Bolo aos Peixes - Parte 5

"Eu juro que é com a minha melhor letra que eu tento escrever pra você. Você tá bem? Ficou surpresa quando se deparou com o meu rabisco no envelope missivo repousando em algum móvel aí da sua casa, te esperando chegar do trabalho? Ontem você me irritou de tal forma que eu fui obrigado a escolher um amigo e alugá-lo. Bom, não adiantou muito. Ele falou pra eu ir dormir e no dia seguinte dissertar sobre o assunto escrevendo, que nos meus rabiscos eu teria minhas respostas. O que ele me recomendou é o que eu sempre faço. O conselho dele foi o mesmo do Oráculo de Delfos para Minos, que ordenou a Dédalo que construísse um labirinto para conter o Minotauro. Só que nesse caso eu mesmo sou o Minotauro, sou o Teseu e minhas palavras são a Ariadne com o novelo de lã me esperando na saída do labirinto. O envelope estava te esperando ou você se deparou com o carteiro quando estava saindo apressada pra trabalhar e agora está me lendo no trem? Digamos que você é a Ariadne – antes que minhas palavras tomem a incumbência de sê-la -, Teseu e o labirinto ao mesmo tempo e eu continuo sendo o confuso Minotauro. Acho que não estou conseguindo me expressar direito. Assim: eu, antes de você me irritar, era tudo ao mesmo tempo, menos a Ariadne. Eu perdido no labirinto de mim mesmo e eu como o próprio Teseu que dará uma marretada na cabeça do Minotauro e vai sair do labirinto graças ao novelo de lã – minhas palavras escritas. Então você me irrita e se transforma em tudo, menos no Minotauro, que sou eu, que fico vagando no labirinto me irritando com cada topada de hesitação, de monossilabismo (?), de contra-senso e essa irritação é complicada porque eu quero me afundar mais ainda nesse labirinto não procurando a saída, mas sim o novelo que vai me levar até a Ariadne que eu quero conhecer. Bom, como pode ver, já me perdi. Talvez se você estiver lendo isso bebericando o seu Black Label me compreenda um pouco. A minha sobriedade já é meio ébria. E talvez ébria você a compreenda. E talvez sóbria pegue essa folha e mostre pra suas amigas falando “olha o retardado que eu conheci numa peça de teatro que o cara ficou peladão”. Ebriedade e sobriedade à parte, que dia você faz aniversário mesmo? Ah, sua praga, você sempre deixa curioso com as suas desistências! Escreve, escreve, escreve e por fim acaba me xingando, falando que eu sou um irritante éfe dê pê. Eu sou tão babaca e poderia ficar segurando a sua mão por duas semanas seguidas ou até quando a escatologia deixar de ser escatologia e o que sobrar for somente essa folha amassada ao lado do macaco do seu avô ou até o arrebatamento começar a acontecer ou até o dia que você decidir larga-la (a minha mão) e me mandar pra pê quê pê. Dá tudo na mesma: arrebatamento, escatologia. Seu desdém... E quando que eu vou conseguir ver a sua cara de bocó de argola? Quando vou te tirar de órbita? Que lance é aquele de corda no pescoço?

Não sei como terminar isso...

Muitos Beijos.

Ass: Seu Inferno Astral"

- Isso é ridículo, cara! - Falei, rasgando as folhas. - Não é por menos que eu pense tanto em suicídio. Além da infância horrível esse amor ingrato, essa verve vã, essa mente insana, essa saudade eterna.

- Calma!

- Calma o caralho, porra!

(Continua)

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 08/04/2011
Reeditado em 08/04/2011
Código do texto: T2895806
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