Todas as cores do universo
Depois do primeiro olhar, desconcertante, e palavras sem som, quiseram afastar-se.
Afastaram-se para melhor se observarem. Ele quis ver se o sorriso dela era tão doce como imaginara...
Ela quis ver-lhe os contornos e a cor dos olhos quando o sol os iluminava...
Havia sonhado muito com ela, com palavras animadas bailando na escuridão... com olhos parados num ponto só cruzando desejos. Onde a guardava nos seus sonhos?
Certamente a guardava em abraços de ternura... Existiria tempo para saborear aquele perfume? Decorar-lhe os gestos, o formato do queixo, o brilho do olhar, a cor dos cabelos e a altura dos ombros... ou seria tudo tão fugaz que só de suspiros viveriam todas as lembranças?
Ela desejou conhecer aquela alma que tanto a fascinava pela diferença que dotava na humanidade que nele parecia existir... tinha doces palavras... ternas preocupações com ela... meigas dores e um vazio que nada parecia conseguir extinguir...
Sentia carinho por aquele semblante que parecia caminhar sem direção.
Então, ela abriu-lhe o coração de par em par... curou-lhe as feridas passadas que por lá ainda andavam... entrou na sua casa e encheu de flores todos os vasos, jarras, copos... desenhou floreiras para enfeitar as varandas... lavou do chão as lágrimas... rasgou da carne todas as amarguras e acreditou que iria ser feliz fazendo sorrir aquele anjo de asas caídas.
Ele veio até ela, vestindo preto na pele e soltando fumo, nervoso, com um olhar cabisbaixo. Surgiu frio, gelado, por detrás das sombras, mas o calor e a luz dos olhos dela esquentaram e iluminaram. Ele sentiu que as palavras iam fugir na sua garganta como loucas... que os braços iam ser meigos demais e que o seu sorriso ia ficar mais solto naquela tarde de luz... e assim foi. Ela sorriu... ele a abraçou. Então ela deixou sair todas as palavras que molhara no mel, só porque o queria ver sorrir.
O abraço demorou a eternidade de vários minutos. Era como se naquele momento nada mais existisse, apenas a eternidade daquele abraço. Sentaram. E falaram dos sonhos, dos desejos, seus feitos, dos seus defeitos também. E as mãos procuravam pegar o que ambos já tinham, um dia, perdido. Sentiram que aquela felicidade possuía todas as cores do universo. E acreditaram que, se sonhassem juntos... todos os sonhos seriam possíveis.
E os dedos dele sentiam-se mais macios enrolados nos dedos dela... e o corpo dela sentia-se protegido, amparado no corpo dele... e os olhos dela esqueceram a chuva que neles ontem caía e sentiram o sol aquecer-lhes o coração. E ele sentiu que o sorriso dela era ainda mais doce e meigo do que imaginara. Então souberam que seus corações, antes do anoitecer iam conhecer-se num mesmo beijo...
Ana Flor do Lácio (18/11/2010)