Meu Sonho de Amor - Parte 1

Chamava-se Gabriel, mas nas horas em que me lembro dele prefiro chamar de Sonho. Ele nunca soube desse apelido, mas tenho certeza que iria gostar.

Estou falando dele porque minha vida girou em torno dos momentos maravilhosos e tristes que tivemos.

Quando a tristeza chega, não acho que devemos evitá-la, contando uma piada, saindo com amigos ou tentando esquecer. É preciso viver a tristeza como se vive a alegria. É por isso que quero falar do meu Sonho.

Sou uma garota de 17 anos, com olhos verdes e cabelos castanhos encaracolados. Tenho um cachorro chamado Dodó, muitos livros na prateleira no quarto e uma grande amiga, a Bianca.

Gosto de cantar, ler revistas de fofocas e assistir filmes de terror com o Lucas, meu amigo de infância. Sonho em ser engenheira química, casar em Las Vegas, e morar na Califórnia.

Último ano do ensino médio, férias de julho e uma viagem programada com a família: pai, mãe, Alexandre, Luíza, e os gêmeos Bernardo e Helena.

Quando chegamos à cidade de Natal no Rio Grande do Norte, senti saudades do Lucas, o garoto que brincava ser meu namorado desde que tínhamos oito anos de idade. Nunca fomos realmente e nem sei se eu queria. Nossa amizade foi nascendo assim, sem compromisso.

Liguei para Bianca logo que entrei no hotel:

— Bia, esse lugar é muito lindo e meu quarto fica em frente ao mar. A paisagem é perfeita.

— Que bom amiga. Não se esqueça de colocar as fotos no Orkut. Vou ver assim que chegar da festa.

— Que festa?

— Hoje terá uma festa na casa do Eduardo, o garoto chato da escola.

— E você vai? Não acredito! Aquele menino se acha demais. Eu não iria.

— Eu só vou por causa do Lucas. Na festa vou poder investir nele.

Senti uma sensação estranha. Toda vez que a Bianca falava do Lucas, era como se meu corpo fervesse e congelasse ao mesmo tempo. Eu tentava fazer aquilo parar, mas não conseguia.

A Bianca adorava dar indiretas ao Lucas, e ele sempre achava um jeito de fugir dizendo que já era meu namorado. Ele era um fofo, mas muito ingênuo para não se atrair por ela, a loirinha da escola. A menina mais popular e gente boa.

— Legal Bia, boa festa.

Ela pediu animada:

— Ai amiga, torce por mim? Quem sabe dessa vez não rola uns beijinhos?

— Boa sorte.

É claro que eu não estava feliz com a possibilidade dos meus melhores amigos serem namorados, mas não poderia ser falsa. Eles mereciam ser felizes e precisavam do meu apoio.

— Obrigada. Você sempre foi uma grande amiga. Tenho que desligar agora. Vou fazer compras com a minha mãe, e amanhã eu ligo para contar como foi a festinha.

— Não precisa agradecer. Sempre que precisar, conte comigo. Vou esperar você me ligar. Beijos. Tchau.

— Obrigada mesmo. Até amanhã. Beijão. Tchau.

Depois da ligação meu dia acabou. E naquela noite, meus pais decidiram jantar no restaurante do Hotel. Minha irmã, Luíza, logo percebeu que algo estava acontecendo comigo e me chamou para conversarmos na sala de recepção.

Ela começou:

— Posso saber por que você está tão nervosa?

— Não estou nervosa, só estou preocupada com o Dodó. A tia Rose pode se esquecer de dar comida a ele. Isso me aflige.

Ela me encarou e disse:

— Natália, você só morde os lábios quando está nervosa, e o seu nervosismo é quase sempre pelo mesmo motivo: ciúmes do Lucas ou da Bianca. Qual é o problema dessa vez? — ela perguntou me olhando nos olhos.

Eu já deveria saber que era impossível esconder qualquer coisa da irmã mais velha.

— Dessa vez estou com ciúmes dos dois. A Bianca quer ficar com o Lucas. Se isso acontecer e eles chegarem a namorar, serei esquecida para sempre.

— Que pensamento bobo! Você vai continuar sendo amiga deles. Vai continuar indo ao cinema, à sorveteria, e às festinhas que vocês tanto gostam. A diferença é que vai “segurar vela”.

Fiquei mais aflita.

— Ah, me deixe em paz.

Ela disse com um doce sorriso:

— Não se pode nem brincar? Tudo bem! Vamos falar sério. Você está com ciúmes pelo fato de que, talvez, sua melhor amiga de troque por um namorado ou está nervosa por que o Lucas possa preferir outra garota?

Eu suspirei e respondi:

— Eu não sei. Não sei se é pior perder meus dois melhores amigos por causa de um romance estúpido ou se é perder o garoto que mais gosto. O que eu faço?

Luíza tocou minha bochecha gentilmente.

— Pare de pensar tanto no que pode acontecer com você ou com seus amigos. Não vejo motivo algum para ficar nervosa ou com ciúmes. Talvez seja o destino deles ficarem juntos. Não se pode prever nada, mas tenha certeza de que no final tudo da certo. E espero, sinceramente, que você aproveite a viagem e faça as escolhas certas — ela me beijou gentilmente na bochecha e então com os passos rápidos e confiantes dela, ela saiu da sala.

“Obrigada”, pensei em responder.

Luíza estava totalmente certa. Subi até o quarto e avisei minha mãe que eu precisava dar algumas voltas na praia. Ela disse não umas dez vezes, até que eu a convenci. Prometi que não iria demorar e não desgrudaria do celular.

Andar pela praia me fez lembrar o dia em que conheci meus dois melhores amigos. Conheci a Bia quando fui com minha irmã à casa de uma amiga dela. Minha mãe só deixava a Luíza sair quando alguém fosse com ela. O Alexandre sempre estava ocupado com suas namoradas, e o Bernardo e a Helena eram bagunceiros demais para acompanhar alguém. Por isso, tudo sobrava para mim.

A Luíza só me convenceu a ir com ela, porque disse que teriam meninas da minha idade. Chegando à casa da Renata, fui apresentada à sua prima, Bianca. Ela se tornou minha melhor amiga em pouco tempo. É para ela que eu conto todos os meus segredos. Desde os mais bobos até os mais importantes. Tudo bem, admito, eu tenho que filtrar mais ou menos três quartos do que ela fala porque, em sua maioria, são assuntos que não me interessam — tipo, o quanto ela pagou pela sua bolsa Prada, e qual a tatuagem tosca que ela quer fazer quando completar dezoito anos. Mesmo com suas futilidades, ela sempre será minha melhor amiga.

Com o Lucas também foi amizade à primeira vista. Tínhamos oito anos e nossos pais decidiram passar o Natal em um clube. Ele estava brincando com as outras crianças e me chamou para participar da brincadeira. Sempre gentil e lindo. A mãe e o pai de Lucas o criaram bem. Ele era um cavalheiro, 100%, e sempre seria. Com o passar do tempo, virou mauricinho, ruim de nota, mas bom de papo. Alto, braço musculoso, cabelo na altura no queixo, liso, que balançava pra cá e pra lá. Cheirava a xampu. As garotas se amontoavam perto dele, fazendo pose e virando seus cabelos.

Ele era o cara que há anos me admirava, que puxava meu rabo-de-cavalo só para atrair meu olhar. E sorria, como se tivesse sido um olhar inesperado.

Não queria mais pensar neles e no que poderia estar acontecendo. Voltei para o hotel e prometi que aproveitaria minhas férias da melhor maneira possível.

No dia seguinte, tirei muitas fotos, fiz belos passeios e comi muito, mas não tinha problema, pois cada comida valia à pena. Eu precisava curtir aquele lugar maravilhoso e não iria me preocupar com dietas.

Voltamos ao hotel, coloquei as fotos no Orkut e em seguida entrei no chuveiro. Naquela noite íamos a uma boate, e confesso que estava bem empolgada.

Saí do banho e meu celular logo avisou que haviam quatro chamadas não atendidas. Era o Lucas. Senti um calafrio extremamente bom.

Naquele minuto, o celular começou a tocar em minhas mãos.

— Oi namorado – atendi sorrindo.

— Oi amiga. É a Bia. Tudo bem?

Por que alguém simplesmente não atira em mim?

— Oi Bia. Você e o Lucas estão juntos?

— Sim, estamos. Ele está aqui em casa, e nós vamos juntos à festa de despedida da Paula, a ex do Luke.

— Que notícia maravilhosa. E para onde essa garota infernal vai? — perguntei.

— Para Porto Alegre.

— Ótimo! Quem sabe estando em um lugar mais frio, ela comece a usar roupas — falei naturalmente e logo ouvi a risada do Lucas.

— O Luke está rindo muito do que você disse. Você nos diverte tanto, por isso estamos com saudades.

— Também estou com saudades de vocês. Aproveitando a ligação, quero falar com ele.

— Vou passar o telefone, mas antes queria dizer que vimos suas fotos no Orkut. Você está linda demais. Que corpo é esse, menina? Arrasou.

— Obrigada amiga, mas é o meu corpo gordo de sempre. O meu conselho é nunca abandonar os lanches engordativos e largar mão de academia — respondi rindo.

— Você é palhaça demais. Queria que estivesse aqui me fazendo rir.

— Daqui a alguns dias estaremos juntas, e estou curiosa para saber sobre a festa. Depois me ligue contando.

— Eu só não te liguei antes, justamente, por causa da festa. Estou indo tomar banho e depois conversamos. Beijinhos, linda.

— Até mais, beijos — respondi rapidamente.

Eu gostava quando a Bianca me contava tudo nos mínimos detalhes, mas senti medo ao pensar que o que mais temia, poderia ter acontecido naquela festa.

— Oi namorada. Já me traiu aí?

Eu sorrir para o telefone e disse:

— Ainda não. E você, ficou com quantas ontem?

— Se eu contar, você vai sentir ciúmes?

— Não, mesmo assim quero saber o número de vítimas.

— Por quê? Está querendo se vingar?

— Talvez.

— Hum, fiquei com duas meninas.

— Só isso? Eu consigo mais.

— Duvido. Você é muito lerdinha.

— Vou te ligar amanhã contando quantos eu “peguei”. Você vai morrer de ciúmes.

— Natália, não faça isso! Eu sei que errei com você, mas me desculpe – ele disse rapidamente.

— Não entendi. Você errou em que? Pode falar. Estou muito longe para poder te dar uns bons tapas — perguntei em tom de brincadeira.

Houve uma pequena pausa e uma resposta surpreendente.

— Errei em nunca dizer que eu te amo. Eu amo o seu sorriso, a sua voz delicada e o cheiro dos seus cabelos. Amo até sua mania de morder os lábios quando está nervosa. Você precisou viajar para eu ter coragem de dizer isso, por isso peço desculpas — ele respondeu.

Não sabia o que dizer, mas senti meu estômago se apertar e minha cabeça girar.

— Natália, você ouviu o que eu disse? Se quiser, eu repito.

Eu respirei fundo e falei:

— Não precisa. Eu ouvi tudo que disse, mas não sei o que dizer. Estou confusa. Melhor conversarmos depois.

— Você ficou brava comigo?

— Não estou brava, só não sei o que dizer. Preciso pensar melhor. A Bia está por perto?

— Ela não está aqui, por quê?

— Porque ela sempre gostou de você, Lucas. Nunca percebeu isso? Ela não para de me dizer que te acha lindo e que morre de vontade de te beijar — respondi sem perceber que esse era um segredo só meu e dela.

— Eu sei que ela gosta de mim, mas o que aconteceu ontem já faz parte do passado.

Mordi os lábios, segurei as lágrimas e perguntei:

— E o que, exatamente, aconteceu ontem?

— Natália, quer namorar comigo? Estou sendo sincero, eu te amo.

— Lucas, o que aconteceu entre vocês?

— O que aconteceu não importa. Você sempre diz que viver o presente é a nossa melhor opção. Então, quer ser minha namorada?

Meus pensamentos passaram de choque à irritação e raiva.

— Já entendi tudo! E não acredito que depois de ficar com a minha melhor amiga, você tem coragem de me pedir em namoro. Acho que você devia mais respeito a ela — falei e em seguida desliguei o celular.

Um abismo enorme de frustração se abriu em mim. Era como se alguém estivesse me dando uma invisível facada no coração. “Natália, sua idiota. Você sabia que isso iria acontecer. Sua idiota, burra, patética”.

Aquela conversa não me saía da cabeça. Fui até a janela e olhei para fora. O vento estava movendo as folhas das árvores. Depois caminhei até a cama e caí sobre os lençóis. Chorei, chorei e chorei.

Kkaty
Enviado por Kkaty em 05/11/2010
Código do texto: T2598328
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