A COBRADORA DE ÔNIBUS
1972. O jovem estudante do 2º. Ano colegial tinha 16 para 17 anos. De família humilde, teve uma pré-adolescência sofrida e conturbada, pois perdera a mãe aos 12 anos. Nunca havia namorado. O máximo que fazia, todas as tardes, após as aulas, era dar voltas de bicicleta pela Rua 10, para se emocionar com um “oi” da mocinha que ele nunca chegou a conversar. Como nunca havia conversado, após a missa dominical, com a moça que ele escolhera para ser a futura mãe dos seus filhos, tão apaixonado estava, até o dia em que a viu com outro rapaz. Para ir da Vila Anastácio, da Escola Alexandre Von Humboldt, onde estudava, até a Vila Nossa Senhora do Retiro, em Pirituba, onde morava, tinha que atravessar o Rio Tiete, cruzando uma ponte de tambores flutuantes, amarrados uns aos outros, até que construíram a Ponte do Piqueri. Então o ônibus começou a fazer ponto em frente à escola. A primeira vez que ele a viu, não deu importância alguma, todos já falavam das mulheres que trabalhavam como cobradoras de ônibus. Mas na segunda, terceira, quarta e tantas outras vezes, os olhares se cruzaram. Ele não tinha plena certeza de que eram direcionados somente a ele, afinal de contas ela estava em trabalho, e bem poderia estar observando outros passageiros. Mas o garoto não se continha, perdia propositadamente o ônibus anterior, menos cheio de passageiros, para esperar o ônibus da cobradora de seus sonhos, sempre mais cheio. E a ela dirigia toda a sua atenção, durante a viagem, procurando um lugar estratégico para observá-la dos pés à cabeça. Incomodava-o a caixa de recebimento e troco, atrás da qual ela se escondia, além dos engraçadinhos que perguntavam o que já sabiam. Porém, o momento fantástico e mágico acontecia quando ele passava na catraca, entregava seu passe escolar, dizia um breve e suspirante “oi” para a também jovem cobradora, e, olhando no fundo dos seus olhos – coração palpitando a mil - se deliciava com a resposta de sempre. Sem palavras, apenas outro “oi”. Um dia, porém, ele criou coragem, e junto com o passe escolar ele lhe entregou um bilhete, de uma linha só: “você é linda”. Nem ficou sabendo se o bilhete foi lido, o ano letivo acabou e a cobradora nunca mais voltou.