O MELHOR AMIGO
O MELHOR AMIGO
Julinho foi à feira com sua mãe e lá ganhou um pintinho amarelo, que resolveu chamar de chicken little. Ele ficou muito feliz com o presente e passava quase todo o dia em companhia da pequena ave de estimação, a quem dedicava carinho especial, enquanto o pobre animal se lamentava, grande parte do dia, por insistentes piados, na tentativa de chamar os da sua espécie, o que só deixava de fazer quando se recolhia à caixa de sapatos improvisada para ele passar a noite, que ficava sob a cama do menino. O animalzinho era preocupação constante do Julinho, procurava por ele quando acordava, (geralmente a sua mãe levava o pintinho para o quintal logo que amanhecia), quando voltava da escola e toda vez que saia de casa por qualquer motivo. Nessas ocasiões, a primeira coisa que fazia era verificar se estava tudo bem com a avezinha. Quando o chicken little cresceu mais um pouquinho, e começou a perder a coloração amarela, o pai de Julinho construiu um cercadinho no quintal, juntinho à janela do quarto do menino, porque a ave não ficava de forma alguma dentro da caixa de sapatos e todas as manhãs, bem cedo, começava a piar perturbando o sono da família.
Tornando-se um frango, ficava solto no quintal e, não tardou, transformou-se num belo galo com as penas do rabo de diversas cores, predominando o verde-azulado. Era, de fato, o melhor amigo de Julinho e lhe acordava todos os dias pela manhã, quando entoava o cocoricó junto à janela do seu quarto. Dizem que as aves e os outros animais não pensam como a gente, mas aquele galinho sabia a hora de acordá-lo. Feito o serviço, ficava esperando que o menino abrisse a janela, lhe dedicasse um sorriso bem grande e lhe dissesse: “Bom dia meu amiguinho!” Depois disso ele ia ciscar, feliz da vida, lá no fundo do quintal à cata de pequenos insetos e minhocas.
Ele dormia empoleirado num arbusto perto da janela do quarto do menino e, quando chovia, se abrigava sob o telhado do barraco construído no quintal para guardar as tralhas da família. Não piava mais, já era um galo adulto e o Julinho descobriu que, quando ele não estava em casa, o bicho saltava sobre o muro ficava no quintal do vizinho, que fazia divisa pelos fundos com o terreno da sua casa, cujos moradores criavam galinhas. A família do vizinho também tinha um menino que regulava em idade com o Julinho e era, inclusive, um de seus colegas na escola. Acertaram que o chicken little poderia circular à vontade pelo quintal deles, autorizado pelo pai do garoto que, segundo ele havia dito, parecia um galo bem melhor do que o deles para dar conta da galinhada. Quando o Julinho ia para a escola despedia-se do seu melhor amigo, que levantava a cabeça, esticava o pescoço, batia as asas e soltava em terno cocoricó, como se lhe dissesse: “Vá estudar direitinho e volta logo pra me fazer companhia”. Só então voltava a ciscar ou logo alcançava o muro. Assim, seguiu a amizade até que o galinho morreu de velhice. Julinho já estava com dezessete anos.
Após a morte do chicken little, Julinho ganhou um cãozinho, que ele chamou de Poli. Pelas características do novo animal de estimação, este tinha relação mais íntima com ele, eis que circulava pelo interior da casa e passeava na rua com o amigo. Por isso pode, após se tornar adulto, continuar a dormir no quarto do companheiro, o que favoreceu o fortalecimento da amizade entre eles. Com o cachorro ele fazia certas brincadeiras que não poderia praticar com o galo. Era seu confidente, ouvia calado todas as suas lamentações e manifestações de alegria. Tinha certeza que o animal o compreendia, porque sempre respondia com um abanar de rabo, um latido ou ganido, e logo o animava com brincadeiras que faziam que ele esquecesse aquelas coisas que não teriam grande importância dali há alguns meses. Foi ele que soube da primeira namoradinha no colégio, do primeiro beijo, etc.
Poli, chamava-o assim, porque ele valia muito, era tudo, um dia também o deixou e ele ficou novamente sem o melhor amigo. Julinho tinha vinte e sete anos quando ele se foi. Encontrou, então, na figura do seu pai, aquele que seria dali pra frente o seu melhor amigo. A relação pai e filho tomou uma força muito grande, tornaram-se inseparáveis. Nada melhor do que ser o melhor amigo do seu pai. Como não tinha percebido isso antes?
Julinho casou-se com trinta anos, e aos trinta e dois teve o primeiro filho. Mas a amizade com seu pai continuou firme e fortalecida, eram ainda carne e unha. Depois do nascimento do filho, eram os três: Julinho, Raul, o seu pai e Fabiano, o filho.
Mas a morte, mais uma vez levou o seu melhor amigo. O seu pai faleceu quando ele estava com quarenta anos. Ele, parecia, estava fadado a ver os seus melhores amigos morrerem. O último morreu em seu braços. Mas a amizade com seu filho, na época com oito anos, cresceu, também muito forte. Estavam sempre juntos, torciam para o mesmo time, tinham os mesmos gostos, estavam sempre juntos. Fabiano dormia todos os dias com a cabeça nas pernas do pai, no sofá da sala, que o levava carinhosamente para a sua cama, até que ele cresceu e Julinho já não podia carregá-lo ao colo. Julinho tinha no seu filho o seu melhor amigo, estavam sempre pensando um no outro e agradando-se mutuamente.
Quando Julinho morreu, Fabiano já era casado e tinha dado uma netinha para ele. Julinho, desta vez não perdeu o seu melhor amigo, morreu bem juntinho dele. Feliz por ter um grande amigo.