Cozinhar é arte, não saber faz parte

Cheguei em casa com as mãos cheias de sacolas, era tanta coisa que por um instante pensei que havia esquecido algo. Por sorte era só impressão minha mesmo. Fui entrando com um sorriso nos lábios, igual uma criança ansiosa.

Victor que estava na sala me olhou surpreso já disparando uma de suas piadinhas:

-Não sei se me impressiono mais por você ter acordado cedo, ou por chegar em casa com tanta sacola e um sorriso arteiro no rosto.

Eu o olhei de canto, por mais sacolas que eu pudesse carregar, ainda me sobrava uma mão para pegar uma almofada e atirar nele. E foi isso o que eu fiz.

Passe direito pra cozinha, coloquei tudo na mesa e disse confiante:

-Vamos lá.

Receita em mãos, cabelos presos e um pano de prato jogado no ombro, na verdade eu nem sabia se usaria ou não o pano, mas deixei dando um charme. Victor não se aguentou de curiosidade e foi até a cozinha pentelhar. Quando me viu encarnando a personagem de cozinheira começou a rir:

-Poxa amor, podia me avisar se pretende explodir a cozinha. Eu saía pra dar uma volta, sei lá...

Nessa hora eu descobri a utilidade do pano no meu ombro, bater no Victor, claro, como eu não havia pensado nisso antes?

Ele me perguntou curioso:

-O que pretende fazer para seu noivo lindo aqui?

Eu lhe mostrei a receita, apontei para o título e disse em tom confiante:

-Fettuccine com camarões.

Victor riu:

-Só o nome já é um palavrão, quase uma ofensa.

Eu já tava perdendo a paciência com ele:

-E você já pra sala, vai ficar me atrapalhando e não vai dar nada certo aqui.

Ele reclamou:

-De jeito nenhum, quero presenciar essa catástrofe.

Eu fiz careta:

-Poxa amor, para de duvidar dos meus dotes culinários.

Ele me abraçou:

-A questão não é duvidar, é que esses dotes não existem.

Eu me afastei já começando a preparar os ingredientes. A receita parecia criptografia egípcia, no bom minêreis: “Oh, trem cumpricado sô!”. Acabei tendo uma ideia, já que o Victor ia ficar ali me enchendo o saco ele poderia ir lendo a receita enquanto eu preparava. Como ele havia lido, comecei dourando o alho. Victor sentiu um cheiro de queimado e foi até o fogão, olhou a panela já a tirando do fogo:

-Eu disse doure o alho e não, torre o alho.

Eu me expliquei:

-Mas eu estava picando a cebola.

Ele me olhou como se fosse óbvio:

-Mas a cebola já deveria estar picada.

Eu o repreendi, batendo novamente com o pano nele:

-Mas você não explica né cabeção.

Nesse clima de total harmonia fomos tentando fazer o macarrão. Enquanto a massa cozinhava e o “pseudo-molho” que havíamos feito não ficava pronto, decide ir fazendo a sobremesa, torta de limão. Começamos a fazer a torta, Victor lê o começo da receita:

-Numa superfície limpa e plana, coloque amido de milho, farinha de trigo e açúcar. Faça um buraco no meio e coloque as gema e margarina sem sal. Com as mãos, misture bem os ingredientes até obter uma massa lisa e uniforme, que desgrude das mãos.

Eu o olhei confiante, como se aquilo fosse a coisa mais fácil do mundo. Doce engano o meu. Quando vi que não ia dar certo pedi socorro ao Victor:

-Amor, tem certeza de que não precisa mais nada nessa massa?

Ele foi até a massa:

-Tenho, acho que você não está sabendo amassar. Deixa que eu faço isso...

Eu consenti deixando-o tentar resolver o problema. Até parece que ele conseguiu reverter o desastre né? Claro que não, e acabou tendo mais massa de torta na roupa dele e na minha do que na própria forma.

Enquanto nos entretemos com a torta, esquecemos a massa no fogo. Deixo a critério de vocês para que imaginem o que aconteceu. Aquela massa tava mais grudenta e gosmenta do que cola de pipa. Victor pra tirar sarro ainda me solta a frase:

-Mas o cheiro tá bom amor.

Quase enfiei a cabeça dele dentro da panela. Já estava me rendendo ao que o Victor havia me dito, é, realmente eu não tinha o dom pra culinária.

Depois de tudo “pronto” nós dois paramos pra observar a mesa. Era de dar dó o almoço que havíamos feito. Nesse dia eu descobri por quê a minha mãe me mandava ir fazer a lição de casa quando eu dizia que ia ajudá-la na cozinha.

Eu comecei a rir e fui em direção ao telefone, me sentei no sofá já discando um número. O Victor me olhou e perguntou sem entender:

-Pra quem você vai ligar?

Eu o olhei sorrindo:

-Eu vou ligar pra minha mãe, convidando-a pra vir morar com a gente. Antes que a sua mãe te leve de volta pra casa dela, alegando maus tratos!

@sabrinacarol_

http://sombradarvore.blogspot.com/

Sabrina Silva
Enviado por Sabrina Silva em 11/06/2011
Reeditado em 01/08/2011
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