não fuja do que vês
Dentro da sala os olhos dela vagueava nos sofãs. Abria livros e o mesmo olhar vagueava páginas, tristes. Livros capa de couro, antigo e descascado. Larga tudo e anda no quarto ermo. Cama desarrumada há dias, poucos quadros ainda resta. O retrato caiu e nunca mais foi alçado de novo à parede. Roupas sujas de meses, talvez anos algumas, marca o tempero que move os olhos de ponto em ponto, não para achar, mas pra fugir. O descanso é no vazio,
Assim é mais fácil, não precisa do compromisso de levar junto o que viu.
Não é apenas isso, é também o peso e o medo abissal de não achar o que viu em si mesmo. Por isso a solidão dela. nada do que vê encontra em seu coração. Nada do que existe fora de si,
Nas estantes, na cama e gavetas aparece nos compartimentos secretos de suas veias. O olhar vaga. Se tivesse um coração na iris, ou mesmo se a íris fosse um coração estaria batendo forte.
Sinal de medo, de escuro, da necessidade de projetar mais de fótons nos lugares por onde pousa.
Mas olho não tem coração que reforça o vazio, que faz do vazio, matéria. Não manda fotons para o que enxerga com pouca valia. Simplesmente foge em direção as poucas colinas conhecidas. Lugar o onde o olho pode ter certeza. Lugar que seus braços-cilios podem sentir uma solidez, que faz respirar sem abismos...
Daí a necessidade do sabão, da tesoura que busca simetria, da faca que divide igual, da vassoura que tira a poeira. Que deixa no mundo de sua casa apenas brilho, apenas os produtos da boa fôrma.
Que exclui as imperfeições que nos lança no vazio da não existência.
Sua duvida é se realmente quer descansar seus olhos ou fixa-lo na assimetria até começar a apreciar o que não pode de antemão ser apreciado.