QUE SUSTO I e II (republicado a pedido)
QUE SUSTO !!!
No jardim da pracinha que fica ao lado da minha casa há um banco de granito. Está localizado à sombra, logo abaixo da minha janela. Quase sempre via-o vazio do alto da janela do meu quarto. Aquela praça tinha histórias para contar. O olhar de cobiça dos moços desviados dos bons costumes, consumidores de drogas ilícitas, punha em polvorosa belas e inocentes mocinhas. Por razões óbvias, poucas vezes o banco era ocupado. E, quando isso acontecia, o ocupante ou a ocupante desfazia-se em olhos pelos arredores, na presunção da aproximação de algum desses jovens.
Naquele dia, de lindo e exuberante sol, vi sentar-se ali minha amiga e objeto dos meus mais íntimos e doces sonhos. Resolvi fazer-lhe uma surpresa. Nem me alertou a mente do mau uso que os odiosos personagens das drogas proibidas faziam da praça. Desci até o passeio. Dirigi-me mais para o centro da praça, por trás do banco de granito, que servia de apoio e descanso à meiga e formosa menina que, em silêncio e despreocupada, estivesse, talvez, dando férias ao pensamento. Trazia os longos e negros cabelos presos em dois rabinhos por graciosas “maria-chiquinha”. De seu pescoçinho de ébano, subia suave e femíneo aroma. Não resisti. Com os lábios ardentes de desejo e os dedos fazendo-me cócegas para acariciar aquela pele sedosa, chamustanejei-lhe(1) uma leve e divina carícia na pele desnuda, eriçando seus pelinhos.
Como que movida por uma mola propulsora que houvera sido liberada, de um salto, deixou audível um doce gritinho de susto, deixando o banco vazio. Mas, logo, ao reconhecer o malvado agressor do seu inefável pescoçinho, recompôs-se do susto, convidando-me, com um delicioso sorriso, a sentar a seu lado. Por um nada contracenei um lúgubre enfarto, em quem nada mais quis, que fazer um mimo agradável.
(1) CHAMUSTANEJAR – pestanejar, pentear de leve, chamuscar, roçar levemente.
QUE SUSTO!!! II
O dia estava exalando amor por todos os poros. O sol, reluzente e pleno, produzia sombras amenas e complacentes, que projetava sobre o casal sentado em animada conversação no banco daquela pracinha. A brisa sorria amores amainando a temperatura ambiente. E a folhagem da frondosa árvore, queimavam ciúmes do sol, sustentava-se nos dedos das mãos dos fortes e poderosos braços daquele gigante da natureza. E o amor, este brincava com as flores do flerte, com as palavras doces trocadas pelos dois jovens, revoando rasantes no ar quente da tarde.
Enquanto isso tu do acontecia, dois jovens (amigos) liam-se a alma em sábios estudos de amor. Mas ambos respeitavam os parâmetros que definiam os limites de uma bela amizade. Conheciam-se desde meninos e frequentaram o mesmo colégio e brincaram os ludos infantis. Depois ganharam em idade e corpo e desde a preadolescência seu convívio fora prejudicado pelos rumos da vida. Escolas superiores diferentes, mais tarde, lhes tolhiam esse prazer. Mas, como moravam no mesmo bairro, embora em ruas diversas, o acaso produzia-lhes a oportunidade do reencontro.
Mas quando isso acontecia, haviam tantas coisinhas miúdas a se revelarem que esses momentos tornavam-se efêmeros demais para se revelarem todas as sensações de alegria e de preocupação e dor que sentiram nos intervalos que separavam seus diálogos. Por esse motivo, os escassos momentos de interação emocional já lhes causavam saudade ainda nem esgotado seu tempo. Por isso atropelavam palavras e assuntos e riam rizinhos encantados e calavam, deixando instantes mútuos de silêncio para o diálogo de estudos da alma aos olhos.
O tempo passou rápido. A jovem, olhando seu reloginho de pulso, assustou-se novamente exclamando num sussurro:
– Nossa! Minha mãe está me esperando. Já deve estar preocupada. Vou nessa ... e soprando um beijinho miúdo sobre a palma aberta da sua mãozinha rosada, quase saiu correndo.
O moço consternado com a precoce separação, mal pode murmurar um “até breve”, embora o coração, querendo saltar-lhe fora do peito, gritasse ...
– Eu te amooooooooooooooooooooooooooo !