Seu próprio mundo
É uma boa memória, pensou.
Estava há quase dez minutos parado no mesmo lugar da cabana. Era uma daquelas pequenas de madeira grossa e escura que se encontram no Alaska e em lugares muito frios - sempre quisera morar numa quando era jovem. Havia sentado na frente da fogueira no centro da sala, com um globinho de neve que encontrou dentro de uma caixa, das que vieram junto com as mudanças.
O colchão, há várias noites já permanecia na frente da fogueira, com dois cobertores amontoados de qualquer jeito. Ele não se mexia muito ali dentro, pegava algo para mastigar uma hora ou outra, escutava alguns discos de vinil, mas na maior parte do tempo, se perdia em lembranças.
O objeto em sua mão era um globo de neve, uma pequena bolinha de vidro com um boneco dentro, que quando agitava, similava o efeito de neve caindo. Agitou-a uma vez e observou os confetes caindo devagar. Olhou para a neve lá fora, pela janela, demorando-se em cada olhar. A velocidade que os flocos caíam era parecida mesmo.
Gostava da sensação de estar protegido, com a neve e o frio logo ali, mas estava bem, estava dentro da cabana e perto da fogueira, com um cobertor jogado por cima de suas pernas. Estava bem.
A memória a qual se referia antes era relacionada ao globo de neve. Tinha sido um presente para uma garota, na verdade, a única garota.
Tentava entender exatamente o que havia acontecido, mas não tinha resposta.
Sua cabana na verdade, era seu quarto. Não estava nevando, nem chovendo, era apenas dia, fim de tarde. Nem estava frio. Do todo, a única coisa real de seu refúgio inventado era o globinho de neve. Imaginava-se dentro dele.
Em seu mundo, estava frio e quieto. Em seu mundo, estava sem ela, e mesmo que há muito tempo estivesse ciente do que aconteceria caso a perdesse, queria entender por que não parava de nevar durante a luz do dia, e por que era tão frio debaixo dos cobertores, por que se sentia tão velho e por que suas músicas pareciam soar de velhos discos de vinil.
Queria entender como um simples objeto explicava perfeitamente sua saudade. Ali, dentro daquele globinho, deixava o tempo passar, nunca preocupado em acompanhá-lo, apenas o observava passar e acenava em despedida, preferindo ficar com todas as boas memórias do passado.