O TEU SORRISO... (17/08/2005)

“Quarta-feira, 17 de agosto de 2005, 03:45 hs.

Os sonhos são uma bela merda.

Alguns são tão aterradores, tão cruéis, que, no desenrolar daquela trama macabra, chegamos a um ponto em que morrer parece a única saída. Uma sucessão de tragédias que devora todas as coisas importantes em nossas vidas. Sem elas, percebemos que o cotidiano tranquilo e seguro simplesmente desceu pelo ralo, esvaiu-se, e preferimos, então, a morte. Claro que este sentimento nada mais é do que um simples pensamento-reflexo, o qual, após despertarmos suando e ligando todas as luzes, some com a mesma instantaneidade com que apareceu. Então, sentamo-nos na cama e tateamos o corpo à procura do buraco do projétil disparado instantes atrás, ou ligamos para os parentes, no meio da madrugada, para saber se tudo está bem. E a vida vai voltando, tão doce e saborosa como nunca antes.

Outras vezes, no entanto, a situação é contrária: em uma noite qualquer, despretensiosamente, ressurge aquela inesquecível e perfumada paixão da juventude, e o corpo velho é substituído por outro, novinho em folha, pronto para tudo. Algumas vezes a gente se torna até jogador de futebol, e a cama espaçosa fica estreita para tantas jogadas e tantos gols. No ápice da delícia, acordamos, com um sorriso no rosto, mas odiando o cachorro desgraçado que late sem parar e nos tirou daquele lugar para o qual não se pode mais voltar, não importa o quanto se mentalize, o quanto se esforce... O momento passou; aquele espaço mágico não existe mais.

Sonhos bons, sonhos ruins...

Se você me perguntasse, eu lhe diria que, particularmente, prefiro os ruins. Por mais assustadores que sejam, sempre que estou instalado em um deles penso, esperançoso, que chegou a minha vez. Já os sonhos bons são um ultraje, um deboche descarado, pois nos fazem pensar que as coisas são boas e agitadas como nos tempos da juventude, e então, subitamente, somos atirados de volta nesta vida doente e senil.

Imagino que, lá em cima, exista uma criança que, entediada com as maravilhas do Paraíso, se diverte embaralhando destinos e vidas pelas madrugadas afora. Espero, realmente, que ela esteja se divertindo bastante, pois eu não estou.

Desculpe a franqueza, companheiro, mas não vou escrever um estúpido diário. Não sou um maldito adolescente. Amanhã digo umas verdades para aquele médico de araque.