Uma Graça
Aquela bela italianinha se chamava Grazia, ela jamais poderia imaginar... Casou-se aos 16 anos com um homem de trinta. Naquela época isso era normal, o pai prometia a filha para o pretendente, à as vezes mesmo antes da criança nascer... O que restava a ela era ama-lo e respeitá-lo seguindo as leis de Deus.
Passados dez anos, Grazia já estava com vinte e seis anos, chegou da Itália o irmão mais novo de Genaro, chamava-se Salvatore, trinta anos, um homem alto, pele e olhos claros. O casal foi recebe-lo na estação, logo ele surgiu, uma mala pequena, roupas justas e simples, mas aquele sorriso, o abraço apertado no irmão mais velho, emoções inexplicáveis, Genaro já com seu quarenta e seis anos apresentou a jovem esposa ao irmão. Aquele olhar foi único, identificou um segredo que começava ali naquele momento.
Apesar de humilde, a família sempre foi muito unida, as festas eram muito agradáveis muita comida, gritos, abraços, danças, quase todos se divertiam entre si, quase... porque Grazia e Salvatore mesmo passados alguns anos, depois daquele olhar inesquecível, jamais voltaram a simplesmente se cumprimentarem como os demais.
Os anos se passaram, foi então que Salvatore com já seus trinta e oito anos, sem motivo lógico partiu para Itália, Grazia, acompanhada por sobrinhos foi até o porto de Santos se despedir, porém quando viu aquele olhar partir, em silêncio chorou.
Aquela tristeza sentida fez com que seus sobrinhos achassem estranho aquelas lágrimas. Salvatore sufocou seus sentimentos e se desligou da realidade. Mas a vida é misteriosa, dois longos anos se passaram e Genaro veio a falecer. Não existiu em momento algum imaginar como seria o futuro de Grazia e Salvatore, ela no Brasil e ele na Itália. O destino é mais forte até que o amor, mas os dois juntos são invencíveis. Foram mais dois anos e Salvatore desembarcava naquela mesma estação, o mesmo olhar, o mesmo sorriso.
Ninguém supunha que aquela volta era movida por um amor escondido, sem trocar sequer palavras de carinho, Salvatore e Grazia, estavam sempre juntos, compraram um sitio no interior, e lá viviam a terceira idade. Nada diziam para eles, mas comentavam e especulavam sobre aquela estranha e não assumida união, ao menos perante a família.
Mas para surpresa do pessoal um dia o casal de inseparáveis amigos decidiu juntar os mais próximos e informa-los das últimas.
Grazia tomou a palavra...
“Gente, gostaria que vocês me escutassem, é muito importante, sei que já estou com quarenta e seis anos, mas meu coração ainda é jovem, meu não, nosso, eu e Salvatore décimos nos casar”.
A surpresa foi geral, quase todos queriam ser os primeiros a saudar aquela união, aquele amor tão antigo, tão gentil. Amor de cabelos brancos e mãos sofridas. Amor quase renegado, amor de destino... E o tempo passou, foram mais dez anos os suficientes para levar Grazia para perto de Deus, separando aqueles olhares, deixando sem brilho o sorriso do amado, que se isolava silencioso. Foi necessário um ano exatamente um ano para Grazia convencer o dono do destino, que ela não poderia ficar sem seu brilho, sem sua identidade, e assim nesse dia Deus piscou para Salvatore, que de pronto segurou as mãos da sua alma e o levou para sua alma gêmea, e no céu mais uma estrela começou a brilhar.
De vez em quando me lembro deles...