Valsa ao Luar

Um luar argênteo e translúcido. Flores, muitas flores opacas e sonolentas. Sob um caramanchão, em um banquinho tosco, repousa um violão, ao esquecimento.

Não me contenho. Adoro a música.

Desço a escadaria, chego ao jardim. Pego o violão esquecido sobre o banco e executo uma bonita valsa. Não sei o título, mas lembro que minha mãe gosta de cantá-la, por isso, sinto um aperto no coração. A lua está deslumbrante. O perfume das flores envolve meus pensamentos, inebriando-me de paz, lavando-me o que vai de mais inquietante na alma.

Seguro o violão e caminho a passos lentos... Uma pequena meditação como fazem os mestres orientais. Preciso ouvir a voz da minha consciência, para que possa adquirir a paz que tanto aspiro. Não pensarei no passado, nem no futuro... Viverei este momento como uma bênção da natureza aos meus sentidos ávidos de felicidade. Um regato cristalino corre, preguiçoso, coberto de pétalas. A branca lua vagueia pelo espaço, desafiando os corações solitários.

Uma recordação se me figura a tela da imaginação: Minha casa, minha mãe, meus irmãos, minha tia, meus bichinhos de estimação... E um amor. Ah! O amor. Eis a razão deste vazio em meu peito. E deste frio na alma! Quanto tempo sem a tepidez benfazeja que emana de seu corpo e de suas palavras ternas! Preciso “matar esta saudade”. Não sei se estou empregando bem essa expressão. O importante é que, neste momento de carência, estou feliz, abençoada pela natureza e quero vivenciá-lo. A noite está propícia. A verdade é que nunca dominei bem este instrumento, mas o mágico violão conhece os meus sentimentos e afina as notas tão conhecidas, tão companheiras, da valsa “Ondas do Danúbio’. Dramatizo então, uma melopéia suave, dedilhando esse imorredouro personagem de uma noite de luar. Minha voz eleva aos espaços argênteos as primeiras notas da bela canção que diz: “Dois corações, neste dia feliz/ Revivem momentos sublimes de amor/ Nós dois a dançar e o mundo em flor/ Estrelas no céu e no teu meigo olhar”... “Vamos brindar, neste dia feliz/ Aquela noite de sonho e esplendor/ No encantamento do céu a luzir/ A noite do nosso amor”.

O céu está claro, muito claro...O luar tranqüilo cada vez mais suave...

Um infinito de flores adormecidas em um campo cinzento, amplo, cortado por uma estrada que se perde ao longe... Onde? Não sei. Talvez numa fonte cujas águas retratem, indelével, a rainha da noite... ou onde saciem a sede, os fatigados viandantes.

Um doce aroma exala das mimosas flores silvestres, abençoando a noite.

A paisagem é incomparável. Sons harmoniosos evolam pelo ar, espargindo pelos espaços valores transcendentais, conquistando com sua poesia musical, os lugares mais sensíveis do meu coração.

A bela rainha baila, graciosa, entrelaçando-se, engolfando-se entre brancos flocos de nuvens, despreocupada e feliz. Talvez não se aperceba de que vem iluminando a estrada da minha vida, desde a fase tenra da minha infância, tornando-a mais amena. Cada vez que me purifica com a magia do luar, a energia selênica gera luas em meu céu: alegria, esperança, fé, paciência, ternura, saudade, paz, felicidade e muito amor.

E a minha estrada prossegue sua jornada, sob a luz benéfica desta maravilha que veio das mãos do grande Arquiteto do Universo. Para onde? Não sei. Até quando o Criador dos astros resolver dar um “off” na lua do meu coração.

O regato cristalino corre lentamente... Leva em cada pétala de rosa as minhas mágoas, as doloridas saudades, as frustrações, as faltas por omissão...

***

Maria de Jesus. Fortaleza, o3/07/2011.

Maria de Jesus
Enviado por Maria de Jesus em 03/07/2011
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