RECORDAÇÕES DA VIDA

Joana escontrava-se sentada a uma pequena mesa de junco, que havia no imenso terraço daquele antigo casarão. As paredes bastante açoitadas pelo tempo, ainda deixavam perceber o amarelo que as cobria. Do alto podia-se ver o pequeno movimento de antigos escravos que ainda viviam naquelas terras. O casarão apresentava ainda aquele cenário antigo da época da colonização brasileira. O terraço possuía aparapeitos e muitas redes armadas ao seu redor.

Joana descansava e fazia sua cesta naquela tarde sombria e um pouco melancólica. Clotilde chegara a sua frente, para servi-lhe o café, já de costume naquela época. Joana sentia-se um pouco sozinha. Há algum tempo o casal de filhos havia partido para a cidade grande, com o intuito de se dedicarem aos estudos da medicina.

Senhor Florindo, senhor respeitado naquela região, pensativo se encontrava ao olhar aquele início de tarde, sentado numa espreguiçadeira, ao lado de sua querida Joana.

_ Hoje, sem as crianças, a fazenda carece de alegria!

Senhor Florindo toma as mãos de Joana e as beija com carinho.

_ Hoje, temos a recordar nossos velhos tempos que somente se repetem de vez em quando, na visita esporádica de nossas crianças.

Mas Joana contemplava os jardins, onde cultivava diversas espécies de rosas e orquídeas. Para ela esse era seu passatempo predileto.

Senhor Florindo, sempre atualizado das notícias trazidas por um fazendeiro vizinho, filho de seu inesquecível amigo, que já partira para a eternidade, cuidava das terras e do gado deixados por ele. Virgílio, era assim que se chamava, morava na capital, mas sempre ia à fazenda, e trazia-lhe novidades da vida e dos costumes da cidade grande.

Senhor Florindo também cultuava os velhos livros de romance e poesias, o que tanto admirava e o tornava romântico e carinhoso. Tinha em seu semblante uma pureza de sentimentos e uma enorme alegria de viver. Sempre muito bem humorado, tomava Joana aos seus braços, que se recostava em seu ombro, calidamente escutando as poesias de Castro Alves.

Já era final de tarde. No céu, as estrelas cintilavam timidamente, como que a fazer parte daquela felicidade. Aquela noite não era de lua. Apenas clareava-se pela clareira, que também ajudava a aquecê-la e, pelos candeeiros, que de costume se encontravam pendurados por toda a casa.

Para a leitura, Senhor Florindo usufruía-se da ajuda de um velho candeeiro, que ainda guardava de lembrança de seus queridos pais.

A noite se adentrava e aos poucos se percebia que a vida se recolhia num imenso silêncio. Era costume deitar-se cedo e Senhor Florindo, mais uma vez, tomara as mãos de Joana para recolherem-se em seus lençóis macios, devidamente cuidados por Josefina, mucama (criada), que a criara desde os seus primeiros anos de vida.

No silêncio, por toda a madrugada, uma sensação de vida, união e felicidade. Uma lição dos tempos, onde sem a tecnologia da modernidade, a vida, embora resumida em afazeres domésticos corriqueiros, era bela, tranqüila e prazerosa.

O dia ressurgia mais uma vez. Quantas saudades trago em meu peito. Recordações de muito longe, recordações dos tempos que não voltam mais, recordações de uma grande vida a dois e de um grande e verdadeiro amor.

Mas, recordações!

Apenas recordações!

_ Quem dera poder revivê-las!

_ Não mais como recordações, mas como vida presente, vivida hoje, em realidade!

01/11/1999

4:53 AM

Elizabeth Oliveira
Enviado por Elizabeth Oliveira em 27/02/2011
Reeditado em 27/02/2011
Código do texto: T2818369
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