, enquanto a criança chorava sua perda...

Paulo Ricardo Pacheco
Enviado por Paulo Ricardo Pacheco em 04/07/2011
Reeditado em 25/07/2011
Código do texto: T3073927
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.