Eu não sabia que você existia

Olhando-me com seus olhos negros, fixamente, me pergunta subitamente:

- Guido, finalmente o que você quer de mim?

Estupefato, pensei rapidamente: e ela ainda não bebeu uma gota da cerveja!

-O que? Eu disse como um robô.

Continuava a me fixar nos olhos.

- O que você ouviu. O que quer de mim?

Eu simplesmente congelei.

Era a hora de deixar tudo claro, ver o jogo como ele é em todas as suas nuances. Estava me dando esta oportunidade!

Ela havia sido durante tanto tempo uma coisa irreal, fictícia, imaginária, foco principal dos meus anseios como poeta, escritor, sei lá, era a musa inspiradora que naquele momento parecia ser um anjo caído do céu virando gente, na minha frente.

O que estava acontecendo? Parecia que o chão sumira dos meus pés.

Tentando me recompor, gaguejando, continuei:

- Está falando do quê? (eu não queria dar uma mancada qualquer com palavras vãs)

- Simplesmente, Guido, não aguento mais esta situação. Sei que você está apaixonado por mim, a coisa parece só aumentar e me sinto mal com isso, mas me confundo com o poeta. Às vezes te odeio como Guido, às vezes sinto-o ridículo, mas não posso maltratar um grande amor sincero e, além disso, sinto grande atração e emoção quando penso no poeta Pierre. Riu com prazer, me sentindo menina, às vezes. Outras vezes, minha cabeça entra em parafuso.

Leio suas poesias, seus textos e não raro me emociono ou me excito. Não sou a menina fria que você pensa que sou. Sou também muito sensível, só não gosto de escrever e não posso alimentar algo que só fará mal a nós dois.

Eu, parado, atônico, não conseguia falar. Ela continua:

- Não pense que sou uma santa, como vejo em algumas poesias suas. Sou uma mulher que sabe o que quer. Também não sou fria. Sei ser muito quente quando estou com alguém que quero, principalmente sexualmente.

Eu não conseguia acreditar!

Ela ainda: - Não pense que não tenho alguém só porque nunca apareci com ele para a turma. Simplesmente resguardo meu lado sentimental, pois inclusive não quero compromisso sério com ninguém. Ninguém mesmo, por enquanto. Esse é um dos motivos que não consigo me aproximar de você, como amigo. Fico com medo de você não entender, te magoar. Tudo começou tão complicado e hoje, vendo esse amor, que me parece tão puro, gentil, incomum e às vezes infantil, me amedronto. Não quero ficar assim. Também não pense que quero você.

Às vezes quero um homem na cama, um macho, sexo selvagem, alguém para me satisfazer sexualmente, pura e simplesmente. Já me apaixonei e me decepcionei. Não quero mais isso.

- E aí. O que tem a me dizer? Ficou mudo? Termina, sorrindo.

Eu já estava mais calmo e meu coração batia normalmente após ouvi-la.

- Me parece que você já disse tudo. Já sabe tudo. Preciso da sua amizade, sua presença. Não sei mais viver sem esta dádiva. Só preciso dizer uma coisa: O Pierre não existe materialmente e Guido está sempre perto de você, sentindo sua presença e sua ausência ao mesmo tempo. Todos os dias. O Pierre sente falta da musa, Guido do seu corpo, do seu ser real. Se você fosse um pouquinho mais sonhadora entenderias esse aspecto dual do nosso ser. Eu sou um e sou dois. Amo-te perdidamente como o poeta Pierre e lhe desejo ardorosamente como o homem Guido. Essa pseudo-confusão só acabará quando nos descobrirmos, inclusive na cama. Fora isso, perdurará para sempre dessa forma e para mim, até o infinito, talvez quem sabe, por outras vidas. E assim, nunca saberei quem é você, nem você saberá quem realmente sou. Só sei que é algo tão forte em mim, que comparando com todos os sentimentos que já tive em minha vida, esse é o mais forte. Algo tão belo, tão forte e que só pude vislumbrar em alguns romances antigos.

Ela não disse mais nada. Só ficou com o rosto um pouco rubro pelas minhas palavras que parecia não querer ter ouvido. Era sempre assim.

Tomamos o resto das bebidas. Ela já não me olhava mais nos olhos, como estava fazendo. Voltou ao que sempre fazia. Baixava os olhos, como se estivesse com vergonha de mim. Jogos? Não sei. Eu adorava isso! Paguei a conta e saímos.

Dei-lhe o capacete rosa para montarmos na motocicleta e levá-la pra casa. Tudo parecia estranho. Ela subiu na garupa me segurou. Desta vez, pôs uma mão no meu ombro e a outra na minha cintura. Algo estava diferente.

De repente, colocou as duas mãos na minha cintura, apertando de uma forma que não era o comum. Senti seus seios mais junto de minhas costas. Seu corpo estremecia. Tudo estava diferente.

Eu precisava decifrar aqueles códigos e não queria magoá-la com qualquer atitude machista, leviana. Não era meu estilo. Qualquer atitude poderia ser perigosa.

Foi quando ela gritou com voz surda devido ao capacete, confundindo um pouco com o ruído do vento: - Eu não sabia que você existia!

Minha cabeça foi às alturas! Entendi plenamente, mas fingindo não ter ouvido, perguntei: O que??

Ela se calou. Era o código que eu precisava! Parecia que tinha me dado a chave de algo muito secreto. Só precisava encontrar esse tesouro.

Parecendo que a motocicleta andava sozinha, simplesmente levada pelo vento, fui pela orla marítima que estava linda, com um sol maravilhoso batendo na minha face, nesta minha Salvador que tanto amo. Ela não dizia uma palavra.

Um beijo sequer havia surgido na conversa. Mas entrei na rua onde só tinha motéis. Ela continuava calada.

- Meu Deus eu pensava. O que estava acontecendo? O que para tanta gente deveria ser coisa normal, para mim parecia um sonho.

Uma puta velha como eu que já passou por tantas coisas, tantas mulheres, tantos desencontros, estava agora tremendo, quase soltando o guidão da motocicleta, numa situação para mim inusitada em termos de relação homem/mulher.

Entrei no primeiro motel da rua, nem vi se tinha promoção ou algo parecido. Não queria saber de nada, a não ser no que aquilo ia dar. Perderia sua amizade ou a teria em meus braços?

Peguei as chaves de uma suíte, na portaria. Na garagem, ela saltou da garupa, sempre calada. Arrumou os cabelos, de olhos baixos. Desci da moto e fechando a porta da garagem senti seu abraço por trás, tímido, mas forte. Virei-me e vi seu rosto, vermelho. Seus olhos mostravam desejo, medo. Como eu amava seus olhos!

Abracei-a fortemente, rosto no rosto, e só depois de alguns segundos assim, sentindo-a também tremendo, beijei-a docemente.

Não posso saber dela, mas eu estava no céu.

Abri a porta da suíte e Rod Stewart cantava para nós no rádio “The Way You Look Tonight”, como se soubesse que estávamos chegando.

Eu disse isso e ela riu. Abraçou-me novamente e beijou-me, colocando um pé pra trás, como nos filmes. Que legal.

Olhei a banheira de hidromassagem, o chuveirão, as luzes negras do salão que me convidava a dançar com ela.

Peguei a sua mão e puxei-a para dançar. Ela ria daquele jeito maravilhoso que só eu sabia ver. Não estava bêbada. Estava esplendidamente sóbria e sabendo o que queria. Rod Stewart continuava, com sua música romântica. Que bom. Beijei-a, dançando. Sua língua parecia em brasa e me excitava ao extremo.

Olhei a cama...

Querem mais? Vão aos TEXTOS ERÓTICOS do Recanto, Autoria de Pierre Guido, pois quase todos são dedicados à ela, minha eterna musa, paixão, motivo de alegria de vida e verão do que somos capazes. Procurem Bebida Encantada, Ressaca, Estranho Amor e outros. Bjs poéticos...