5° Capítulo

"Sempre vivemos nossos momentos e em cada momento, acreditamos estar vivendo o que achamos ser o que é certo... Nesse caso, o certo de hoje, provavelmente não será o certo de amanha, então devemos viver cada momento sem ter medo de errar, pois sempre haverá o amanhã para nos trazer novas oportunidades de acertar".

Hoje o dia amanheceu nublado, a noite parecia não querer passar diante de tantos pensamentos, aquele teatro não me sai da cabeça, as dançarinas, o público, as palmas, o cheiro de madeira, o som da orquestra e principalmente a garota do diário, minha mente viajou hiper ativa rodando em cada momento, em cada detalhe, como se estivesse tentando me dizer algo, mas eu não sei o que exatamente. Me levanto ainda sonolento e me jogo debaixo do chuveiro quente ainda cheio de pensamentos, me arrumo, pego os meus equipamentos e parto para o trabalho, hoje será um dia cheio, acho que isso ajudará a ocupar a minha cabeça. Chegando ao meu estúdio, minha secretaria me entrega as correspondências e entre milhares de contas, uma carta em si me chama mais atenção, um envelope perfumado e cheio de detalhes vindo daquele mesmo teatro, fechado com um lindo laço em vermelho que em um único gesto, eu o abri e vi que era dela, da garota do diário agradecendo a minha gentileza. Confesso que aquilo me trouxe uma ótima sensação, até me vi mais disposto a fotografar e dessa forma eu comecei a minha primeira sessão. Ao segurar minha câmera e focar na modelo, nada parecia se encaixar, mesmo animado, hoje parece ser mais um daqueles dias onde a inspiração parece não existir, mas nesse caso, não acho que seja isso, eu estava ansioso, com o foco em outro lugar então, tentei me concentrar, fiz de tudo para que a sessão pudesse seguir da melhor forma, mas nada mudava, nada se encaixava, minha assistente percebeu a minha frustração, mas parecia não entender, pois para ela estava tudo perfeito, o cenário, a modelo, tudo… ela tem uma visão que eu confio fielmente e ela estava certa, o problema esteja comigo mesmo, então, pedi a ela que continuasse a sessão sem mim e aproveitei então para ir ao banheiro molhar o rosto, minha mente ainda estava longe, eu precisava me concentrar. Logo iniciei a segunda sessão, mas nada mudou e a outra modelo estava linda, o lugar perfeito, mas não adianta, a minha mente estava longe e nada fazia com que ela se concentrasse então, eu fui até a minha assistente e pedi a ela que assumisse o dia para mim, que eu confiava e sabia que ela era capaz… eu precisava sair, precisava ir a um certo lugar e saber o que estava acontecendo comigo. Parti então para o Canto do Cisne e chegando lá, o mesmo segurança que havia me entregue o convite na noite passada me viu, mas pareceu não me reconhecer, talvez ele só tivesse que reconhecer o diário em minhas mãos. Ainda era dia e o lugar estava fechado, por sorte, uma das dançarinas daquela noite estava saindo de um possível ensaio e me reconheceu e assim, acabei tendo passe livre para entrar. Ao entrar no teatro, toda aquela ansiedade desapareceu, onde me senti mais calmo, com uma certa paz de espírito, não sei explicar, então me sentei na ultima cadeira e comecei a observar o lugar. Muitas lembranças da noite passada me vieram à cabeça e todas elas focavam em um só momento, uma só pessoa… Ela!

O que está acontecendo comigo? Perdi o meu foco, fugi do trabalho, até pus em xeque o meu prazer pela fotografia e agora vejo que não era isso, confesso que isso me alivia bastante, mas a verdade era um pouco assustadora, ela roubou o meu foco, ela roubou a minha liberdade de ver o mundo, onde agora minha lente e minha mente parecem estar rendidas a ela e em meio a tantas descobertas, o mais improvável aconteceu, onde sobre o palco, vi surgir aquele mesmo rostinho angelical que não me saia da cabeça e pela sua forma de olhar para as cadeiras, para o palco e para tudo ali envolta do palco, parecia mostrar que ela estava vivendo as suas próprias lembranças da noite passada, relembrando cada momento a ponto de deixar aquilo fluir e se deixar levar por alguns passos. Ela é linda, sua forma de
dançar é tão suave e ela parece viver aquilo, onde flutua sobre o palco e cada movimento dela me fascinava e em meio a esse momento tão único, o meu instinto de fotografo falou mais alto e eu estava certo, o meu foco estava mesmo nela então, peguei a minha câmera, foquei bem em seu momento e dei um click sem flash, à imagem sobre a tela digital ficou perfeita e tudo então passou a fazer mais sentido, voltei então os meus olhos para ela e a vi voar livre sobre o palco, roubando mais uma vez a liberdade da minha visão. Eu a via, enxergava, admirava e nossa, como ela era linda e a imagem apesar de linda, não fazia jus ao que eu via a olho nu, tal como pintar uma paisagem, o brilho do sol onde por mais que os traços sejam perfeitos, o brilho da imagem não brilha em nossos olhos e assim como o sol, ela brilhava sobre os meus. Logo que ela parou de dançar, eu comecei a aplaudir, minhas palmas ecoaram pelo teatro e logo os seus olhos me encontraram:

 “Quem está aí?” - Perguntou ela assustada.

Eu estava distante, ela parecia não poder me enxergar então me levantei e fui me aproximando e quanto mais perto eu chegava, mais tudo ia ganhando sentido e quando já estávamos próximos, ela sorriu surpresa, tão surpresa quanto eu pelo ocorrido então eu lhe disse:

-Vejo que a dança vive em você!
- Pois é, acho que o palco tornou-se o meu habitat natural, me faz sentir viva de muitas formas.
-Nossas vidas só fazem sentido diante de quem amamos ou do que amamos fazer, não é mesmo?
-È verdade, é o que eu ando descobrindo – Ela sorriu! – Mas… O que faz por aqui?

Quando ela me perguntar isso, procurei ser cauteloso em minhas palavras, até porque, eu mesmo ainda estava confuso, então procurei ser sincero, mas não me entregar assim de cara:

-Difícil dizer, na noite passada eu fui trazido pelo acaso, mas por algum motivo, esse lugar não me saiu da cabeça. Algo aqui me fez querer voltar e eu tinha que vir aqui descobrir o que era e confesso que te ver no palco novamente, foi uma grande surpresa pra mim, eu não esperava encontrá-la tão cedo.
-Sei bem o que quer dizer com “grandes surpresas”, no fundo eu achei que estaria sozinha por aqui, vim, pois gostaria de um momento a só para poder refletir, mas acabei encontrando uma das meninas que já foi e agora você.

Nesse momento eu me senti um grande penetra, isso só me faz perceber que ela não compartilha dos mesmos pensares que eu, não sei por que eu me surpreendi com isso:

-Bom, deixarei que faça o que veio fazer, espero que você tenha a mesma sorte que eu.
-Sorte?
-Sim, eu disse que existia um motivo que eu ainda não sabia, e que me fez voltar aqui…
-E já o descobriu?

Olhei em seus olhos e já cheio de certeza eu respondi:

-Sim, já não tenho dúvidas!
-E qual seria?

Eu não sabia o que dizer, não sei como ela reagiria a minha resposta então, lembrei da imagem que eu tirei a pouco, tirei na impressão rápida da câmera e a entreguei em mãos esperando que ela em algum momento soubesse a resposta. Após isso eu parti em direção a porta, peguei o primeiro taxi que apareceu e voltei para o meu estúdio sem saber se era a atitude correta, mas eu já não sei mais o que é certo ou errado.


 

                                      6° Capítulo
                                                                
                                              
 (Querido diário)



"Passamos boa parte de nossas vidas lutando contra os nossos medos, mas a questão é: Até onde eles interferem em nossos sonhos?
Até ontem o meu medo quase me impediu de realizar o meu grande sonho, onde ao subir no palco e dançar, foi mais que um espetáculo, mais que uma arte... Subir no palco ontem sem aquela sensação de agulhadas na língua, falta de ar e tontura, foi uma sensação de libertação, eu finalmente sinto que tenho o controle sobre mim".


Hoje o dia amanheceu nublado e com previsão de chuva, mas nada vai me impedir de ir visitar o tumulo de meu pai, preciso de alguma forma compartilhar com ele esse momento tão especial. Mesmo após a sua partida, nunca deixei de lhe contar tudo, ou de conversar com ele e eu sei que esse momento significaria muito para ele também. Seu sonho sempre foi poder me ver dançar no Canto do Cisne, ele sempre acreditou que eu fosse capaz e se tem algo que eu aprendi com ele, é jamais desistir de nossos sonhos e o meu sonho foi o seu sonho, e o nosso sonho eu consegui realizar. Sei que não devo parar por aqui, outra coisa que ele sempre me ensinou, é que devemos sempre buscar o melhor e nunca nos acomodarmos diante de cada conquista, o Canto do Cisne fora um grande passo é verdade, mas de acordo com ele, um grande passo sempre é seguido de outro grande passo e assim devemos caminhar sempre… "meu pai, meu herói". Antes de visitá-lo, passei no correio, eu não sabia como agradecer o rapaz que me trouxe o meu diário de volta, então lhe fiz uma carta de agradecimento, confesso que eu não sabia bem o que dizer, tantas as folhas rasgadas, tantos agradecimentos em meio a pensamentos, eu nem sabia se ele iria realmente ler, então procurei ser mais objetiva na carta e após isso, parti para o meu objetivo. Chegando ao cemitério, meus olhos logo lacrimejam, pois o portão sempre me faz lembrar o dia em que ele fora enterrado, um dia que eu jamais vou esquecer. Já de frente ao seu tumulo, faço o sinal da cruz e lhe entrego um ramo de tulipas junto a uma carta, como de costume. Abro minha bolsa e tiro a sapatilha que eu usei para dançar no grande dia, quero que fique em seu tumulo, como um sinal de agradecimento e de missão cumprida. Logo junto ao vento gelado, como já previsto, senti em minha face, a chuva se iniciando e a garoa gelada parece não ser capaz de esfriar o calor das minhas lágrimas e assim eu me despeço de meu pai.



Confesso que não estou muito afim de ir para casa, ao menos não agora, preciso de um momento a só e provavelmente minha mãe irá falar aos montes em meu ouvido por ter vindo aqui sem ela então, ao invés de ir pra lá, decido ir direto para o Canto do Cisne, de repente aquele lugar passou a ser o meu refugio… quem diria. Ao atravessar a porta, o silêncio logo me chama atenção e para a minha surpresa, vejo descer do palco uma das meninas que dançara comigo naquela noite tão especial… Ela notou que os meus olhos estavam meio lacrimejantes e quis saber o que houve. Lhe contei assim meio por cima sobre o meu pai e em meio a isso, ela me abraçou forte, me oferecendo companhia, mas a real é que eu queria ficar só e ela percebeu isso então, logo se despediu. Ao subir no palco, muitas boas lembranças ainda recentes sobre aquela noite… e pensar que naquele momento havia milhares de pessoas me vendo dançar, ainda quase que posso ouvir o som dos aplausos após a apresentação… de repente aquilo me fez querer dançar então, arrisquei alguns passos me deixando levar pelo momento, meus pés em contato com o piso de madeira ecoou sobre o teatro e o palco que me causava pânico, hoje passou a me trazer uma sensação boa, uma certa paz que me faz sentir livre e ao mesmo tempo me trás a imagem de meu pai. Logo que parei com os passos, pude ouvir de longe o som de aplausos, aquilo fez meu coração apertar e me deixando levar pelo momento falei baixo:

 “Pai?”

O som dos aplausos continuava e bem lá no fundo, quase na ultima cadeira do teatro, era possível ver uma pessoa, que se levantou e que cada vez mais se aproximava:

Quem está aí? – Eu perguntei.

A cada passo a sua imagem ia ficando mais clara e logo eu tive uma grande surpresa… era ele, o rapaz gentil que achou o meu diário, mas o que ele estaria fazendo por aqui?

-Vejo que a dança vive em você! – Disse ele sorrindo.
- Pois é, acho que o palco tornou-se o meu habitat natural, me faz sentir viva de muitas formas.
-Nossas vidas só fazem sentido diante de quem amamos ou do que amamos fazer, não é mesmo?
-È verdade, é o que eu ando descobrindo – Eu sorri. – Mas… O que faz por aqui?
-Difícil dizer, na noite passada eu fui trazido pelo acaso, mas por algum motivo, esse lugar não me saiu da cabeça. Algo aqui me fez querer voltar e eu tinha que vir aqui descobrir o que era e confesso que te ver no palco novamente, foi uma grande surpresa pra mim, eu não esperava encontrá-la tão cedo.
-Sei bem o que quer dizer com “grandes surpresas”, no fundo eu achei que estaria sozinha por aqui, vim, pois gostaria de um momento a só para poder refletir, mas acabei encontrando uma das meninas que já foi e agora você.
-Bom, deixarei que faça o que veio fazer, espero que você tenha a mesma sorte que eu.
-Sorte?
-Sim, eu disse que existia um motivo que eu ainda não sabia, e que me fez voltar aqui…
-E já o descobriu?
-Sim, já não tenho dúvidas!
-E qual seria?

Nesse momento diante da minha pergunta, ele me olhou de uma forma que eu não sei explicar, tirou então de sua câmera uma fotografia e me entregou, abriu um sorrido e seguiu em direção a porta. Ao olhar para a imagem, eu tive uma surpresa, era uma imagem minha, um momento em meio à dança que eu acabara de fazer, mas o que isso quer dizer? Quando voltei meus olhos em sua direção, ele já não estava mais lá, então corri pelo vão entre as cadeiras e ao sair pela porta, ele já havia sumido. Ainda intrigada, caminhando de volta em direção ao palco, fiquei observando a imagem, o foco era exatamente eu, como se o objetivo fosse esse mesmo… eu, nesse caso, ele não veio pelo teatro… Apos pensar bastante, eu cheguei a uma conclusão que pareceu a mais sensata e sozinha acabei pensando alto:

“Nãoo!!! Será?!”

 

                                    7° Capítulo

              Bem me quer ou mal me quer? Uma questão se faz presente
                   Fantasias que criamos, em uma brincadeira inocente
                      Numa pétala que cai, uma esperança, uma ilusão
                      Brincar de dizer verdades, brincar com o coração

          

O taxi me deixa em casa, mas meus pensamentos ainda me mantêm naquele teatro em meio a dúvidas sobre ela, sobre mim… sobre nós. Uma taça de vinho para acalmar e adoçar a mente, no meio da sala o piano que há tempos não toca uma nota sequer, então eu acendo a lareira a sua frente e dedilho de leve algumas notas nostálgicas, que me fazem reviver momentos e sentimentos de outrora. Lembro de me sentar aqui sempre que eu queria ficar sozinho, quando me sentia sem rumo, precisando de respostas… Acho que chegou a hora de re-viver o meu divã pessoal.

– Respiro fundo, um gole no vinho: “Já perdi meu foco por algumas vezes, mas nada que se compare a isso”.

– “Minha mente da voltas e mais voltas me trazendo o seu sorriso, os brilho dos seus olhos e sua voz doce e tão calma”.

– “Em cada nota sou capaz de ver e sentir cada passo seu, movimentos delicados, sutis e envolventes.”

– “O aroma do vinho me trás o seu perfume, o seu calor, a sua presença.”

Logo o clima é quebrado em meio ao “mi” desafinado, me trazendo de volta as incertezas e a leveza do copo já vazio. Então me levanto espalhando a roupa sobre o chão e logo deixo que a água fria do chuveiro esfrie os meus pensamentos. Logo deitei o corpo já cansado sobre os lençóis e não demorei muito para viajar em sonhos. O dia amanheceu nublado e sem inspiração alguma, ao menos eu não estava focado no trabalho, então, mais uma vez pedi para que minha assistente cobrisse o meu dia, ela tentou falar algo comigo, mas acabei não dando muita atenção, definitivamente eu não sei o que está havendo comigo. Pela primeira vez durante anos eu saí por aí sem minha câmera em mãos, confesso que a sensação é estranha, acho que se eu saísse sem uma de minhas pernas, eu não me sentiria assim tão desconfortável. Além de minha companheira, ela também me traz confiança e não deixa eu me sentir assim tão comum em meio às pessoas a minha volta. Diante de tantas sensações e reflexões, acabei me deparando com uma nova realidade, onde sem a minha câmera, eu pude perceber um mundo sem divisão de foco, onde em um único olhar, eu percebi ser capaz de captar diversas verdades, diversos horizontes, diversos caminhos, diversos mundos num só momento como se tudo fosse se completando, tal como slides que iam se somando resultando em movimentos e tudo ia fazendo cada vez mais sentido, tudo ia tomando seu rumo e apesar de uma imagem gravar um momento, ela apenas capta um passo em meio a um imenso caminho, como passos de danças que antes eu enxergava passo a passo e nesse momento, vejo a dança se deixar levar pelo seu ritmo natural. Diante disso tudo, eu senti a minha confiança voltar onde tive uma crise de riso incontido onde a liberdade se fez presente e a brisa beijou a minha face, enchendo os meus pulmões e me trazendo a sanidade e a inspiração de volta.

Logo voltei para o estúdio, onde me deparei com um olhar meio tristonho da minha assistente, ela parecia saber de algo, mas não sabia como me dizer então, ela apenas disse que meu chefe queria falar comigo e pelo visto há muito tempo e era isso o que ela tentava me dizer. Ao entrar em sua sala, fui recebido por sua séria expressão, onde ele procurou ser direto ao me dizer que meus trabalhos já não eram mais necessários em sua empresa. Parece que a minha assistente esteve fazendo um bom trabalho enquanto eu estava preocupado demais em não trabalhar, por um lado eu fico muito feliz por ela, ela sempre foi muito aplicada e talentosa, por outro, eu estava desempregado, mas por algum motivo aquilo não me abateu, toda aquela descoberta mexeu muito comigo, eu precisava mesmo de um tempo só para mim, viajar talvez. Ao atravessar os corredores do estúdio, pude ver ela com um olhar lacrimejante quase como se estivesse se culpando por algo, então eu me aproximei e lhe dei um forte abraço e a parabenizei. Meu cargo estava em ótimas mãos, ninguém além dela seria capaz de seguir os meus passos e ela dava um traço a mais que completava tudo, como a cereja que faltava e esse era o caminho dela e eu estava encontrando o meu. Uma sensação de liberdade estava me tomando e eu não queria ir para casa, ao menos não ainda, aquele teatro ainda estava em minha mente, então, peguei a minha câmera e decidi ir pra lá. Ao entrar no teatro, percebi que o lugar me faz bem, o cheiro de madeira me trás uma certa paz, as cores envelhecidas parecem querer contar cada historia ali vivida… incrível isso. Conforme fui andando pelos corredores, ia admirando cada detalhe, tudo era tão detalhadamente bem feito e ao olhar para o palco, me veio em mente algumas lembranças dela dançando, breves flashs mesclando entre toda a magia da dança e a beleza do palco vazio… Enquanto Viajava em cada detalhe, nem me dei conta do caminho que percorri e quando dou por mim, percebo já estar sobre o palco, onde o chão é mais liso, bem cuidado e a sensação dos pés pisarem sobre ele é ótima. Continuei andando e já nos bastidores, me deparei com um mundo cheio de cores, cenários, figurinos e uma das roupas me chamou mais atenção, nada me faria esquecer aqueles detalhes, era a roupa dela, me fazendo relembrar cada momento seu sobre o palco. Logo algo mais me chamou atenção, onde sobre uma imensa lona azul, pude ver algo que pareciam teclas mesclando entre brancas e pretas e ao tirar a lona, me deparei com um lindo piano onde ao dedilhar algumas teclas, pude perceber que a sua afinação estava impecável e o “mi” cantando como nunca antes… meus dedos deslizavam sobre as teclas e cada vez mais me convidavam a tocá-las e quando eu dei por mim, eu já estava em meio a uma canção que eu mesmo havia composto a algum tempo.

 
 
                              8° Capítulo

"Às vezes antes mesmo de viver algo, procuramos já enxergar o seu desfecho, talvez uma forma de mantermos o foco no final feliz e assim o moldarmos ao caminho que trilhamos hoje. É preciso viver o caminho, sentir cada momento, viver o que temos para viver… o fim chegará e o que tiver que ser, será".



Toda aquela duvida me acompanhou no caminho de volta pra casa, ainda não consigo acreditar que esse seja o real motivo que o levou até lá e porque eu não consigo parar de pensar nisso? Já em casa, esperando um sermão daqueles da minha mãe, sou surpreendida pelos seus olhinhos brilhando junto a uma expressão sorridente e ainda sem entender o que estava havendo, pude ver em suas mãos uma carta já aberta que logo ela me entrega toda ansiosa. Ao que parece era para mim, mas vejo que ela não hesitou em abri-la e pelo visto, eram boas noticias. De fato o era, na verdade uma excelente noticia, minha professora de dança havia dito que haveria pessoas importantes assistindo ao espetáculo, mas eu estava tão concentrada na dança, que eu acabei me esquecendo de tudo isso na hora, talvez tenha sido melhor assim, não sei como eu teria lidado com mais essa pressão e outra, eu só dançava para uma pessoa naquele momento, para o meu pai. Ao que parece, um olheiro estava no Canto do Cisne no dia do espetáculo e parece ter gostado muito do meu trabalho… na carta havia um convite a um sarau, onde seriam selecionadas dançarinas para um grupo muito conhecido mundialmente chamado “Plume”, que inclusive eu e meu pai sempre assistíamos juntos pela TV… era o segundo passo, um passo adiante ampliando os horizontes do meu sonho. Passei a noite em claro pensando em novos passos, figurinos, em tudo, pois dessa vez só dançar não será o bastante, dessa vez eu terei que voar. Logo o dia amanheceu nublado e eu em meio à ansiedade, eu mal consegui tomar café, corri então para o teatro para contar a novidade para a minha nova professora e também para lhe pedir conselhos, pois ela já havia feito muitos saraus e isso lhe trouxe muita experiência. Apesar de tudo eu me sinto confiante, assim que cheguei, ela parecia já saber da noticia, parece que minha mãe foi além de abrir a carta antes de mim, ela não tem jeito mesmo. Fui recebida com um forte abraço e conforme eu ia falando, ela foi sentindo toda a minha segurança e pareceu surpresa com isso. De repente vi sair do camarim uma das dançarinas que fez parte do espetáculo junto a mim, aquela mesma que me abraçou toda preocupada comigo… Dessa vez era ela que parecia triste, foi então que minha professora me disse que ela não havia sido chamada para o teste, então, fui até ela para de alguma forma lhe dar uma força, mas ela não parecia disposta a falar comigo, onde deixou bem claro que ela merecia muito mais que eu essa oportunidade. Tentei entender o lado dela, que estava triste com tudo aquilo e eu sei que ela também batalhou muito por isso, então deixei que ela partisse em meio ao meu silencio. Logo eu e a minha professora voltamos ao assunto em questão e juntas nós trocamos muitas idéias sobre passos e figurinos, mas algo que ela disse, confesso que me assustou um pouco. O “sarau Plume” como ela gostava de dizer, era feito de uma só apresentação e mesmo que apenas um teste, era conhecido também por grandes apresentações super produzidas e nada poderia ser copiado, ou seja, além de dançar, eu teria que achar uma melodia, o que nos fez ter uma boa idéia para apresentação, uma dança em meio ao som de um piano, o problema era achar um pianista e mesmo que eu ache um, o cachê de um bom pianista é uma fortuna. Em meio a pensamentos a procura de uma solução, o improvável acontece, de repente era possível ouvir o som de um piano tomar conta do teatro, uma bela canção suave e ritmada, era perfeita e logo vi nos olhos da minha professora que juntas tivemos a mesma idéia. No teatro havia um piano e alguém o estava tocando, então, corremos de encontro a ele e nesse momento, eu quase caí pra trás… não era possível, era ele mais uma vez, o rapaz do diário… ele estava ali, tocando o piano de uma forma incrível, como se não houvesse nada nem ninguém a sua volta.



(Continua...)


(Sujeito a mudanças)

(Felipe Milianos)

Imagem via google.devian/Milianos


Felipe (Don) Milianos
Enviado por Felipe (Don) Milianos em 13/03/2011
Reeditado em 13/03/2011
Código do texto: T2846218
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.