Meia Noite

Meia-noite. Olho para o lado e lá está ele, dormindo feito uma criança inocente.

Viro para o outro lado, tento voltar para o sono mas os pensamentos que flutuavam pela minha mente não permitiam.

Lembro de anos atrás, no inicio do nosso casamento. Era uma maravilha, tudo era um mar de rosas. Senti saudades daquele tempo em que saíamos todo final de semana, quando jantávamos fora ou íamos ao cinema, ou quando simplesmente caminhava-mos de mãos dadas pelo calçadão.

Com o tempo a relação foi esfriando, o último ano empurramos com a barriga. Não dá mais pra negar, estamos nos afastando um do outro. Nosso casamento está chegando ao fim; ou já chegou e não queremos aceitar esse fato.

Raramente jantamos juntos ultimamente. Ele trancado no escritório, ocupado com as papeladas da firma e eu refugiada na copa, corrigindo provas e trabalhos dos meus alunos.

Vou beber um pouco de água.

Caminhando pelo apartamento lembro de tudo o que conquistamos juntos, começar pelo próprio apartamento. Nosso tão sonhado apartamento em Copacabana. Desde o nosso noivado fazíamos planos, éramos cheios de sonhos e projetos para o futuro.

Conseguimos tudo: a viajem para a Europa, carros independentes, Reveillon no Hotel Marina, compra de ações da Petrobrás.

Pensando bem, conseguimos quase tudo. O filho que planejávamos desde o início do namoro não veio. Descobrimos que eu era estéril. Queríamos uma criança nossa, fruto do nosso amor, então decidimos não adotar nenhum filho.

Um ato de egoísmo, agora penso eu. Poderíamos muito bem amar uma criança adotada com se estivesse saído de nós.

__ Mas nunca vai ser a mesma coisa!__ dizia ele.

E eu, boba. Com medo de iniciar uma crise num casamento tão bem sucedido assinava embaixo.

Chegando na cozinha, lembro das tardes de Domingo, em que minhas primas do Méier vinham nos visitar.

Adorava os elogios que faziam sobre nosso apartamento e sobre nossa vida tão bem sucedida.

Eu professora desde os 18 anos, lecionando numa escola em Botafogo. Ele sócio numa firma de Advocacia no Centro da Cidade.

Orgulhava-me de ser a única da família a morar na Zona Sul, de frente para a praia. Esse é o sonho de quase todo carioca.

Na geladeira, o casal de noivos de porcelana do nosso bolo de casamento. Tão apaixonados.

Foi mágica aquela noite. Prometemos diante do padre sermos fiel um ao outro acima de qualquer circunstância.

Eu sempre fui fiel a ele. E ele? A quase dois anos não fazemos amor. Ele não ficaria tanto tempo sem sexo. Me trai com certeza. Porque eu não faço o mesmo, porque não pagar com a mesma moeda? Não! Prometi diante de Deus e dos homens ser fiel a ele até que a morte nos separe.

Até que a morte nos separe? Acho que não esperaria tanto tempo assim. Me separaria antes.

Lembro da nossa lua de mel em Fernando de Noronha. Fizemos juras de amor. Ele prometeu me fazer fiel para o resto da vida, e eu disse o mesmo.

Porque não cumprimos o que prometemos? Acho que temos vocação para a política. Pelo menos no quesito “Prometido e não cumprido” já temos.

Volto pra cama. Ele continua dormindo. Tão calmo, tão sossegado. Porque me aflijo com todos esses pensamentos? Acho que não quero que nosso casamento acabe. O que fazer então?

Já sei! Quando levantarmos, a primeira coisa que vou dizer a ele:

__ E aí, vai querer continuar?

Se ele quiser a gente revê tudo o que está errado e recomeça casamento renovado, desta vez com um filho adotado. Se não quiser, o divórcio será a melhor solução. Continuo minha vida e adoto meu tão sonhado filho.

Igor P Gonçalves
Enviado por Igor P Gonçalves em 09/01/2011
Código do texto: T2719114
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