Perdição

Acabava de voltar um enterro. Fui porque era gente próxima. Amigo de longa data.

Se não vamos, o ressentimento da família nos persegue como uma doença contagiosa. Cheguei em minha casa Com a sensação terrivel dentro de mim. Acendi um cigarro, Desliguei o radio que estava chiando fora da estação. Abri a porta dos fundo e fiquei um tempo tentado saber mais daquele momento. Fui a cozinha, liguei a chaleira. Um frio que passava toda minha coluna me paralisava. Procurava os fósforos que nunca estava no lugar. A casa desleixada dava um ar de abandono. Entre uma tragada e outra um nó que estava invisível em minha garganta se esforçava em aparecer. Deitei de barriga pra cima em minha cama e os pensamentos me assustava como uma multidão de mendigos. Um torpor inundou meus sentidos . Uma fome avassaladora comia minhas tripas. Nesse desconforto uma história há muito escondida me veio a memória.

Um dia depois do trabalho de aprediz de açougueiro fui liberado mais cedo. Foi um dia muito produtivo

Em razão disso Seu Ernécio me liberou mais cedo. Com o dinheiro que ganhei nesse dia, passei

No armazém e comprei uma boa quantidade de adubo. Há muito estava envolvido com jardinagem.

Por causa desses embrulhos acabei entrando pelas portas dos fundos.

Quando entrei tive a visão mais terrivel de minha vida. Tomado pelo horror, passei pela porta da cozinha, atravessei a sala até meu quarto e me tranquei até o dia seguinte.

Quando saia, meu pai toma minha frente

- Tá tudo bem?

- Disse o que?

- Não me enrole, sem que você viu.

- Não se preocupe, pai . Não sei de nada. Se alguém perguntar. Essa vai ser a resposta.

Quando voltei a noite, a casa estava em silencio. Já era um lugar diferente. Fui até a cozinha. Havia ainda um pouco de sopa no fogão. Esquentei um pouco no prato de esmalte. Meu pai de cócoras na cozinha diz com uma voz abafada.

- Quer um pouco ?

- Não , vou tomar essa sopa e depois vou dormir

- Como foi seu dia?

- Normal. E o do senhor?

- Normal também.

Em silencio me dirigi a sala, desliguei o radio. Fiquei muito tempo numa espécie de transe.

Espantei com alguns religiosos chamando

- quer ouvir um pouco da palavra? – falava um olho pela fresta .

- No momento estou muito cansado. Tive um dia longo, não posso atender vocês.

- Tem alguém mais na casa?

- André! Entra aqui! - De lá de dentro uma voz grave rasgada.

A casa agora estava escura. Os candeeiros sem gás.

Fui até a cozinha. A fome apertava. Nesse horário o jantar já estaria pronto.

Meu pai fumava enconstado ao pé da mesa. A noite ainda insegura dava uma ar sombrio

A sua figura que recebia pela janela a luz esmaecida da lua.

- pai, vou sair um pouco,. Preciso comprar gás.

- Não importa. A gente não precisa mais de luz aqui a noite. Fica aqui na casa comigo.

Entre suas palavras e minha obediência houve alguns segundo que me arrastou como um monstro em pensamento

- tá, já vou dormir então. Vou dormir!

- Fecha a porta, a janela. Passa a alavanca. Se tiver com fome...

- Não estou com fome...

Deitei de barriga pra cima. nessa noite o calor estava infernal. Os mosquitos pareciam satanás. O calor, a fome, aquela imagem, tudo encurtava minha

Respiração. Não conseguia dormir ou pensar algo que fosse diferente.

Após algumas semanas a casa estava imunda. Um fedor desgraçado saia do banheiro.

As paredes da cozinhas estavam cada vez mais preta. O cachorros famintos jã não latia.

So conseguia soltar um grunido que me dava mais nojo do que medo. Uma atmosfera profunda e sombria nos apertava dentro de casa.

- Po que você não está indo mais trabalhar?

- Tem pouco movimento no açougue.

- Precisamos de dinheiro!

- Na semana que vem vou voltar. Já falei com seu Ernécio.

Olhava pro meu pai e meu estomago enojava. Fazia muitos dias que ele não tomava banho. Seu halito De cachaça e cigarro se juntava com o fedor do banheiro e me deixava com o vomito a boca.

Ele Não frequentava mais a casa inteira. Passava todo seu tempo na cozinha. Quase sempre abaixado, com um olhar desconecto para o chão. Não saia mais a sala ou ao quintal. Provavelmente os cachorros já morreram. Ele não falava mais comigo. O ambiente lembrava um cemiterio com seu horror escondido.

Olhava com tristeza a multidão de retratos fixados na parede. Eles esteve sempre lá, mas não como agora. Falava da gente, do passado, dos parentes mortos, na festa que foi essa casa. Uma nostalgia , uma saudade amaldiçoada me enfeitiçava. As molduras eram tristes quanto as fotos, de metal dourado, formando flores mortas ou redemoinhos que não terminavam. Eu ficava muito na sala, as vezes no quarto, mas sempre com sentindo na cozinha.

Teve um momento que não consegui mais nem fantasiar. A fome me torturava. Fui até a cozinha.

- Pai!

- Quê?

- Preciso sair, estou com fome!

- Eu não tenho fome! Não mais!

Antes de sair e assegurar que voltava logo espichei meu olhar e vi

Do seu lado o corpo do meu avó que havia morrido há alguns meses.

Roubou o corpo no cemitério. Abriu um buraco na cozinha e colocou um

Tampa de vidro, de modo que meu avo aparecia eterno dormindo sob os nossos pés.

Seu rosto já se desmanchava pela açao dos vermes e dá água que descia pelos cantos do buraco.

Num prato, um pedaco de mão espetado por um garfo de brinquedo.

-

Ariano Monteiro
Enviado por Ariano Monteiro em 11/10/2010
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