Segunda Chance

Eu tive um dia estranho hoje, e isso me fez querer compartilhar algumas coisas do meu passado, algumas coisas sobre a primeira pessoa que eu amei...

A primeira vez que eu a vi, foi como se meu mundo inteiro fizesse sentido, talvez naquela época eu não tenha me dado conta disso. E como poderia? Tinha só oito anos e era apenas um garoto rico e mimado em uma loja de brinquedos escolhendo o carrinho mais caro. Minhas roupas eram importadas, meus sapatos brilhavam e eu me sentia superior a todos os outros naquele lugar.

E então eu a vi, estava do lado de fora, olhando pela vitrine uma boneca de pano. Ela era magrela, usava um vestido sem graça, cabelos soltos e desgrenhados, alguém totalmente oposto a mim e mesmo assim, algo nela me chamou atenção. Um garoto bem menor ao seu lado puxou a barra do seu vestido e apontou para um carrinho de madeira desbotado em uma caixa, provavelmente os funcionários o haviam encaixotado para substituir por outros, mesmo assim, parecia que aquele era o brinquedo mais bonito para aquele menino.

A garota deu um longo suspiro, depois meteu a mão em um dos bolsos e tirou três moedas de baixo valor e entregou ao garoto com um leve sorriso. O menino correu apressado para dentro da loja e sinalizou para um dos funcionários o carrinho de madeira em uma das caixas, depois de pensar um pouco o homem aceitou as moedas e lhe deu o brinquedo. Um grande sorriso iluminou a face daquele garoto e um sorriso ainda maior tomou conta da menina do lado de fora.

Algo em mim naquele momento me fez perder a falar, talvez fosse o fato de que jamais presenciara tamanha generosidade ou nunca tivesse visto a pobreza realmente de perto, talvez fosse o fato de que o sorriso da garota era a coisa mais sincera e bonita que eu já vira, ou o modo como ela amava aquele garoto, eu nunca saberei, mas no mesmo instante toda a minha superioridade se foi e se instalou no lugar uma ternura pela aquela menina que mudou o que eu era com apenas um gesto.

É estranho pensar nisso agora, depois de tantos anos, mas a gente lembra pra sempre do primeiro amor e fica se perguntando como as coisas seriam se tivéssemos tomados uma outra atitude naquele momento crucial. Você quer saber se eu fiquei com ela no fim das contas não é? Gostaria de dizer que sim, mas eu era um covarde e quando finalmente admiti o que sentia pra mim mesmo, já era tarde demais.

A verdade é que ela era nobre demais pra mim e tudo que eu pude fazer foi observá-la ao longe, sempre do mesmo jeito, os anos passavam e o mundo dela se tornava mais difícil e mesmo assim, depois de todas suas provações eu ainda a via sorrir e lembro que sua risada me fazia rir também, mas eu jamais me revelei o bastante, nunca deixei que ela de fato soubesse quem eu era, eu tinha medo de que não fosse bom o bastante, mas até hoje me pergunto se tivesse comprado aquela boneca na loja da primeira vez que a vi, se isso teria feito toda a diferença, se isso teria feito de mim o homem certo pra ela.

Fiquei pensando nisso o dia todo, talvez porque as coisas ficaram inacabadas entre nós ou porque a chuva lá fora me deixou nostálgico, eu não sei ao certo, o que sei é que, seja obra do destino ou não eu caminhei a tarde toda e parei bem em frente a antiga loja de brinquedos e a encontrei lá, parada no mesmo lugar chorando. Foi a primeira vez em todos aqueles anos que eu a via assim e ela estava triste por minha causa, havia dois dias que eu dissera a ela que ia embora, que confessei ter me apaixonado por aquela garota na vitrine, mas que eu não era a pessoa certa. Eu não a deixei falar, não ouvi sua resposta, apenas parti e agora ela estava ali na minha frente em pedaços.

Eu entendi naquele momento que não existe o bom o bastante, o suficiente é aquilo que o seu coração quer e o coração dela queria a mim, isso deveria me deixar feliz e não inseguro sobre superar suas expectativas, ela não quer ter suas expectativas superadas, ela só quer que eu a ame e faço isso melhor que ninguém, o que só me faz ter certeza que a mereço, que a faço feliz e isso é bem mais importante do que todo o resto.

Então se você está hesitando mais uma vez, não deixe sua chance passar, porque o amor pode ser eterno, mas nem todas as pessoas esperam pela eternidade. Eu tive muita sorte dessa vez, mas nunca se sabe quando o destino te dará outra chance.