O Adeus ao Vestido de Noivas...
O táxi estava demorando muito e Bia estava eufórica demais para esperar parada. Resolveu ir caminhando mesmo. Já andara tanto hoje, que uma caminhada a mais ou a menos não faria diferença. O seu destino ficava a mais ou menos trinta minutos de uma caminhada tranqüila e prazerosa... a casa de Cláudio.
Já era quase sete da noite e ao contrário do que ela imaginara o cansaço do dia depois dos primeiros dez minutos de caminhada, começava e estava fazendo diferença em seu corpo que após acalmar toda aquela adrenalina da situação vivida, começou a demonstrar sinais de cansaço e exaustão. Sentou por um tempo, e resolveu depois de um breve descanso pegar um atalho, mas acabou se perdendo, o que tornou a caminhada a durar o dobro do tempo previsto.
Mas nada a faria desanimar, podia avistar agora no alto da rua, mais quatro quarteirões e estaria finalmente nos braços dele! A bela casa de seu amado podia finalmente ser avistada, ou melhor dizendo, a casa da família dele. Mas isto agora não era mais problema, entraria para uma família adorável, com pessoas boas e que a queriam bem. Ninguém ali sentia vergonha dela ou de suas origens.
Entraria para a família! Estas palavras soaram tão fortemente de seu coração que Bia parecia que flutuava durante os últimos metros do trajeto. Era real que nunca falara mais especificamente sobre o amor entre os dois, mas para ela tudo era tão claro e sincero que nenhuma palavra precisava ser dita para que ela soubesse que Cláudio a amava perdidamente, assim como ela o amava também.
Ambos tinham salvado a vida um do outro assim que se conheceram, e agora suas vidas se pertenciam, de uma maneira única e poderosa. E nada e ninguém nunca os afastaria. A felicidade finalmente era algo palpável e real!
Um estrondoso trovão selou o pensamento de Bia, que foi rapidamente tomada por uma vigorosa tempestade de verão que caiu. Em poucos instantes ela estava totalmente encharcada! E ao invés de correr, parou! E dançava e cantava na chuva, sorrindo com a situação. Era como se estivesse agora recebendo as bênçãos dos Céus! Nenhuma situação a tiraria a alegria daquele momento!
Ao chegar próximo do portão um frio na barriga gelou sua alma quando percebeu que a moto dele estava estacionada. As chances dele estar em casa eram grandes!
Não tocou a campainha e nem bateu palmas. Sabia perfeitamente o caminho que a levava aonde ele estaria. Abriu sutilmente o pequeno portão lateral e entrou pela garagem como quem entra em uma igreja para se entregar ao seu noivo. Podia jurar que ouvia o som dos anjos cantando para abençoar aquele momento. Em sua mão segurava a flor que o pai colhera para ela naquela manhã. Não precisava de vestido, cerimônias, festas ou coisa assim. Só os dois fariam a diferença naquele momento!
Bateu de leve na porta de entrada. Ninguém respondeu. Mordendo discretamente os lábios inferiores num misto de excitação e ansiedade, Bia repetiu o gesto.
Imerso em seu sofrimento, Cláudio submergia das suas fantasias com um amor impossível, mergulhado no calor daqueles olhos e no poder daquele sorriso simbolizado naquela pequena foto. Era tudo o que tinha restado do seu grande amor. Desde o último encontro com Bia no Ano Novo, que ele não saia mais de casa, não fazia a barba e mal se alimentava. Era como se esperasse a morte que viria dali a três dias, com o casamento dela com alguém que nunca a faria feliz. E ele nada poderia fazer a não ser respeitar a decisão da sua amada Beatriz.
Ouviu novamente batidas na porta e reunindo forças levantou-se deixando espalhado pela sala as fotos que ainda o faziam respirar dignamente. Quando abriu a porta a cena que viu o fez congelar mais do que qualquer cena terrível ou catastrófica. Ela estava ali, na sua frente! Toda molhada, com os cabelos colados em seu rosto e pescoço. Trazia em uma das mãos uma pequena flor já machucada pela força das gotas fortes da tempestade que caía lá fora. Apoiado em seu ombro uma grande sacola. O que fora um laço em seu cabelo, pendia desajeitadamente pela lateral do rosto. Pediu por um momento, silenciosamente, para que Deus não o deixasse ter esperanças em vão, para que não o permitisse mais este sofrimento derradeiro.
- Posso entrar? – Bia tremia muito mais pelo nervosismo da situação do que pelo frio que a afligia.
- Sim, claro! Você está toda molhada, está tremendo de frio, deixe que eu pegue uma toalha para você. – Cláudio ia se afastando em direção ao armário logo após fechar a porta de entrada, mas sentiu a mão de Bia segurar-lhe o braço.
- Não é preciso, estou bem.
- Você está tremendo Bia.
- Sim estou. Mas talvez não seja o frio.
- O que você veio fazer aqui assim sem avisar? – O coração de Cláudio já não conseguiu manter mais o compasso, e suas orações não foram atendidas, pois ele alimentava com toda a força que ainda restava dentro de si, uma esperança de ouvi-la dizer o que esperava ouvir desde o primeiro momento que a viu.
- Vim lhe trazer isto. – Bia oferecia a sacola para ele, sem desviar nem por um instante o olhar. Olhos nos olhos.
- Um presente? – Agora o coração já nem batia mais, a dúvida pela esperança ou por mais uma vez a desilusão, fazia com que cada batida que fosse possível doesse de uma forma agonizante. Cláudio pegou a sacola e a abriu com calma. Seja o que fosse, queria viver com a mínima perspectiva nem que fosse por alguns segundos a mais.
Bia percebeu um leve desconcerto nas mãos dele e juraria que podia ser descrito como um tremor. Nada no mundo apagaria aquele momento em sua mente.
Cláudio retirou a caixa bem feita, adornada com um laço delicado. Puxou com uma das mãos a fita que separava sua felicidade eterna ou uma vida no verdadeiro inferno, uma vida sem o amor dela. Um tecido branco fino e delicado brilhava dentro da caixa, por baixo de uma linda folha de seda cor champagne. Sem saber o que pensar, Cláudio levou seus dedos a tocarem imediatamente o tecido delicado. Parecia um vestido de noiva, mas com certeza Bia não se prestaria ao papel de trazê-lo para Cláudio avaliar, não repudiaria seu amor desta maneira.
Mas o toque dos seus dedos, agora visivelmente alterados, no tecido branco, imaculado e brilhante, o libertaram como um toque de mágica de toda a angustia vivenciada. O que um dia fora um tecido ou uma linda peça de noiva, agora não passava de um amontoado de retalhos. Quando finalmente os olhos marejados de Cláudio conseguiram fitar os de Bia, o sorriso emoldurado naquele rosto molhado se formou instantaneamente e somente um beijo ardente entre os dois os fizeram finalmente entender que tudo tinha acabado.
Todo o pesadelo de um amor impossível tinha findado e dado início a uma linda história de amor.
E Bia não precisou de nenhuma toalha para poder aquecer o seu corpo molhado, e teve finalmente a certeza de que os dedos de Cláudio realmente tremiam quando começaram a desabotoar os botões de seu vestido.
(Beleza Selvagem)