Espuma do mar

Estávamos os dois na grade da proa do navio e o vento frio batia-me no rosto. Ela ficava ali olhando o mar e o céu, enquanto o navio avançava. Cachos loiros ao vento e o seu rosto corado pelo frio, os olhos castanhos refletiam o reflexo do céu negro no mar.

E os olhos negros dela olhavam para o nada. Eu via a madrugava inteira naqueles olhos fixos no espaço, cálidos, quietos e compassados... com um compasso de zero-por-zero

- Não é incrível?- falou sua voz doce atravessando o vento- Não é lindo a forma como um céu sem estrelas e um mar sem espumas podem se igualar? Chega um momento em que já não se percebe, se está flutuando no vendo ou navegando no mar.

- Verdade..., já não se sabe mais, mas espero que isso seja água e não cosmo.

- E por quê?- ela parecia falar com a água

- Ora, porque não se pode navegar no céu.

Ela virou levemente o rosto para mim e perguntou:

- diz isso por que já tentou?

- Não.

- Então não me pode dizer nada – e voltou a fitar o infinito.

O chiado da água do mar era intenso quando algum se calava.

Eu a olhava fascinado. Queria tocar naquela pele aproximar-me mais um pouco. Para suplicar que me deixasse tocar.

As mãos dela seguravam o ferro frio do parapeito da proa, então , lentamente eu fui aproximando meus dedos dos seus, até quase tocar. Ela viu o movimento olhou pra mim e disse:

- Por que insiste em fazer isso? Sabe que o tempo não volta.

- Você já tentou voltar?

Ela abaixou a vista e olhou para a minha mão com uma expressão pesarosa, falando:

- Eu sou a volta e você deveria parar de tentar...

- É a única forma... de me sentir completo de novo

- Não... isso é só um jeito de te arrancar sempre mais um pedaço.

- Então escolho ser eternamente dilacerado.

A tristeza dela parecia estar maior a cada palavra minha. Deu-me um sorriso triste e fraco quando tentei tocá-la e senti-la, vendo aquela forma tão perfeita se esvaindo igual fumaça, com um cheiro de água e sal.

Eu não cheguei a sentir nada alem do cano gelado onde sua mão estava. Continuei segurando para me apoiar ali com lagrimas nos olhos, levantei a visão para ver o horizonte homogêneo de sombras e fiquei olhando o mar

Há quanto tempo não te tenho, meu amor. Já não tenho certeza, olhando para o infinito como você olhava, se voas pelo céu ou se ainda jaz no fundo do mar.