ATÉ QUE...

Depois de dois longos meses, Lia sentia o cansaço da vida num hospital. Porém, não tinha coragem de deixar Xavier, o marido há 30 anos, sozinho naquele quarto.

Lembrou-se do dia em que sua rotina mudou, quando o marido chegou em casa e revelou que tinha um câncer. O mundo desabou. Chorou junto com o companheiro, mas decidiu lutar junto com ele.

Depois vieram as consultas, rotinas e tratamentos que transformaram a vida e o corpo de ambos.

Lembrou-se ainda da última consulta quando viu o rosto do médico, Dr. Vasquez, enquanto olhava os últimos exames e o conselho sério e taxativo: "Você precisa de um tratamento intensivo". Saíram do consultório direto para um quarto de Hospital e desde então, com raras "visitas" à sua casa, ficara alí ao lado do homem, marido, pai dos filhos e eterno namorado.

Lia tinha consciência da realidade: O câncer estava matando Xavier.

Chorou mais uma vez o momento. Se sentia só. Ouviu uma voz familiar. "Doutor Vasquez" pensou. Vislumbrou a figura alta surgir no corredor. Correu ao seu encontro. Pediu:

- Doutor, quero te pedir um favor!

- Sim, olá Dona Lia, pode falar.

- Me permita ver meu marido!

- Não posso permitir que a senhora entre no CTI fora do horário estabelecido pelo hospital.

- Doutor, não sei bem o que é, mas preciso vê-lo.

O médico olhou nos olhos daquela esposa. Viu a tristeza presente e respondeu:

- Venha comigo.

Lia o seguiu pelo corredor até chegar a porta dupla que se abriu ao sinal do Doutor. Na sala seguinte, fizeram os procedimentos e Vasquez apontou para uma porta preta como uma autorização.

Lia entrou e foi até o leito onde o corpo magro do companheiro se encontrava.

Pôs a mão sobre a mão dele e disse baixinho:

- Estou aqui meu amor!

Lia beijou as mãos magras de Xavier e sentiu uma leve pressão sobre a sua.

Houve um instante como se tudo parasse.

Lia voltou a si, sendo conduzida por uma enfermeira.

Ouviu quando o médico disse a um outro: "Horário do óbito, sete e trinta e cinco".