A voz da consciência
Horácio levantou-se pela manhã mirou na sua imagem refletida no espelho, franziu a testa e mandou um soco no espelho ferindo a mão. Com uma calma enervante enrolou uma gaze no machucado, mas sua mente estava trabalhando a todo vapor. Não era a primeira vez que a sua consciência revoltava contra sua estupidez.
Tudo começou num baile de carnaval...
Horácio brincava ao som da marchinha “Pierrô Apaixonado”, quando avistou aquela garota linda e sorridente, toda enfeitada de confete e serpentina. Seus olhares se cruzaram em entendimento mútuo. Ele aproximou-se da garota para dançar uma marchinha de carnaval, acabando por brincarem juntos no salão do clube carnavalesco até terminar o baile.
Na última noite de carnaval, voltaram a se encontrar e dançaram até o baile terminar. Na despedida ela lhe disse: “Se quiser me ver novamente vá até minha casa, aqui está o endereço”.
Sua imagem não saia do seu pensamento, nunca havia sentido nada igual por outra mulher, será que ele estava apaixonado?
Deixou passar três dias e foi procurá-la. A partir daí iniciou-se um romance entre os dois, que aos poucos fora se transformando em paixão. Não havia dúvida, ela era a mulher de seus sonhos.
Depois de vários encontros, e sentados num banco de uma praça ela lhe falou: “Amor, creio que a nossa situação não pode continuar assim, eu gostaria que você conversasse com minha família a respeito de nós dois”. O rapaz levou um susto, e respondeu: “O quê?” Sem titubear foi logo dizendo que isso estava fora de cogitação, pois não pensava em se casar tão cedo. Ela abaixou a cabeça sem responder nada, mas lágrimas rolaram de seus olhos lavando suas faces, denunciando sua grande frustração, pois não esperava uma reação tão bizarra como essa.
No caminho de volta pra casa, Horácio não conseguia esquecer a proposta da sua namorada. “Então o que ela quer é fisgar alguém pra casar, hein? E eu, pensando que ela me amava... Suas intenções eram outras, queria laçar o primeiro que aparecesse”...
Revoltado, Horácio decidiu não mais voltar a vê-la. Para preencher o vazio no seu coração, passou a namorar outras moças, mas não ficava com nenhuma delas por mais de dois ou três dias. No fundo, ele sentia-se um covarde não só por abandoná-la, mas também por ocultar todo o seu sentimento e o amor que sentia por ela. Sua vida transformou-se num verdadeiro inferno, não conseguia mais dormir e nem se alimentar, punido pela sua consciência.
Certa noite rolando na cama sem conseguir conciliar o sono, ele decidiu procurá-la, mas com a dúvida ainda pairando em sua cabeça, sem parar de pensar: “será que ela ainda me aceitaria”? Não tinha mais nenhuma dúvida do seu amor, pediria perdão e proporia a ela o seu tão sonhado casamento porque já não suportava mais o ritmo das marteladas em sua cabeça, mas preocupava-se com a forma com que ela podia recebê-lo. Será que ela ainda não tinha outro no seu lugar? Pois já havia decorrido nada menos de três meses que não se encontravam. Sua mente remoia-se de um lado para outro.
Horácio bateu na porta da casa, e uma senhora de cabelos grisalhos o atendeu. Perguntou pela namorada, enquanto notava nas faces da anciã uma espécie de tristeza e espanto.
“Meu filho, hoje faz quarenta e dois dias que ela faleceu, vítima de um parto prematuro”. Tenho aqui uma carta que ela ia lhe enviar pelo correio, antes de falecer. Ele viu correr no rosto da senhora lágrimas abundantes enquanto miravam-se um ao outro.
Olhou o subscrito do envelope e leu: “Ao meu inesquecível amor”.
Suas pernas bambearam e quase foi ao chão. Faltava-lhe coragem para abrir o envelope. Um pensamento invadiu sua mente: “Era isso! Ela estava grávida de um filho meu! Era uma inocente envolta em um sério problema! Sou um covarde miserável e desprezível, a vida para mim perdeu o sentido. Viverei eternamente com seu vulto em minha consciência, envergonhado pelo ato covarde que levianamente, cometi. Sou um cruel assassino.”
A minha vida também não tem mais sentido, termina aqui.